O serviço

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Os membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias são conhecidos pela devoção.

Levamos uma vida regrada. Realmente procuramos viver aquilo que sabemos ser verdade. Mas, quando somos missionários da Igreja, essa vida regrada é extremamente mais radical.

Existem restrições sobre o contato com o sexo oposto, ou com crianças e animais.

Em momento algum podemos estar sozinhos, então é nos designado um companheiro missionário que passa 24horas por dia, 7 dias da semana ao nosso lado e é trocado de tempos em tempos.

Alguns dos jovens, ao sair para uma missão, já estão em um relacionamento com alguém. E isso torna as coisas um pouco complicadas, já que só podemos ter contato com familiares e amigos uma vez por semana, via email (redes sociais também são proibidas).

Não era o meu caso. Até esta altura eu não tinha me relacionado com ninguém.

Existia sim, a moça por quem meu coração batia mais forte, mas ela foi muito enfática ao me dizer não. Então, pelo menos esse problema eu não passaria.

Me adaptei até bem as regras missionárias. Levantar as 6:30hs da manhã e ir dormir as 22:30hs. Procurar, ensinar, batizar e ajudar pessoas virou uma rotina que facilmente aprendi a amar.

A cultura Cabo Verdiana me fascinou rapidamente. As pessoas ali não eram como as pessoas no Brasil. Era fácil aprender amar e confiar nelas.

Procurei aprender o máximo e desenvolver talentos enquanto missionário.

Antes, tinha muita dificuldade em falar com pessoas, agora dar um discurso e manter uma conversação era mole.

Se eu não conseguia falar inglês, eu conseguia agora entender quase perfeitamente (graças aos meus muitos companheiros missionários americanos) além de aperfeiçoar o espanhol e o crioulo, o dialeto nativo.

Os dois anos passaram voando, e eu não queria ser só mais um missionário que passou pelo arquipélago cabo verdiano e depois foi embora. Eu queria deixar uma marca, um legado.

Meus últimos meses eu queria fazer diferente.

Fui designado a trabalhar na Ilha do Fogo em Cabo Verde. A ilha que possui um vulcão ativo e uma das mais belas vistas para o céu a noite. Aquele era o lugar perfeito.

Depois de orar tive a forte impressão que poderia ajudar outras pessoas a desenvolver desejo de trabalhar como missionários . Desenvolver da mesma forma que eu desenvolvi.

Então, junto com meu companheiro, Elder Abularach, da Guatemala, abrimos uma classe de preparação missionária.

Um sucesso.

Muitos rapazes se propuseram a participar e ajudar no curso. E a ensinar pessoas. Queriam experimentar a sensação de serem missionários.

E para nossa surpresa, uma moça se juntou ao grupo. Mas o curso ocorreu normalmente e os jovens passaram a ensinar outras pessoas na vila de Cova Figueira na ilha do Fogo. Muitos foram batizados. Meu legado estava quase pronto.

Agora só faltava enviar os jovens para a missão. Ajudamos eles a fazerem os exames médicos, preencherem toda a documentação necessária.

Mas o meu tempo tinha se esgotado. Precisava voltar para o Brasil.. Para minha família.

No último dia do curso, eu me despedi dos jovens dando um forte abraço em cada rapaz. Mas na hora de abraçar a única moça, Suely, devido as regras missionárias, somente apertamos as mãos. Lembrei-me do que haviam me ensinado no Centro de Treinamento Missionário em São Paulo sobre abraços entre missionários e, enquanto apertávamos as mãos, levei nossas palmas para cima, na posição vertical, e coloquei meu dedão nas costas de sua mão, enquanto nossas palmas se tocavam, num clássico abraço missionário mórmon.

Me senti estranho ao olhar os olhos dela molhados pelo gesto, mas queria realmente que ela se sentisse especial.

Agora eu voltaria para casa, meu legado havia sido deixado.

A Lua de FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora