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As mãos finas e cumpridas se apertam ao redor do arco, sentindo a pele queimar pelo frio da geada naquela manhã escura e fria, mas a capa vermelha como sangue se destaca sobre os ombros da jovem e esconde seu cabelo. Só o olhar concentrado e o rosto calmo era visível enquanto puxava o arco, encarado o cervo como se fosse um felino esperando o melhor momento.

A respiração condensava quando deixava sua boca e tudo o que ouvia era os cascos do animal a poucos metros dela, já estava ficando sem paciência, o único cervo que encontrou a arrastou floresta adentro. Já estava muito longe do vilarejo que chamava de lar. Mas isso não era um grande problema para Silver, ela cresceu caminhando pelo coração da floresta, desafiando qualquer um que diga que ali é perigoso demais.

Já não se preocupava se seria devorada ou não. Todo esse medo irracional da floresta não fazia sentido, não mais.

Quando já não ouvia som algum ela puxou a corda do arco até seu limite, contando até que poderia soltar a flecha. Entretanto, o som de um galho se partindo ecoou pelos seus ouvidos atentos e assustou o cervo que ela tanto queria levar para o jantar.

O animal correu antes mesmo que ela pudesse abate-lo.

Suspirando irritada ela se levanta, procurando o que raios a atrapalhou. Ganhou apenas o som dos pássaros em resposta, a floresta despertando para mais um dia, e não conseguiu ver nada além das plantas e troncos que a rodeavam. Antes que ela pudesse voltar a procurar por sua caça mais um som de passos a alcança e arrumando novamente a flecha no arco ela espera, sabendo que algo estava a observando.

Quando tudo o que viu foi um pequeno esquilo protegendo seu estoque de inverno, sua guarda abaixou, claro que ela estava se preocupando a toa. Mesmo que o medo não tenha sentido ele ainda existe.

Antes que pudesse retirar seu capuz ela é jogada para o lado e mãos rodeiam sua cintura, seu arco escapa de sua mão sem muita dificuldade. Os dois caíram com um baque surdo nas folhagens que cobriam o chão e presa entre o homem e o chão ela só pode dar um sorriso com a certeza de que ele havia ganhado esta batalha.

— Você está abaixando muito sua guarda, Silver. — Ela faz questão de se prender a cada detalhe do rosto delicado, que carregava algumas cicatrizes dos anos em que aprendera a se virar floresta adentro. Assim como ela. Seu cabelo não sabia o que era um corte a uns bons meses e ainda era uma confusão escura e lisa, uma bela confusão.

— Bom dia, caçador. — Os olhos dele brilham escuros e não perde tempo em selar os lábios da moça. Eles passaram anos separados, não ia perder a oportunidade agora que tinha a permissão de Silver para fazê-lo e ela ao alcance dos dedos. Só pôde sentir os dedos finos se enterrarem em seu cabelo. — Não deveria estar ajudando seu pai com a caça para hoje a noite? Temos uma lua cheia chegando.

— Deveria, mas ele não entra na floresta até o sol estar alto o suficiente. Vim na frente e percebi que você estava por aqui, foi mais forte que eu. — O caçador pega um cacho escuro que escapava do capuz dela. — Pensei que sua irmã estaria com você.

— Scarlet quis ajudar o Shin com a ferraria, fundir prata não é muito fácil e meu irmão pediu ajuda. Vim sozinha hoje. — Ele concorda, distribuindo beijos pelo maxilar dela. — E você me deve um cervo agora, Joshua.

— Vou te ajudar então. Feliz? — Os dois se levantam do chão frio. Ela assente e sem esperar pelo caçador, pega seu arco e parte na frente em um mar de cachos castanhos, mas não sem antes olhar para ele sobre os ombros em um claro desafio, dando um vislumbre dos olhos escuros e do rosto queimado pelo gelo.

Um sorriso travesso é tudo o que ganha, destruindo a imagem do homem elegante que Joshua se tornou para dar lugar ao garoto implicante e divertido que conheceu a muito tempo atrás.

Beware the big bad Wolf » » Joshua Hong Onde histórias criam vida. Descubra agora