A primeira vez que cozinhamos juntos

43 11 16
                                    

Izuku retirou uma camiseta escura da máquina de lavar e entregou ao marido, que terminou de esticá-la sobre o pequeno varal da área de serviço e colocou os pregadores nos lugares. Todo o cômodo cheirava ao amaciante favorito de uma de suas filhas, do qual tinham ganhado praticamente um estoque depois da última visita. Ao término da tarefa, apoiou o cotovelo na bancada e olhou para o relógio pendurado na parede.

— No que está pensando?

Shoto quis saber enquanto guardava a caixa de pregadores no armário de cima e ajeitava a lateral da própria bermuda, depois deu uma olhada em volta para se certificar de que tudo estava pronto. A arrumação era alvo de sua atenção mais do que da do outro, por isso encarregava-se desse tipo de coisa com maior frequência, mas em geral costumavam cuidar da casa juntos durante todo o tempo que sobrara a partir da aposentadoria.

— Estava considerando o que preparar para a janta, já que não sobrou nada de mais cedo, mas não tenho muita vontade de comer ovo agora. — Izuku suspirou. — Acho que precisamos ir ao mercado antes do previsto.

— A terceira pergunta do desafio é sobre cozinha…

Sorrindo, Izuku observou o semblante perdido de Shoto pelo tempo curto no qual o silêncio se estendeu depois da mudança repentina de assunto. Podia perceber o quanto ele estivera pensando nisso desde o dia anterior, o que também o deixava empolgado para escrever sobre suas memórias juntos. Teve vontade de abraçá-lo, então se levantou e deu alguns passos descompromissados, para deitar a cabeça em seu peito. Automaticamente Shoto envolveu-o, encostando os lábios em cachos grossos e brancos.

— Então, qual é a pergunta de hoje? — Izuku sussurrou sem sair da posição em que estava. Podia escutar os batimentos do coração no ritmo da respiração quente sobre o rosto, enquanto Shoto alternava entre dar-lhe pequenos beijos e esfregar a bochecha em sua testa, despenteando-o.

— A primeira vez que cozinhamos juntos.

A voz soou mais grave, de um modo familiar, por seu ouvido estar colado no homem cujas mãos lhe percorriam as costas. Esticou o pescoço para encará-lo. Antes de poderem dizer mais alguma coisa, porém, emendaram um beijo que começou delicado e então evoluiu para algo mais ligeiro e cheio de desejo. Quando se separaram, tinham as expressões meigas e sorridentes.

Foram de mãos dadas até o escritório após decidirem deixar os afazeres domésticos para mais tarde. Izuku retirou da gaveta o caderno, a folha de papel avulsa onde o questionário estava impresso e o estojo marrom surrado devido a vários anos de uso, e arrumou tudo em cima da escrivaninha antes de se sentarem. Shoto segurou o lápis entre os dedos, determinado a escrever essa resposta também, quando o outro começou a falar.

— Nós estávamos no acampamento de verão da escola quando preparamos alguma coisa juntos pela primeira vez. — Izuku pôs o indicador na boca e olhou para cima franzindo as sobrancelhas. — Mas acho que não vale, já que quase não nos falamos naquela ocasião e não estávamos exatamente sozinhos para ser considerado até mesmo uma atividade entre amigos… Se bem que houve uma hora na qual conversamos e eu peguei alguns conselhos importantes contigo sobre me meter na vida das pessoas. Levando em conta o festival esportivo e tudo mais, e a resposta que demos à questão 1, pode ser que isso queira dizer…

— Também não considero aquela ocasião como algo para o dia dos namorados. — Shoto interrompeu-o enquanto o segurou pelo braço, impedindo que um possível turbilhão de pensamentos deixasse Izuku inquieto. — Acho que deveríamos falar da vez em que botamos algum esforço juntos para fazer algo entre nós dois.

Olhos verdes encararam-no pensativos até que a tensão nos ombros do homem diminuissem e Shoto o soltasse. Entrelaçaram os dedos. Mesmo depois de uma afirmação de Izuku com a cabeça, seu aspecto ainda parecia meio chateado, fazendo o outro se inclinar na sua direção com certa preocupação. Compreendendo o gesto, ele confessou:

— Eu não lembro — disse em em um tom mais baixo com a voz trêmula — Não consigo me lembrar exatamente da primeira vez que fizemos isso… Quer dizer, eu lembro de algumas vezes específicas nas quais preparamos comidas juntos durante todos esses anos, mas…

— Tudo bem. — Shoto ajeitou algumas mechas de cabelo para fora do rosto do outro e correu as costas dos dedos pelas sardas mais escuras. Já estava esperando que a ocasião não fosse tão marcante para seu marido tanto quanto tinha sido para ele e não queria deixá-lo se sentir mal por isso. — Eu lembro. Pode deixar essa totalmente comigo também, porque é uma que eu quero fazer. Que tal uma surpresa hoje, hum?

— Surpresa… — Izuku repetiu, ainda visivelmente cabisbaixo, antes de concordar.

“Naquela noite nós dois saímos para um encontro em um restaurante sofisticado e, por isso, ambos vestíamos roupas sociais. Talvez tenha sido a primeira vez que vi o cabelo de Izuku arrumado para trás com gel, o que lhe dava um charme completamente novo, ou o fato de que seu pulso ocasionalmente escapando por baixo do paletó estava me tirando do sério, que quando retornamos ao meu apartamento eu o agarrei pela gravata e não o deixei voltar para casa.

Acordei um pouco desnorteado na manhã seguinte, devido ainda ao efeito da bebida, e senti um cheiro conhecido maravilhoso vindo da cozinha. A comida dele sempre foi deliciosa. Me espreguicei e vesti apenas uma bermuda antes de ir ao encontro do rapaz que casualmente conversava consigo mesmo cortando algumas folhas enquanto alguma coisa fritava em meu fogão.

Ao me ver, ele abaixou a faca e sorriu. Eu sentia como se meu corpo agisse por si próprio quando estava sozinho com Izuku. Teríamos aquele dia inteiro livre, caso nenhum acontecimento importante viesse a surgir na cidade, então resolvi dar continuidade ao dia anterior ali mesmo no balcão. Nós fizemos uma grande bagunça e, no fim das contas, o que quer que estivesse no fogo queimou e precisou ser jogado fora. Por fim, ele quis recomeçar a cozinhar e eu o pedi para me ensinar a fazer também.

Segui suas ordens para lavar e cortar os vegetais, junto ao som da fritura que ele vigiava. Não lembro sobre o que conversamos, só de como eu estava feliz por preparar algo tão simples quanto café da manhã. Foi a partir daquele instante que eu decidi continuar fazendo as coisas de casa junto dele durante toda a minha vida.”

Shoto observou as bochechas do outro ficarem vermelhas durante a leitura e então seu semblante amenizar em um sorriso no final. Observá-lo reagir à determinadas situações era algo que gostava de fazer e esse desafio lhe estava rendendo boas experiências. Assim que ele levantou os olhos em sua direção, sugeriu pensativo:

— Que acha de irmos jantar em um restaurante hoje?

Dias de NamoradosOnde histórias criam vida. Descubra agora