Sophia

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Sophia

O caminho passa como um borrão, não sei exatamente quanto tempo demora pra chegar na clínica, minha mãe falou várias vezes sobre eu ir na psicóloga, mas não acompanhava quando ela começava a falar, eu sempre dormia na metade. 

Pensei que só quem viesse eram meus pais, não gosto de ficar perto do meu pai, é horrível dizer isso, mas… Não consigo, eu fico muito nervosa, mas Hero veio, eu não esperava que ele fosse vir, mas ele veio. Estou me sentindo segura com ele do meu lado, faz semanas desde o que aconteceu… sei disso porquê Hero todos dias passa na minha casa e me conta como foi o dia ou como está o clima, como foi na escola, pequenas coisas que me fazem não pensar demais ou reviver aqueles momentos terríveis. 

Chegamos na clínica e mamãe fala meu nome para a pessoa da recepção, ela me faz sentar em uma das cadeiras, Hero fica em pé do meu lado de forma protetora, ele respeita meu espaço e entende que eu ainda não consigo ficar próxima de ninguém. Mamãe volta para o meu lado. 

-Pronto querida já vão te chamar certo? - Olho para a porta à minha frente e espero ser chamada. Hero acaba se sentando, ele fica desconfortável do meu lado, acho que pelo fato de querer falar alguma coisa mas não saber bem o que, eu também não faço ideia de como fazer isso. Sinto meu coração acelerado dentro do peito. Uma mulher parecida com minha mãe só que ruiva sai pela porta. Ela está com um bloco na mão e chama meu nome. 

-Sophia? - Minha mãe me chama me incentivando a levantar, mas não tenho forças nem pra isso. Se pudesse ficava aqui sentada. -Querida, tudo bem… 

-Sophie… err… se você se sentir confortável você pode ir, mas como a gente já conversou vai ser realmente muito bom para você falar com alguém sobre… tudo isso… -Olho para Hero, uma lágrima escapa dos meus olhos, não a seco, mas sei apenas olhando para ele que é um esforço gigantesco não me tocar. Ele faz esse esforço por mim, todos estão se esforçando por mim. Por algo que não tenho controle ou vontade. Eu me levanto, com muito esforço, a doutora espera pacientemente, Hero se levanta comigo e me acompanha até a porta, quando entro olho para trás e o vejo dar um leve sorriso. 

A Doutora falou mais do eu na primeira consulta, mas disse que é normal, já que estamos nos conhecendo. 

E que eu estou assim. 

Sem força para falar. 

-Quero que você saiba Sophia que, estou aqui para te ajudar e só vou poder te ajudar se souber do que aconteceu, do que te deixou nesse estado depressivo, você não precisa contar tudo, pode ir contado o que conseguir… 

-Eu não sinto nada… -são primeiras palavras que falo em semanas, minha voz sai estranha, muito rouca e dói, a doutora me oferece um copo com água, recuso. 

-Entendo que não esteja confiante o suficiente para aceitar coisas de pessoas que mal conhece, entendo Sophia… mas vamos partir desse ponto que você falou de não sentir nada - Pisco devagar 

-Eu quero dormir…-Deixo as lágrimas caírem - Eu não quero mais ter pesadelo com aquilo… eu só quero dormir - Sinto minha respiração falhar e procuro ar, parece que meu pulmão queima, sinto as lágrimas, o desespero, tudo. 

-Sophia, Respira, você vai conseguir respirar… -Eu não a escuto, eu não consigo. Ela corre para a porta, enquanto imagens daquela noite invadem minha cabeça, grito, grito o mais alto que consigo, até sentir uma pessoa do meu lado 

-Sophie, sou eu, Hero… vai ficar tudo bem princesa, você vai ficar bem… ninguém vai te machucar aqui, respira Sophie, tá tudo bem, vai passar, Respira junto comigo -O olho em meio às lágrimas e começo a respirar pausadamente igual a Hero. 

Alguns minutos se passam e retomamos a sessão. Eu só quero que acabe. 

-Vou te encaminhar para um psiquiatra querida  para você ser acompanhada por mim e por ele, você vai entrar no tratamento com remédio que vai te ajudar a dormir melhor. Quero te ver ainda essa semana e nossos encontros vão ser duas vezes na semana, já conversei com sua mãe sobre isso - Me levanto e saio, já que acabou eu quero ir pra casa. 

-Como você tá? - Hero pergunta, eu queria conseguir abraca-lo, eu queria não me sentir uma merda, toda vida que estou perto dele e quero abraçar ele. Mas que droga. -Vamos pra sua casa, você vai poder dormir quando chegar. 


Fomos na consulta com o psiquiatra, ele passou um remédio para dormir e um para o dia, segundo ele falou vou ter que ficar uns meses nesse tratamento. Falando em tratamento voltamos ao consultório da psicóloga, eu preciso confiar nela o suficiente pra falar, mas ainda não consigo. Ela começa a explorar temas rasos, falo pouco, nada que dê para ser aproveitado, isso me cansa, mais do que qualquer coisa. 

Os dias vão passando a mesma rotina de sempre, com os remédios consigo ficar mais esperta e regular meu sono melhor, vou sentindo menos cansaço durante o dia, embora o remédio seja super pesado. Sigo a risca as recomendações dos doutores e percebo que estou conseguindo falar mais nas sessões de terapia. Nada muito milagroso, mas um progresso. Hero está tentando me fazer sair de casa e correr, mas não tenho ânimo, principalmente de manhã, acordo enjoada, as vezes até tonta, mas penso ser do remédio. Estou no consultório mais uma vez. 

-Então como estamos? - Dalilah pergunta 

-Estou conseguindo dormir melhor, um amigo meu, o Hero, está tentando fazer eu ir correr de manhã, já me falaram que é bom fazer exercício para não pensar tanto… mas não sei, estou me cansando rápido e com muito sono, pode ser do remédio, está me dando até enjoo. - Ela anota 

-E como está em relação aos toques? -Coloco as mãos embaixo das minhas pernas. 

-Não consigo, me sinto errada, suja… -nego com a cabeça - não consigo ficar perto de ninguém tocando, ou que alguém me toque, principalmente. -Não tem muito tempo que contei a Dalilah o que aconteceu naquela noite, tudo, com todos os detalhes que eu lembro, ela anotou, fez algumas perguntas e temos trabalhado em cima disso. 

-E quanto ao Hero? - Franzo o cenho

-O que tem ele? 

-Me conta sobre vocês, a relação de vocês 

-A gente se conhece desde criança, na verdade, não lembro uma época que não conhecia ele, nós somos vizinhos e temos amigos em comum, infelizmente não frequentamos a mesma escola, mas fazemos quase tudo juntos, quando comecei a namorar… -faço uma pausa buscando ar - ele… ele não gostou, mas não do tipo que surta sabe? Ele só… só não gostou do Nate, pediu pra eu tomar cuidado que ele não cheirava bem… Pensei que fosse cisma dele ou algo do tipo -ciúmes- mas relevei várias coisas que ele disse e que meus outros amigos diziam… no final eles tinham razão… 

-Eu… eu não sei o que faria sem Hero sabe? Ele é o tipo de pessoa que arrisca tudo por algo que acredita, se esforça pelas pessoas que ama… ele tem um coração incrível, eu só queria poder… -Engasgo com as lágrimas 

-Queria poder o que Sophia? - ela questiona 

-Queria poder abraçar ele, queria não me sentir um nada toda vez que eu vejo ele se esforçando pra estar do meu lado, pra me ajudar a sair desse buraco, eu só queria conseguir passar por isso e… eu não sei - olho para o teto -Eu não sei! 

-Nós estamos aqui para isso querida, vamos conseguir tá bom? -Aceno concordando. 

Little Daughter [Conto]Onde histórias criam vida. Descubra agora