Prólogo

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Remus estava no intervalo entre as aulas quando viu a postagem. Parou com o sanduíche na metade do caminho, a boca entreaberta, enquanto observava a si mesmo naquela foto, sem noção do espaço-tempo em que fora capturada. Estava numa greve contra a tecnologia, alegando que celulares o alienavam do que verdadeiramente gostava de fazer: ler, ver um bom filme, conversar com a mãe sobre o dia, dormir. Considerava a maioria dos posts fotográficos superficiais, sorrisos falsos, declarações vazias... Era compreensível, então, que houvesse perdido mais aquela coisa, postada há quarenta e duas horas.

Quarenta e sete comentários.

Curtidas de pessoas que nem conhecida.

Um número grande de hashtags e uma legenda:


@6bl4ck: apreciem.


Na foto, Remus aparentemente dormia, a bochecha contra o travesseiro fazendo um leve bico em sua boca. Na cintura, o lençol se embolava, amassado, deixando a mostra a cueca box azul e toda a extensão das costas. Não precisava usar o recurso zoom para ver todas as cicatrizes ali, as marcas arroxeadas nas costas e nas pernas, os vergões sobressaindo na pele e aquela cor esverdeada, apática, típica dos anêmicos. Era o único significado para as tais marcas, mas ninguém sabia disso visto os tantos comentários maliciosos na postagem.

Sirius havia respondido a todos.

Quando ele se aproximou acompanhado de James, trazendo consigo uma lata de refrigerante apenas, Remus o olhou. Sentiu o vinco entre os olhos doer, tenso. E, diante do questionamento mudo de Sirius, que somente arqueava as sobrancelhas depois de se sentar, Remus ergueu para ele a tela do celular.

O riso anasalado, característico do amigo, preencheu o ambiente.

— Você ainda não tinha visto? Planeta Terra chamando Aluado... — Sirius respondia, como se não houvesse problema em postar uma foto dele, seminua, sem autorização.

Sirius não via problema em muita coisa.

Remus precisou respirar fundo uma vez. Engoliu saliva, voltando a olhar a tela do celular por um momento e tentando não transparecer o nervosismo, mas o rosto começava a adquirir uma coloração avermelhada.

— Pode apagar, por favor? — Pediu, a voz muito baixa e com um tom de rouquidão.

— Porque? — Sirius questionou de volta, dando uma cotovelada em James que sorriu cúmplice. Era sempre assim — Você viu o tanto de curtidas? Nós estamos famosos, Remy.

— Eu não quero estar famoso — ergueu os olhos para ele então, enquanto ainda tentava manter civilizada o tom daquela conversa, mesmo quando o peito doía — E você não deveria ter postado esta foto sem sem me dizer nada.

— Eu tô só ajudando um amigo a encontrar uma boa foda...

Remus desistiu da calmaria.

Levantou-se da mesa, deixando sobre ela o sanduíche e cerrando os punhos, cheio de tonos. Não queria fazer uma cena, mas já havia engolido tantas vezes que a garganta chegava a doer. Ainda assim, tão perto de explodir, o rapaz ainda tentou moderar a voz.

— Dá pra apagar a porcaria da foto? — Repetiu, mordendo a língua para não proferir mais nada, ou não administraria os argumentos sem que tudo se tornasse uma bola de neve ainda maior.

— Meu Deus, Remus, foi só uma foto... — e ainda existia ali, nos lábios de Sirius, aquele riso gaiato.

Enquanto sentia o movimento involuntário da perna inquieta, Remus observou enquanto Sirius tirava do bolso o celular e zapeou o dedo pela tela. Observou por um tempo o seu rosto, o maxilar quadrado, relaxado, o riso ainda brincando na boca, os cabelos num emaranhado de ondas caindo em sua testa, quase escondendo os olhos. Sentiu o peito doer. Era um sentimento que estava acostumado, mas cada dia se tornava mais insuportável.

Quando Sirius ergueu os olhos para ele toda a raiva voltou a lhe corroer, como um veneno que percorria suas veias. Sirius ergueu também a tela do celular, mostrando o feed do Instagram com as fotos de sempre: as festas, os amigos, as garotas do colégio... A foto de Remus Lupin tinha sido apagada.

Não quis dizer mais nada. Curvou-se somente para pegar a mochila do banco do refeitório, pendurando-a nas costas e seguindo dando a volta na mesa. Antes que pudesse se afastar, sentiu o toque frio dos dedos de Sirius em seu braço, sem qualquer pressão.

— Me diz que não está chateado com isso... — não era uma pergunta, se parecia mais com uma indagação inconformada — Remus, é uma foto! Igual a tantas outras que a gente tem, eu, você e o James no Instagram. Desculpa se pegou mal...

Fechou os olhos por alguns segundos. Queria evitar transbordar-se, então puxou de volta o braço, olhando de novo para Sirius. Por um momento achou ter visto em seus olhos um reflexo de compreensão. Ou uma brecha para uma conversa.

— Me dá um motivo pra desculpar você — disse, a voz tão baixa que quase não era ouvida.

— Bom, primeiro que é uma tempestade em copo d'água — e lá estava ele novamente. O Sirius orgulhoso, que não dava o braço a torcer. O Sirius que nunca se saía por baixo — É uma besteira se chatear por algo assim, eu já apaguei a foto. Posso te dar dez motivos, se quiser...

Remus respirou fundo.

Manteve-se parado, olhando para ele. Sentia, mesmo que não o olhasse diretamente, a apreensão de James ao lado do outro. E somente quando arqueou as sobrancelhas foi que Sirius percebeu que Remus esperava pelos outros nove motivos. Ou melhor, por todos os dez. Porque não cabia a ele definir se o que ele sentia era exagero ou não.

— O que? Agora? — Sirius não conteve o riso nem quando pressionou os lábios.

Era só mais uma brincadeira para ele. Mas disso já tinha certeza há um tempo.

Remus só não podia mais fingir que estava tudo bem.

Deu as costas para Sirius e James e seguiu para longe dos dois.


*****


BÔNUS

@marlsmcknonn: MEUDEUS, Mas o Remus é gostosinho assim desde quando? Fica se escondendo embaixo das roupas, mostra mais!

——@6bl4ck: De nada, de nada.


@doemeadowes: Remus. Me namora.

——@6bl4ck: Ele nem gosta de meninas...........

——@xxlovegood: Me namora então! rsrs

——@6bl4ck: Remus Lupin está solicitado, não é?! UASHSUAHSUHA


@skeeter: E essas marcas aí? Quem foi que fez? Quem é a sortuda? Ou seria sortudo? Eu quero detalhes na minha mesa para ontem.

Dez motivos para amar Sirius Black - W O L F S T A ROnde histórias criam vida. Descubra agora