OS ALIADOS

1.3K 190 64
                                    

Sinto o jat lag massacrar meu corpo quando desembarcamos em Las Vegas, pouco depois de duas da manhã, após treze horas de viagem, sem escalas. No hangar da família, uma frota de SUVs nos aguarda para nos escoltar até em casa. Nossas bagagens são postas nos porta-malas e seguimos caminho. Giovanna vai em um veículo, com seu segurança; eu vou em outro, com meu próprio. São três da madrugada quando, por fim, chegamos.

— Paolo. — Ele ajuda minha esposa com as bagagens e se vira para mim ao ouvir seu nome.. — Preciso de um segundo com você.

Ele assente e termina de ajudar Giovanna. Marcho na frente, precisando me controlar para não tomar qualquer atitude precipitada antes da hora. Na minha sala social, preparo um uísque, esperando Paolo terminar de descarregar as malas no quarto da minha mulher. Tomo um gole longo, engolindo o líquido com força, como se fosse difícil ingeri-lo. Minha raiva por esse babaca imprestável vem sendo cuidadosa e pacientemente administrada.

— Senhor. — Ouço-o me chamar.

Não me viro de imediato. Termino minha bebida, primeiro. Bato o copo no balcão e, por fim, volto-me para Paolo, parado a quatro metros de mim, estacionado no meio da minha sala, mãos para frente, na costumeira posição de segurança. Desabotoo a casa do punho do meu paletó e me aproximo, aos poucos, arregaçando as mangas.

— Eu deixei bastante claro, Paolo, que deveria ser informado de cada passo da minha esposa. A primeira você falhou. Tudo bem, não deixei especificado o protocolo, você é novo por aqui, e, apesar de eu achar que é algo óbvio, relevei sua falha. — Paro na à sua frente, a centímetros do seu corpo. O homem sequer reage. — Então você falhou uma segunda vez.

— Senhor...

Eu o atinjo com um soco no estômago. Ele geme e se curva, engolindo qualquer maldita explicação que estivesse prestes a me dar. Encurvo-me na sua direção, sussurrando no seu ouvido:

— Mas dessa vez não vou relevar sua falha.

Antes que ele tenha tempo, soco seu estômago outra vez, e outra e mais outra. O homem não tenta se defender, recebendo minha fúria sem protestar. Paolo cai no chão, e passo a distribuir os socos no seu rosto. Desconto toda a minha raiva no filho da puta, ignorando a dor nos ossos da mão. Tudo que sou nesse momento é ódio e cólera.

Enquanto espanco o desgraçado, penso em Giovanna, no perigo que correu nas vezes em que saiu sem esse maldito. Minha fúria aumenta ao imaginar que ela poderia ter se machucado por causa disso. Por que fico furioso quando penso nisso? Importar-me com essa garota, mesmo minimamente, deixa-me ainda mais revoltado. O que alimenta minha ira e me faz esmurrá-lo com mais força, um grito de ódio escapando das minhas cordas vocais.

Alguém me puxa para trás, ao mesmo tempo que ouço meu nome ser gritado. Desvencilho-me de quem quer que esteja me segurando e retorno para Paolo, decidido a esmagar sua cara até a morte. Outra vez, um braço forte me tira de cima dele, acompanhado de um "Você enlouqueceu de vez?", proferido por uma vez feminina.

Levo um milésimo de segundo para me localizar. Meu guarda-costas está me segurando pelos braços — e um zumbido irritante entra pelos meus ouvidos — dizendo-me para respirar fundo e ficar calmo. Olho ao redor. Paolo está com a cara ensanguentada, talvez com alguns bons ossos quebrados, e Giovanna, vestindo uma camisola curta demais para estar na presença de três homens, está agachada junto dele, horrorizada com seu estado, como se pudesse ajudá-lo de alguma maneira.

— Por que você fez isso? — pergunta, indignada, erguendo os olhos verdes para mim.

Peso sua pergunta por um segundo longo demais e me recuso a admitir que, lá no fundo, o motivo seja ela. Que fiquei emputecido porque a incompetência dele como guarda-costas poderia ter custado sua integridade e segurança. Argumentei que essa preocupação era mais comigo mesmo porque se alguma coisa acontecesse com ela era para cima de mim que seu pai, meu irmão e os demais clãs viriam. Poderiam até achar que foi algo planejado de minha parte, uma vez que nunca concordei com esse casamento. Agora, não estou tão seguro desse meu argumento.

INTOCÁVEL (NA ÍNTEGRA ATÉ 20/04)Onde histórias criam vida. Descubra agora