O Primeiro Passo

27 1 0
                                    

A mulher ia na minha frente, para onde eu não sabia, apenas a seguia. Passamos pelo vilarejo, mas já não havia mais ninguém, não se ouvia nada além do barulho do riacho que percorria por ali. Fomos em direção à floresta. Durante todo o trajeto, nem ela, nem eu, dissemos uma palavra sequer. Estava ansiosa para saber aonde aquele ser misterioso me levaria.
Chegamos então à uma região que eu não havia conhecido ainda, uma região escura da floresta, e mesmo estando de dia, as árvores tapavam quase toda a luz, e até parecia noite. Uma cortina de cipós se erguia em nossa frente, a mulher passou por entre a cortina, e pude ver uma luz encantadora vinda do outro lado. Atravessei.

Existia um lago, e esse lago refletia a imagem do que seria a Lua naquele mundo. Tudo ali era do mais claro azul celeste, até o mais escuro cobalto, e entre um canto e outro, o turquesa coloria com elegância e harmonia com as demais cores. Era quase uma Aurora Boreal, só que nas extremidades de uma floresta.

- Querida... - a voz rasgada da mulher finalmente pôde ser ouvida novamente. - Dê o primeiro passo até o lago, e imagine que esse passo irá decidir todo o seu futuro. Pense em quem você realmente é, e no que está fazendo aqui. Pense na sua vida, nas pessoas que conhece e ama. Pense em tudo que conseguir pensar, nesse único passo, pois ao se olhar naquele lago, irá se revelar diante de você a sua mais pura e verdadeira forma, muitos não estão preparados para encarar isso, então decida, nesse único passo, se você realmente está pronta para encarar a si mesma.
Aquele discurso proferido por Mãe Maktwa, me fizeram tremer antes mesmo que eu pudesse refletir sobre. Ela emanava um poder enorme cada vez que dizia algo, sempre profundo, mas nunca sem razão.
Naquele momento, embarquei em uma viagem sem rumo, em busca de encontrar algum resquício do que sobrou do mim. Do que eu já fui. Senti que meus pensamentos iriam me afogar a qualquer momento...

Fechei meus olhos, e dei o primeiro passo.

✥ ✥ ✥ ✥

A vida é como um passarinho que aprende a voar, é necessário se arriscar pra poder alcançar a liberdade, mas o medo do desconhecido acaba nos roubando a coragem. Foi assim que sempre me senti... Um passarinho que sempre que está prestes a voar, é puxado para trás. Isso me fez desistir da minha liberdade, mas desde que eu havia entrado naquele lugar, pude sentir a vontade e a coragem de fazer algo real, e eu fiz. Me surpreendi comigo mesma, bem... Talvez eu seja mais do que penso ser. Mas será que tem como eu descobrir quem eu sou? Porque eu posso mudar... O "Eu Sou" não é eterno, mas o "Serei" sim. No entanto, não controlamos o que seremos ou deixaremos de ser, só conseguimos controlar quem somos, e aprender com quem éramos. Cheguei a conclusão de que eu não sou, eu simplesmente estou aqui, agora, e o que eu fizer pode causar impactos , bons ou ruins. Mas não quero me pré-definir, quero me descobrir e me reinventar, eu não quero ser uma coisa só, ou ser resumida em uma palavra ou termo. Eu quero ser a mudança. A metamorfose. A revolução. A rebeldia. A verdadeira justiça. O amor. A consciência. A igualdade. Eu quero ser livre. Eu quero ser um milhão de coisas. Talvez eu queira ser mais coisas do que o universo e sua infinidade.

✥ ✥ ✥ ✥

Quando olhei meu reflexo na água, tive a surpresa de ver exatamente a mesma coisa que vejo no espelho. Não tinha nada de diferente. Era meu reflexo, e era eu. Mãe Maktwa me observava com um sorriso no rosto, de suas mãos saiam chamas verdes iguais as das velas de sua tenda. Pude compreender que, o desafio não era encarar o meu reflexo, o desafio era me ver através de minha alma, através da minha mente, sem precisar olhar para o meu reflexo para tentar descobrir quem eu sou. Era uma metáfora.

- Você se saiu bem querida. Que bom que entendeu a lição, isso significa que existe algo nobre em ti. Venha, vamos voltar.

Ela me estendeu a mão. As minhas lágrimas escorreram, elas estavam frias como gelo. Segurei na mão dela, e instantaneamente eu pude sentir uma vibração por todo meu corpo, me arrepiei toda. Aquela mulher possuía muito poder, e era lindo de ver como ela usava esse poder para ajudar as pessoas, e não para se sobressair à elas.
Voltamos enquanto a tarde caía, o vilarejo ainda estava vazio. Quando chegamos à tenda, ela me ofereceu um chá, eu bebi sem pensar, e o chá estava maravilhoso. Em pouco tempo senti meu corpo relaxar, e relaxou tanto que cai no sono sem perceber.

 Viagens MentaisOnde histórias criam vida. Descubra agora