VII. Na penumbra

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29 de setembro de 1742

   O outono chegara. Lá fora, as folhas começavam a desprender-se das árvores, cobrindo a terra de tons de castanho, laranja, vermelho e amarelo. Naquele dia ainda por nascer, não restava nada mais do que uma manhã ainda muito escura e húmida, nascendo no seio de uma brisa desagradável, fria, um sopro de morte que adivinhava já o inverno soturno que se faria sentir naquele ano. 

   Axl Rose vestia-se de preto, assim como o resto dos acompanhantes daquele cortejo fúnebre. Descia as escadas de pedra do castelo solenemente, com a sua capa negra a deslizar por cada degrau, arrastando as folhas da estação consigo. 

   Uma série de candeias alumiava tenebrosamente a madrugada lúgubre por um caminho sinuoso. O vento embalava a harmonia do hino de trisagion, os lamentos sombrios e melancólicos das vozes do coro. 

   Alguns encontravam-se desfeitos em prantos, tentando conter as lágrimas de tristeza, outros rezavam, lançavam injúrias contra os otomanos que acreditavam ser os culpados pelo assassinato, e os mais ousados murmuravam, embora com receio, que tanto a morte de Maria Forrester como o desaparecimento da irmã havia sido obra de um vampiro. Estavam de volta, diziam. 

   A marcha mortuária deixou os portões do castelo, desenvolvendo-se, em curva, em direção à necrópole. Atravessaram um corredor de largos ciprestes até alcançarem o lugar destinado ao enterro, onde os coveiros já se encontravam preparados para cobrir o caixão de terra. As candeias dos criados foram pousadas para clarear aquele espaço tão escuro, algumas em cima de sepulturas, outras no chão, e as gentes que ali estavam aglomeraram-se silenciosamente em torno do local do funeral, de crisântemos a balançar nas mãos, enquanto esperavam a ocasião para os lançarem para a cova. 

   Aquele funeral não se equiparava aos outros daquela época. Não era uma ocasião onde celebrariam a vida do defunto com histórias, onde procederiam a um banquete posteriormente; Não. Era uma ocasião trágica, a morte de uma alma ainda jovem, uma donzela por casar. 

   O sacerdote colocou-se em cima de uma rocha semelhante a uma lápide tombada para proferir uma breve benção final, recitando-a pausadamente do seu livro sagrado. Dando-a por terminada, fechou a bíblia, e declarou o seguinte:

   -Não percais a fé em momentos de desespero, irmãos e irmãs. Recordai-vos de quem sois e a quem respondeis.-advertiu num tom autoritário, apontando com o olhar para cima-Acima do céu escuro, está um paraíso luzente. Caminhai para lá, assim como o fez Maria Forrester, e como muitos outros que, infelizes em vida, felizes na eternidade serão. Ámen. 

   Um coro lugente de vozes repetiu a última palavra em uníssono. O sacerdote desceu da rocha, da qual se aproximou, depois, o Lorde Forrester. Era um homem na casa dos 50, de aspeto firme e imponente, não tanto como o do Príncipe, mas que pedia respeito. A sua figura era robusta para a idade, e a sua barba e os cabelos grisalhos, porém penteados, complementavam os traços fortes e maduros da sua face. Aquele homem que ali estava era, contudo, completamente diferente. Nos poucos dias que passaram, Forrester emagracera, e apresentava-se desalinhado, de olhos encovados, secos de lágrimas, e de face amarela, notável mesmo na escuridão. A morte de Maria e o desaparecimento de Leopoldina estavam a sugar-lhe a vida. Viúvo, de idade tardia e sem filhos nem filhas, não restaria um sucessor, um herdeiro que continuasse a promover a honra da casa.

   Apoiado num bastão, e com gestos muito lentos, preparou-se para se despedir da filha. Murmurou umas palavras baixas, quase inaudíveis, de voz profunda e marcada pela dor. Lamentou a sua perda durante largos minutos, até fazer o sinal da cruz, de forma compassada e mão trémula, quase a desfazer-se, a evaporar-se e a ser levado pelo vento. Um dos seus lacaios ajudou-o a descer antes que ele, velho, caísse. 

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⏰ Última atualização: Jul 29, 2021 ⏰

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