CAPÍTULO DOIS

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desconforto crescente

Ao redor de Velaris, três montanhas gêmeas camuflavam o lugar de qualquer olhar indesejado, possuindo caminhos nebulosos e armadilhas feitas para dificultar a trajetória daqueles que ousavam atravessar o frio insistente dos montes de neve. Adentrando a cidade, o Rio Sidra era melhor aproveitado como ponto de rota para navegação, sendo responsável pela travessia de toda a exportação local, além de ser protegido pela magia do Grão-Senhor que os separava do resto de Prythian, se bastando na própria significância. A verdadeira Corte Noturna.

As solas de seus sapatos desgastados batiam contra a estrada que compunha o caminho até a cidade, Lucien experimentava o calor sutil do sol esquentando sua pele escura como uma carícia, aproveitando a raridade do clima ensolarado, substituindo o constante céu nublado de Velaris. O cheiro habitual de limão-verbena o fez perceber que se aproximava de uma praça que comercializava alimentos típicos da região, fazendo-o desacelerar a caminhada devido à distância significativa entre ele e a biblioteca, mesmo que o horizonte mostrasse sua silhueta.

Não foi a intenção de Lucien deparar-se com Azriel, sequer imaginaria que o encontraria perambulando por aqueles corredores escuros, muito menos poderia adivinhar que a visão do illyriano iria chamar tanto a atenção, nem mesmo percebeu quando começou a observá-lo.

O mestre-espião não precisava verbalizar para que Lucien soubesse o quanto era odiado. Aqueles olhares desconfiados não eram tão discretos quanto deveriam ser, pelo menos não era o suficiente para que não percebesse que era observado o tempo todo.

Não que julgasse a postura de Azriel sobre ele, pois, mesmo com boas intenções, seu passado como um emissário sem Corte falava mais que o próprio. No entanto, não poderia negar o desconforto ao notar as sombras do encantador vigiando-o, provavelmente Azriel sequer tinha conhecimento de que Lucien consegue enxergá-las através de seu olho esquerdo, assim como também consegue vê-lo quando se cerca de escuridão.

A desconfiança não era uma reação exclusiva de Azriel, o feérico consegue sentir os olhares que recebe ao caminhar por entre os moradores de Velaris, seus sorrisos tornam-se forçados para agradar, todos pareciam prontos para qualquer traição por parte de Lucien.

Não os julgava, afinal como poderia? Ele era um forasteiro, alguém que obviamente não pertence ao ambiente, a suspeita era justificada.

"É tudo muito novo, Lucien, você irá se acostumar a cidade, assim como eles irão se acostumar a você" disse Feyre quando tentou conversar sobre seu incômodo.

Entretanto, ela não consegue entender a maneira como Velaris é sufocante para ele. Desde o clima nublado até os sorrisos excessivos dos moradores pareciam aumentar o desconforto que se alimenta de tais sensações. Sabia que não era um bom pensamento considerando que sempre foi tratado com o mínimo de decoro, mas não poderia evitar, ele era um estorvo, uma lembrança dos piores momentos que Feyre viveu na Corte Primaveril.

Seus cabelos moveram-se para frente quando surgiu um sopro que bagunçou sua trança improvisada, seus cachos volumosos caíram nas laterais do rosto, fazendo-o perder a paciência com os fios, desfazendo o penteado somente para prendê-lo novamente em um coque.

Lucien andava pelas ruas da cidade, ouvindo comerciantes erguendo a voz para atrair mais clientes, enquanto milhares de pessoas atravessavam seu caminho, muitas paravam somente para observá-lo passar com aquele olhar desconfiado que já estava acostumado, outras eram menos discretas, apontando para seu olho metálico com uma mistura de horror e curiosidade.

Os sons de crianças brincando ecoavam por seus ouvidos, elas acompanhavam os pais quando apareciam de manhã para trabalhar, aproveitando a folga da escola para se divertirem com outras crianças da mesma idade. E vê-las correndo atrás daquela bola de couro envelhecido o levava de forma inconsciente até a própria infância, onde costumava fugir do palácio Outonal, decidido a encontrar com outras crianças da cidade, brincava o máximo que conseguia, pelo tempo que conseguia antes de ser encontrado por guardas.

TALKING TO THE MOON || lurielOnde histórias criam vida. Descubra agora