2 - Alisha

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Alisha Perkins. Assino o meu nome falso na ficha de inscrição para a equipe de torcida da Academia, ainda hesitando na letra P.

Forço um sorriso para a garota do outro lado da mesa e entrego o formulário preenchido, imaginando se ela consegue ver as gotas de suor que surgem na minha testa ou o ponto de tinta de caneta que se acumulou no papel, acusando minha hesitação, minha farsa.

Pode parecer ridículo que diante de tantos perigos expostos aos Transmorfos, tivéssemos espaço na Academia para jogos esportivos e ainda por cima uma equipe de torcida, mas eu agradeço por isso.

Ser líder de torcida é, e sempre foi, parte da minha natureza, apesar da minha dificuldade em trazer tanta empolgação para assuntos cotidianos. Faço parte de equipes competitivas desde o ensino fundamental, incluindo muitos verões em acampamentos. Os treinos me faziam ficar fora de casa, o que era uma prioridade para mim. Com o passar do tempo, meu lar se tornou o ginásio enquanto minha casa era só o lugar em que dormia a noite.

Logo aprendi a amar aquilo. A dança, as acrobacias, o foco e a disciplina me mantinham sã.

— Boa sorte — diz a garota de dentes muito brancos, colocando minha ficha numa pilha com as outras.

Não sou a única procurando uma válvula de escape em atividades estudantis, afinal de contas.

Apesar do aquecedor ligado no ambiente e do suor nervoso que evapora da minha pele, esfrego os braços com uma mão só, enquanto caminho por entre os calouros animados que procuram por clubes e aulas para se inscreverem.

Todo aquele clima entusiasta é acolhedor. Me sinto leve por ser uma estranha para aquelas pessoas, só mais uma caloura empolgada para o início do termo e não Alisha Roberts, popular do ensino médio e, certamente, não Alisha Roberts, assassina foragida.

Ficaria bem enquanto não descobrissem o que me levou até aquele lugar indeterminado nas montanhas do Alasca. Autoproteção. Vingança. Sangue derramado.

Por instinto, repouso a mão no pescoço por cima da gola alta que esconde as marcas na minha pele. Marcas do passado.

— Olá! — Uma garota baixinha com cabelos loiros volumosos aparece na minha frente com a pequena mão estendida. Ela parece muito nova para estar na faculdade. — Faith, segundo ano, lobo. O que você é?

Ela soa entediada apesar das palavras com conotação animada. Tento conter minha surpresa. Não consigo vê-la como uma estudante do segundo ano e nem como uma Transmorfo Canidae, ainda mais um lobo. Ela não parece tão intimidadora quanto o animal.

— Alisha, caloura, coruja — digo apertando finalmente a sua mão gelada.

Wow. Você deve ser inteligente — comenta ela, perdendo um pouco o tom monótono.

Eu dou de ombros, mas um pequeno sorriso aparece no canto de meus lábios.

A coruja é um símbolo de sabedoria e, como o animal, eu sou uma observadora nata. Sempre de olhos atentos e pescoço virado. Acho que isso faz realmente parte do adjetivo inteligência. Observar.

Faith não diz mais nada, apenas me lança um sorriso e vai falar com uma garota de cabelos negros na mesa seguinte.

Pessoas que forçam interação social como ela, sempre querem alguma coisa. Minha aposta é que a garota lobo voltaria para revelar o seu verdadeiro propósito social em um futuro próximo. Eu estarei esperando.

Continuo observando os outros Transmorfos enquanto faço a matricula em algumas aulas. Sociologia, marketing...matérias neutras e classes obrigatórias, enquanto não decido qual carreira quero seguir. Se é que há uma carreira que eu queira seguir.

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