DESEJO OBSCURO

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As próximas horas me deixam apreensivo enquanto espero por uma ligação de Nikolai. Penso em comunicar Enrico sobre a guinada de situação que aconteceu aqui, mas resolvo esperar mais algumas horas. Da última vez que liguei para ele, era madrugada e meu irmão não ficou muito satisfeito em ter sido acordado às três da manhã.

Poderia ter aplacado parte dessa angústia conversando com Giovanna para compreender que raios ela tinha ido atrás de mim, mas, quando chegamos, a garota disparou na minha frente e se trancou no quarto. Está lá até agora. Não saiu nem para se alimentar. Seu comportamento desperta um alerta dentro de mim e fico pensativo quanto às suas intenções e como, de novo, essa sem-vergonha conseguiu sair sem seu segurança — que deveria me informar de cada passo dela.

É pensando nisso que procuro pelo desgraçado. Dei uma dura dele no dia anterior, reforçando que preciso estar informado de todos os lugares que Giovanna vai. O rapaz — a droga de um garoto com não mais que vinte e tantos anos!­ — assentiu vigorosamente e garantiu que nada daquilo mais ia acontecer. Pelo visto, não é um homem de palavras.

O garoto está de pé do outro lado da porta da suíte, em posição ereta e quase inabalável. Apesar de novo, é forte, com músculos alongados e bem definidos. Mas não é bem treinado. Maldita hora em que me deram um soldado mal treinado. Na outra extremidade, está meu próprio segurança, bem mais velho e experiente que o guarda-costas de Giovanna.

— Paolo, ?

O rapaz acena, sem nem mesmo me olhar. Mas, daqui, sinto o cheiro do medo que exala dele. Sua coluna ereta, o terno preto bem ajustado, e os óculos escuros podem tentar passar uma pose impassível e despreocupada, quase destemida. Por dentro, contudo, esse bunda-mole está se cagando. Sei disso porque vejo como seus músculos estão tensos, as veias do pescoço mais salientes, uma pequena gota de suor descendo pela sua têmpora.

— Pode me explicar por que mais uma vez não fui informado sobre a saída da minha mulher?

Leva um segundo até ele me responder, mantendo a posição e o olhar para frente.

— Acompanhei a senhora Martini até o restaurante para que ela pudesse almoçar. Como ela não saiu das dependências do hotel, não vi necessidade de informar ao senhor. Antes de voltar para o quarto, sua esposa quis usar o toalete do restaurante. Quando notei a demora dela, me dei conta de que tinha fugido pulando a janela do banheiro.

Aperto a ponte do nariz e, em seguida, massageio as têmporas. A porra de uma garota de vinte e um anos conseguiu driblar um segurança.

— Por que não me ligou imediatamente?

— Não quis causar preocupação. Fui procurá-la e fazer uma varredura nas redondezas antes de alarmar qualquer coisa. Quando estava prestes a informar...

—... nós chegamos — concluo, recordando-me de encontrá-lo no elevador no saguão, quando íamos subir para a suíte.

A resposta de Paolo é um gesto de cabeça.

Ele ainda não me olha, mantendo a postura. E eu... Eu preciso fazer um esforço descomunal para não o arrebentar na porrada agora mesmo. Sua incompetência poderia simplesmente ter colocado tudo a perder. Tudo. Aperto os punhos com tanta força que minhas unhas começam a cortar a carne. Inspiro fundo e me controlo. Perder a cabeça com Paolo não vai resolver. Ao menos, não agora. No momento certo, esse bastardo descuidado terá o que merece.

— A partir de agora, quero ser informado de cada maldito passo dela, mesmo dentro do hotel. Mesmo se ela estiver no banheiro e ir para o quarto, eu quero estar ciente disso. Fui claro, Paolo?

— Sim, senhor.

— Ótimo.

Saio de perto desse desgraçado antes que eu perca de vez a paciência. Mal dou dois passos para dentro quando meu telefone toca dentro do bolso. É Nikolai. Já posso me encontrar com ele. Sigo todo o protocolo e, em pouco mais de meia hora, estou na mesma sala subterrânea de antes. No lugar de Sergei, na cadeira confortável, seu antigo braço-direito parece o chefão agora. Noto sua postura arrogante enquanto sou, novamente, revistado. Os mesmos outros dois seguranças, fortemente armados, estão logo atrás dele, protegendo-o.

INTOCÁVEL (NA ÍNTEGRA ATÉ 20/04)Onde histórias criam vida. Descubra agora