CAPÍTULO 6

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Quando cheguei em casa, o ambiente parecia diferente. Havia um perfume leve no ar, e vi Lívia na cozinha, mexendo em algumas taças de vinho com uma expressão leve e um brilho nos olhos que há tempos eu não via. Estranhei o bom humor, considerando o clima pesado das últimas semanas. Ela me ouviu chegar e se virou, me recebendo com um sorriso aberto.

— Olha só quem chegou! Achei que ia ter que jantar sozinha hoje — ela disse, brincando, enquanto colocava o vinho na taça.

— É... hoje consegui escapar mais cedo. — Sorri de volta, pegando a taça que ela me estendeu. — Você parece feliz. O que aconteceu?

Lívia riu, virando-se para pegar algumas pastinhas que tinha preparado para a mesa.

— Me encontrei com a Ana. Fomos tomar um café lá no Jardim Botânico. Fazia tempo que a gente não se via assim... foi bom colocar a conversa em dia.

Sentei-me à mesa, saboreando o vinho e observando-a de canto de olho. O clima parecia leve, e aquele seria o momento perfeito para falar sobre a proposta de Jones. Tomei coragem e me virei para ela.

— Então... preciso te contar uma coisa.

Ela me olhou curiosa, enquanto servia um pouco de comida em nossos pratos.

— Hum, isso tem cara de novidade. Desembucha.

Respirei fundo, sentindo o peso da decisão ainda fresca, mas ao mesmo tempo empolgado com a possibilidade. Eu queria que ela entendesse o que aquilo significava para mim.

— Jones me fez uma proposta hoje. Algo realmente grande. Ele está montando uma equipe para uma nova consultoria, e acha que eu seria essencial para o projeto. É algo promissor, Lívia... mas, claro, teria que deixar meu emprego atual.

Ela ficou em silêncio por um instante, o garfo pairando no ar enquanto digeria minhas palavras. Quando finalmente falou, o tom de voz era frio, quase desapontado.

— E você está considerando isso? Abandonar o emprego estável que você tem? Logo agora?

Sua reação me pegou de surpresa. Eu imaginava que ela iria pelo menos se animar um pouco, mas senti como se tivesse acabado de acionar um gatilho.

— Não é só abandonar o emprego, Lívia. É uma oportunidade real, de fazer algo meu, de me desafiar de uma forma que eu nunca consegui naquela empresa. Achei que entenderia...

Ela colocou o garfo na mesa com um pouco mais de força do que o necessário e me encarou.

— Entender? Você está falando de abandonar a segurança que a gente construiu, de arriscar tudo isso por um projeto que nem é seu de verdade, Gabriel. Não é uma ideia sua, é mais um esquema do Jones. E a gente sabe o quanto ele é... impulsivo.

Fiquei em silêncio por alguns segundos, tentando manter a calma. Eu sabia que ela estava preocupada, mas esperava algum apoio, algum incentivo.

— Impulsivo? Talvez, mas ele também é visionário. E quer que eu esteja ao lado dele. Você não vê o quanto isso é importante para mim?

Lívia suspirou, passando a mão na testa com irritação.

— E eu? Não importa o que eu sinto sobre isso? Tudo o que a gente construiu, os planos? Já pensou nas contas, nas responsabilidades?

Aquela reação mexeu comigo de uma forma que eu não esperava. Parecia que ela estava reduzindo tudo a números, como se o risco e o sonho não tivessem valor.

— Você fala como se tudo isso fosse só sobre dinheiro. Eu pensei que, depois de tudo que passamos, você ia me apoiar. Achei que entenderia a importância de arriscar por algo que faz sentido para mim!

Lívia levantou-se, cruzando os braços, olhando para mim com uma mistura de frustração e decepção.

— Sabe qual o problema, Gabriel? Você não pensa no impacto disso para nós dois. Isso é algo que você quer para você, não para a gente.

Engoli em seco, sentindo o peso das palavras dela. Ela se afastou, indo para o quarto, e eu fiquei sozinho na sala, com o sabor amargo de mais uma discussão que parecia sem solução.


♠DAMA DE ESPADAS♠Onde histórias criam vida. Descubra agora