03 - Capítulo, quem é o pai de April?

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Harvey Campbell

  SEMPRE TIVE UMA relação saudável com os meus pais. Nunca reclamei por ser filho único e não ter uma irmã ou irmão, para dividir brinquedos, roupas e até mesmo o café da manhã — que era o cereal com a embalagem de heróis, que eu me deliciava toda manhã. Mas como toda criança normalmente curiosa, uma noite questionei a minha mãe, sobre eu não poder ter um irmão ou irmã e ela me respondeu apenas com um: “ouvi dizer, que se você vê uma estrela cadente, tem que fazer um pedido. E ele se realiza”. E me enviou um sorriso, que jurei irradiar tristeza, mas se foi isso, ela não deixou transparecer.

  Na época, eu não entendi nada do que ela havia falado, mas repassei todas as suas palavras na minha cabeça, antes de dormir.

  Naquela noite, esperei que a tal estrela aparecesse. Fiquei sentado na minha janela, olhando para a lua, até ver um rastro brilhante cortar o céu.

  E apareceu. A maldita estrela cadente apareceu naquela noite. Mas o pedido foi realizado na hora errada.

  April McColl nasceu na madrugada do dia 31 de março uma semana antes do meu pai o descobrir que Ayla McColl deu a luz à um fruto de traição. Seu nome era a própria menção do mês em que ela veio ao mundo, gritando aos quatro ventos que iria fazer da minha vida um verdadeiro inferno. Carl — meu pai — ficou tão perdido com a descoberta cruel da traição, mas perdoou Ayla mesmo assim.

  Pois é, eu também não acreditei na época. Eu era um garoto de apenas nove anos, mas já tinha noção das coisas, e quando soube e toda a confusão, fiquei sem saber o que fazer ou falar. Na real, eu não podia falar nada, muito menos expressar a minha opinião, porque não é certo se meter, quando dois adultos estão discutindo.

  Ela é linda! Minha irmã é linda... Mas eu não tinha noção disso! Eu era apenas uma criança.

  Mas, porra. Aquilo era óbvio demais. April é ruiva. E não tem ninguém ruivo na nossa família. Nenhum de nossos descendentes é ruivo.

  No ano anterior, aos meus dezesseis anos, questionei o meu pai sobre o divórcio e se ele não iria acabar com aquela palhaçada de uma vez por todas. Ele usou mais uma de suas frases filosóficas e disse que não devemos semear o ódio, mesmo que isso custe um coração partido — o que é irônico, porque as vezes ele quebra a regra da própria frase. Mas mesmo depois de uma conversa profunda sobre o perdão, eu não consegui deixar de lado o fato de que a minha mãe traiu o meu pai e nunca mais consegui me abrir com ninguém.

  E para piorar, ela continuou morando sob o mesmo teto que nós, agindo como se não tivesse feito nada de errado. Como se tivéssemos sido sempre uma família feliz. É claro que houve uma época em que éramos...

  Mas a história não termina por aí.

  Quando completei dezessete anos, meus pais se divorciaram. O divórcio foi bem saudável e amigável, apesar da situação conturbada.

  Algum tempo depois, Ayla McColl foi embora, deixando sua filha para trás. Imagino que tenha ficado com medo e resolveu fugir, para não ter que lidar com as responsabilidades. Meu pai não hesitou em cuidar de April, porque diferente de Ayla, ele tem coração.

  E mesmo depois de tudo ter se tornado um completo caos, ele continuou usando a aliança de casamento.

  Mas uma pergunta sempre martelou em minha cabeça, depois daquele dia repentino e até hoje martela, como uma bomba perigosa prestes a explodir.

  Quem é o pai de April?

  Eu quero matar aquele cara.

  Aparentemente, meu pai sabe quem é, mas nunca se incomodou em contar ou ignorou e preferiu guardar para si mesmo. De qualquer forma, aquilo não mudou nada.

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