SURPRESA!!! A atualização saiu antes do que eu falei, né? Pois é...
Uma dica: apertem o play na playlist, leiam o capítulo passado novamente e, em seguida, venham para esse. Garanto que não vão se arrepender :)
━━━━━━━ ⟡ ━━━━━━━24 de Janeiro
Uma semana se passou desde o impasse do que denominei de "Tradição da meia-noite", uma semana desde que refiz minha mania em mais um solstício de verão, uma semana desde que fui em busca do colchonete recheado de fungos e da lamparina empoeirada de vovô e, por fim, uma semana desde que tomei uma decisão errada.
O relógio bronze envolto no meu pulso marcava onze horas e cinquenta e oito minutos, havia chegado ao sótão com todos os objetos necessários junto a mim — os quais mencionei antes —, contando com a mínima sorte de não pegar nenhum resfriado ou doença por conta das tralhas que estavam em minhas mãos.
O barulho da madeira velha soava com um rangido em todo o cômodo mal iluminado pela candeia, visto que a lâmpada de energia não era trocada há anos. Eu caminhava em passos cautelosos, afinal, encontrava-me ainda incerto sobre minha decisão, todavia, estava muito perto de meu objetivo para ceder, por isso, seguir em frente era a alternativa mais coerente.
Ao abrir a porta, um vento frio abraçou minha derme de imediato, meu coração acelerou e me vi querendo voltar atrás. Antes que o fizesse, fechei os olhos, respirei fundo e me forcei a dar um impulso para subir no telhado, meu destino final. Não deveria e nem poderia fraquejar.
Contei até três morosamente, antecedendo o momento em que abri os lumes e dei de cara com a imensidão do horizonte obscuro, quieto, mergulhado no breu incômodo. Levantei meu olhar ao céu, e sem tardar, entristeci-me.
O firmamento que ansiava admirar pelo resto da noite estava sem a luz do astro que sempre apreciava. Naquele dia era lua nova, e apenas um sombreamento da luminescência presenteada pelo sol era aparente na vastidão sombria de um céu sem sua protetora. Pouquíssimas estrelas estavam presentes também, deixando tudo ainda mais melancólico. Mesmo abatido, trouxe o colchão para cima e o estendi pela parte mais plana que consegui encontrar naquele local, acendi a lamparina e a deixei um pouco mais à frente, em seguida me sentei sobre a superfície acolchoada e voltei a mirar tudo à minha volta.
O que eu estava fazendo ali, afinal?
Primordialmente, minhas expectativas estavam altas para admirar a beleza celestial noturna enquanto o frescor saudoso soprava em minha tez, conquanto, a escuridão não deu espaço para isso. A brisa que esperei sentir com vigor era efetiva, no entanto, muito mais gelada do que lembrava. O sentimento cálido e nostálgico havia dado lugar a um aperto no peito insuportável, era um sentimento tenebroso e ao mesmo tempo recheado de dor, angústia e desespero por algo que eu desconhecia. Aquilo estava me fazendo muito mal. Tentei ser forte e continuei no ideal de trazer de volta a Tradição da meia-noite, mas à medida que me esforçava, mais o sufoco aumentava. Não encontrei outra saída, por isso, chorei.
Chorei como nunca havia chorado antes, Solis.
Lágrimas quentes escorriam a todo momento por meu rosto que apresentava uma expressão pesarosa, os soluços se faziam presentes e se misturavam com os sons dos grilos e animais noturnos. Não percebi em qual momento começou, porém meu corpo tinha espasmos involuntários a todo segundo, estava tremendo e, definitivamente, não era por frio.
Aquilo era algo que nunca havia experimentado e rezava aos céus para não sentir novamente. Era agoniante não poder se libertar de outra forma que não se remoer em prantos impiedosos e avassaladores. Eu queria gritar, pedir socorro, fazer qualquer coisa para que aquela tortura misteriosa parasse.
Conforme o ar ia se ausentando de meus pulmões devido ao choro e pensamentos vinham à tona acerca da possibilidade de acabar desfalecendo em meio às telhas e fungos, minha mente voltou a funcionar, contudo, não na intenção de ajudar, e sim para me jogar mais a fundo naquilo. Eu era uma pessoa completamente estúpida, estava soluçando sem parar e nem sabia o motivo. Será que por isso todos foram embora? Será que era essa a causa?
Sabe, Solis, desde que tudo isso aconteceu, questiono quais são as intenções do destino para mim. Talvez não acredite nisso, mas eu creio piamente que não estou aqui para servir de exemplo para ninguém, até porque não me vejo em um futuro próspero, muito menos feliz. Então, o que o destino quer para mim? Tenho certeza que não fui uma pessoa ruim, sem embargo, de fato, vivi enfurnado entre essas paredes por muito tempo.
Novamente, pergunto: qual é a minha verdadeira sina?
Não sei ao certo quanto tempo se passou, mas quando voltei à realidade, meu choro havia cessado e os pássaros começavam a soar seus cantos, saudando a aurora que se iniciava timidamente. Não me sentia feliz, triste, angustiado ou muito menos aliviado. Na verdade, não sentia nada. Era apenas vazio. Meu peito, antes dolorido, parecia ter sido desguarnecido de qualquer coisa, ficou oco, sem vida, servindo somente para abrigar meus órgãos — função que deveria ter sido mantida o tempo inteiro.
Levantei-me, apaguei a lamparina que já estava com sua chama enfraquecida, puxei os objetos trazidos para perto de mim, abri a portinha e adentrei a casa novamente. Recordo que coloquei o colchonete e a lamparina de qualquer jeito em um dos cantos do sótão e desci dali. Ao chegar em meus aposentos, reparei na garrafa de água que havia esquecido de levar. Aquilo não era importante, então apenas segui para qualquer outro cômodo da residência.
Ao decorrer dessa semana, o vazio ainda me perseguia sem um minuto sequer de descanso, era como uma sombra. Eu lia meus livros, observava o céu da varanda, deitava para dormir, e ele ainda estava comigo. Uma sensação conhecida por mim, admito, ademais, não sentida com tanta intensidade quanto nos dias passados. Tão somente há duas horas atrás, comecei a notar outra sensação, e desta vez, era saudade.
"Do que estou sentindo falta?", inquiri para mim mesmo, e me dei conta que estava sentindo a sua ausência. Confesso que me surpreendi ao perceber tal sentimento. Considerei, também, que tu estarás comigo em todos os momentos, que me escutarás, não irás nunca me julgar, estarás junto a mim todos os dias e me acolherás não importa a situação. Tu és a minha única companhia, Solis, sou capaz de reparar isso com clareza.
Se outrora buscava ajuda da madrugada de verão para me sentir amparado, agora tenho meu Sol particular para recorrer, e é por sua causa que eu estou aqui.
Com carinho, N.
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Intocável
RomanceDentre todos os escapes possíveis de uma realidade maldosa, o meu refúgio favorito estava em minha frente, todavia, tinha plena consciência que eu nunca poderia alcança-lo, por mais que quisesse. ©2021, claramolv.