O ANJO DA UTI

PRENDENDO CLIPES DE PAPEL

Após a chegada do trabalho na quinta-feira, o Sr. Antony retirou o barco com o Sr. Ramirez e remou até um velho píer que ficava próximo a sua casa. Amarrou o barco e só voltaria a remar novamente pela madrugada, quando Ed estaria dormindo.

Separou uma mochila onde colocou uma faca, lanterna e uma chave mestra que o ajudaria em sua missão. Ed estava se preparando para dormir. Deveria aguardar para sair lá pelas duas horas da manhã.

Partindo para o píer onde estava o barco, retirou as amarras e se afastou da praia, imergindo pela escuridão sob os holofotes da lua, levaria uma hora remando até vencer as ondas e chegar ao destino. Não demorou dez minutos e já tinha companhia: tubarões o rodeavam. Era de se esperar, por isso o Sr. Antony preparou pedaços de carne e jogou-as o mais afastado possível do barco. Enquanto remava, ouvia as barbatanas baterem na água à procura do banquete. Guardou o resto para quando voltasse, não queria a companhia destes predadores famintos.

O barco estava nos fundos da "Stuartshop", o desafio era vencer as ondas da arrebentação. Enquanto se aproximava, afastou-se dos rochedos e pegou uma carona numa das ondas fora da arrebentação. Na descida pegou o rumo do pequeno píer quase escondido entre a vegetação. Já na praia, arrastou o barco e retirou a mochila. Olhou ao redor e seguiu para a escadaria que dava acesso a porta. Ligou a lanterna e viu galões de diesel e motores de popa em manutenção. Uma oficina improvisada num pequeno galpão onde havia uma lancha Runabout de trinta pés. Uma lancha de série luxo, fabricada artesanalmente e nova. Não era comum ver uma destas por ali.

   ̶   Ora, mas que lindo brinquedo Sr. Kurt.   ̶  Pensava que poderia ser uma lancha de fuga possivelmente.

Subindo na lancha verificou os compartimentos. Documentação em dia e nota fiscal de compra em nome da "Stuartshop". Abriu cada paiol, cada compartimento e ... bingo! um coldre com uma arma embaixo da poltrona do piloto.

 ̶   Hummm... Com certeza isso não é para pescar.

Descendo da lancha, seguiu pelos lances de escada em direção a porta. A iluminação era precária, mas era um ponto a seu favor. A luz da lanterna mostrou um outro acesso embaixo da escadaria de madeira. Mudança de planos. O porão estava convidativo, mesmo com o interior negro pela escuridão. Os ferrolhos estavam emperrados e exigiram esforços, o melhor é que não haviam cadeados nem correntes. Naquela área não circulavam pessoas rotineiramente, só o mecânico ou o marinheiro ocasionalmente.

As portas de entrada do porão eram pequenas e metálicas cobertas pelo musgo e enferrujadas, rangeram ao se abrirem. A lanterna possuía um foco muito bom e era de muita ajuda. O Sr. Antony se abaixou para entrar e haviam três degraus até o piso.

O interior era muito húmido e com o piso rachado pelas raízes das árvores. A vegetação rasteira cobria a parede. Haviam peças de barcos, hélices, eixos, blocos de motores dispostos nas estantes que rodeavam aquele porão. Mais ao fundo um pequeno corredor com uma pesada escotilha de ferro fundido que era aberta com uma grua de correntes. Destravando a escotilha, o Sr. Antony foi abrindo-a lentamente.  

 ̶  Muito engenhoso esse Sr. Kurt, só não usou a inteligência a favor do bem.    ̶  Protestou em pensamentos.

Agarrou-se a escada como quem descesse ao interior de um submarino. A sala estava organizada. Estantes numeradas com caixas metálicas lacradas. Estandartes nos cantos das paredes, uma escrivaninha com cadeira e máquina de escrever, dentro do gaveteiro retirou plantas arquitetônicas, eram da construção do lugar, assinadas pelo arquiteto Ivanovich Romanov, pai do famoso arquiteto Arthur Romanov.

Foi em direção ao armário que estava fechado. Utilizando a chave mestra abriu a fechadura e se deparou com o uniforme do Sr. Kurt. Estava completo e com as insígnias características na gola e peito. Suas botas longas estavam logo abaixo. Abriu a gaveta e achou as luvas, junto com diversos broches e medalhas. O quepe com a caveira mostrava o tamanho da patente monstruosa.