CAPÍTULO 5 - INFERNO

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No capítulo anterior: Oton resgatou o coração nas caldeiras e fugiu para os arredores da cidade, onde conseguiu escondê-lo dentro da floresta. Na volta, foi enfeitiçado por uma misteriosa mulher de vermelho e a levou até onde o coração estava escondido. A mulher devorou o coração sem que Oton conseguisse reagir e o colocou para dormir em seguida. Oton acordou encarcerado em um quarto desconhecido, desnutrido e coberto de curativos. Logo depois, um homem estranho entrou no quarto e o atacou.

Edmund morava na parte pobre da cidade há tanto tempo que achava improvável se adaptar a qualquer outro lugar

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Edmund morava na parte pobre da cidade há tanto tempo que achava improvável se adaptar a qualquer outro lugar. O cheiro ruim das ruas não o incomodava, nem os alagamentos depois da chuva, nem mesmo os infelizes que tentavam assaltá-lo de vez em quando. Todos esses detalhes não eram nada comparados à liberdade de viver entre os miseráveis. Podia fazer o que quisesse a qualquer um deles, nunca sofreria nenhuma consequência. A melhor parte era que todos os seus amigos viviam bem longe e só se comunicavam através de cartas. Não que Edmund fizesse questão da solidão, ele se dava bem com qualquer um quando necessário. A questão é que não gostava de ninguém se metendo na sua vida, principalmente porque julgava ser o único capaz de entender a arte de não se preocupar com o amanhã.

Edmund acordava pouco depois do sol se pôr, ia para o bar e se certificava de ficar bêbado o mais rápido possível. Depois disso, fazia absolutamente qualquer coisa que sentisse vontade. Às vezes saía da cidade e caminhava durante horas sozinho na natureza. Às vezes passava a noite inteira conversando com estranhos. Às vezes ajudava uma criança pobre. Às vezes matava essa criança. Valia tudo. Edmund escrevia versos e nunca os lia novamente, para ele apenas esse tipo de poesia, sem revisão nem objetivo, podia ser chamada de arte.

Eventualmente o dinheiro acabava, sem dinheiro não tinha bebida, e sem a bebida Edmund perdia toda sua espontaneidade. Poderia matar o proprietário do bar? Poderia. Só que aí quando consumisse todo o estoque do estabelecimento precisaria esperar outro desgraçado abrir uma loja por ali, tudo isso dava muito mais trabalho do que escrever uma carta para seus amigos pedindo mais dinheiro. E se tinha algo que não faltava aos amigos de Edmund, era dinheiro. Aqueles Giovannis colocavam ouro no bico dos sapatos, limpavam a bunda com musseline de seda e apostavam cidades inteiras em uma noite de jogatina. Era só ficar bem sóbrio e escrever uma carta bonita implorando por emprego. O trabalho variava desde fazer uma entrega até cometer um assassinato. Mesmo quando era entediante, seu amigos o pagavam tão bem que o dinheiro durava meses antes acabar.

Um dia Edmund recebeu uma carta dos Giovannis, o que acontecia de vez em quando, se os engomadinhos tinham alguma necessidade urgente. Além de uma boa gorjeta, a carta levava a seguinte mensagem:

"Esteja preparado para receber um novato. Ensine-lhe tudo o que puder. Vai precisar conversar com ele em polonês. Tenho confiança de que não terá problemas. Atenciosamente, A. Giovanni"

O pacote apareceu na noite seguinte no meio do seu apartamento. Dentro havia um homem alto, de uns 40 e poucos anos, corpo sólido, grosseiro até demais para os padrões da aristocracia italiana. Assim que descobriu o rosto, Edmund viu que o homem estava acordado, com a expressão confusa e assustada. A pele do sujeito era estranha, coberta de marcas de queimadura que não tinham se curado muito bem. As cicatrizes lhe causaram curiosidade, porque os Giovanni normalmente escolhiam suas crias a dedo e faziam questão de que estivessem em seu melhor estado antes de serem abraçadas. Aquele camponês meio velho e acabado era um ponto fora da curva, com certeza.

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