O Garoto da Torre

Capítulo 19: Agora ou Nunca

Não só as estrelas brilhavam aquela noite, mas também a sua companheira, a lua cheia. O seu brilho transpassava a copa das árvores do interior de Normandie, no solo francês. O brilho prateado também cobria um lindo e gigantesco jardim de flores raras, de todos os cantos do globo, ao redor de um majestoso castelo. A construção parecia ser bem antiga, como se já estivesse ali desde sempre e apenas visse as eras e os séculos passarem. As estrelas e a lua tinham platéia daquela vez, um jovem alto, por volta dos seus 22 anos, roupas despojadas, até  mesmo manchadas, observando o céu pela janela da biblioteca do castelo, que ia do teto ao chão.

O jovem Alisson estava com olhar perdido na imensa esfera prateada elevada no céu, pensando nas tragédias do passado em como ele tinha chegado até alí. Até que foi interrompido por seu mordomo, e braço direito, Ulisses.

- Com sua licença, Senhor - Alisson concedeu - Venho lhe informar que o Jardineiro acaba de pedir demissão, alegando que o ambiente de trabalho é muito estressante e que não consegue trabalhar sob tanta pressão.

- Que Inferno! - Ali bateu o punho na mesa do lado dele. Ele sentou na cadeira e apoiou a cabeça entre as mãos, murmurando - Cassandra vai chegar em dois dias, esse jardim precisa estar em perfeitas condições, argh!

- Desculpe-me a intromissão, patrão, mas devo dizer que o jardim do palácio está exuberante, de dar inveja a qualquer outro. Não entendo o que a Senhora Cassandra tem a ver com isso.

Em geral, Ali era um homem muito estressado e mau humorado, as vezes sem paciência até de mais, esse era um dos seus maiores defeitos. Porém tinha muita estima e respeito por Ulisses. Ele trabalhava, quando mais jovem, para o pai de Alisson, o grande Primeiro Ministro de Mônaco, antes de falecer. Cuidou do pequeno Ali e da sua irmã e os viu crescer, mas era mais próximo do menino, por isso foi escolhido para ficar com ele no castelo. Então ele respirou fundo e tentou não esbravejar ao explicar.

- Depois que meu pai morreu, a fortuna da família ficou ao cargo de minha irmã Cassandra. Ao que tudo indica, me tirou do testamento. Nada me tira da cabeça que foi por causa do "incidente"... - começou ele e foi interrompido brevemente.

- O incidente com o... - não conseguiu terminar a frase, pois o olhar de Alisson era gélido e cortante. Ele limpou a garganta - ...foi um dia muito sombrio, Senhor.

- Ele nunca aceitou que eu rejeitei a filha de um influente Barão, amigo dele, e tudo piorou quando me surpreendeu no jardim, aos beijos, com o filho do seu escrivão, o qual ia sempre lá em casa. Depois desse incidente, me disse tantas coisas, coisas horríveis e nos distanciamos. Cassandra me disse que talvez aquilo tivesse sido a gota d'água para ele. E realmente foi.

Ulisses ficava só o observando, pensativo. O jovem a sua frente se parecida tão pouco com o garotinho que fora. Os traços delicados e alegres em seu rosto foram substituídos por feições de preocupação, linhas de expressão demarcadas, causadas por lembranças dolorosas do passado e olheiras um tanto aparentes, pelas noites em claro, por pesadelos recorrentes. A voz era pesada, podia-se sentir o rancor. Às vezes o mordomo só queria que o tempo voltasse e ele pudesse empurrá-lo no balanço mais uma vez ou ler uma história antes de dormir, como fazia nos tempos dourados da infância de Alisson.

- Para não me deixar "desamparado" - ele continuou - ele me me deixou essa propriedade, no meio do nada. Antes mesmo dele partir, me mandou para cá. Certamente pensava que, por ser num lugar isolado, eu teria tempo para pensar e tirar da cabeça que eu também gosto de rapazes - a indignação estava estampada em sua voz - como se realmente fosse possível uma coisa dessas, faça-me o favor!!

Ali deu um suspiro. - Eu não entendo a razão dele ter mudado tanto do uma hora para outra. Será que ele me amava mesmo? - abaixou a cabeça sobre a mesa de madeira macissa. Ulisses tentou se aproximar e acalmar o jovem patrão.