I. Casca Oca (cap. 6)

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1 ano depois...

Os calçados macios atritavam-se contra o chão úmido pela chuva recente, seu rosto era encoberto pelo capuz do moletom cinza.

Já estava correndo há mais de uma hora, mas não parava. Sua cabeça estava no limite, sua mente era cruel e trazia pensamentos que lhe causavam ansiedade.

A caixa torácica subia e descia, os dedos eram unidos em um formato de punho bruto. A garganta estava seca, quase rasgando ao ter a saliva percorrendo a cavidade. As panturrilhas ferviam e imploravam para que um descanso ocorresse.

Os ombros se encontravam tensos assim como os olhos que transbordavam agonia.

Correu até um parque deserto, por ainda ser cedo e não ter um céu ensolarado, e se assentou em um dos bancos vazios. Olhou para as árvores cheias de vida com a respiração ofegante e abaixou o capuz.

Zhan havia retornado à Pequim fazia quatro meses.

Reencontrou sua esposa assim que ela foi "liberada" do hospital psiquiátrico, isso há um mês. Matriculou novamente sua filha na antiga escola em que estudava antes de irem para Finlândia e voltou a construir estabelecimentos em seu país.

Se a vida havia melhorado? Não.

Se ele havia esquecido? Também não.

Durante esse período em que obteve tempo para se readaptar aos moldes de sua nação, foi acometido por uma dúvida intensa. Repensou sobre suas escolhas, atitudes e principalmente família. A última lhe trazia uma fadiga, um ar de impotência tão forte que sufocava suas vias respiratórias e amassagava seu interior.

Sinceramente, se perguntava sobre o que era certo e o que era errado. Sobre o quanto estava errado em tomar certas ações em Helsinque, e o quão solitário seria se não as tivesse acolhido em seus movimentos e gestos.

Ele estava em um dilema fodido.

E se encontrava fodido, por dentro e por fora.

Suspirou pesadamente e arrancou do bolso um maço de cigarro, retirou uma unidade e a ascendeu com certo desespero. Não gostava de pensar dessa maneira, era chato, era angustiante, uma porcaria!

Passou os dedos longos, com unhas roídas, pelos fios escuros e agora bastante curtos. Fechou os olhos e repousou a cabeça sobre as costas do assento, continuando a tragar sua droga preferida e batendo o solado do tênis da perna direita na grama.

– Porra... – precisava se acalmar, respirar fundo e voltar para casa.

Ele havia brigado com sua esposa, Mei. Ela era um ser muito delicado, não dizendo em tons machistas, mas sim em questões mentais. Pulava de clínica em clínica, de remédio para outro remédio.

Era complexa demais.

– Respira fundo, Zhan... – arranhava a nuca enquanto sentia os lábios tremerem e as orbes se inundarem.

O mais desgastante era não ver evolução em praticamente nada.

Eram os mesmos olhares tristes e as constantes discussões que o levavam a exaustão. Mei não saía da estaca zero, parecia que havia pego cobertores e criado um lar naquele patamar. E isso não só a prejudicava, como também carregava Xiao para baixo, para o fundo das águas azuladas e frias.

Tons De Gelo {WY+XZ}Onde histórias criam vida. Descubra agora