1° CAPÍTULO

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Narradora Laryssa Cardoso:

Me encontro na sacada do meu quarto, me questionando e refletindo após uma péssima noite de sono. Eu não sei qual valor e sentido tem a minha vida. Eu tenho vários motivos para agradecer a minha existência, eu tenho uma boa vida financeira, eu tenho tudo que eu quero, tudo que uma garota de 17 anos quer ter. Eu deveria estar satisfeita tendo tudo aos meus pés. Talvez algum dia eu consiga me entender.

Ninguém além de mim entende a minha dor, o meu medo, o meu desejo e minha sede de raiva. Eu lido constantemente com medo de que, algum dia na minha vida, tudo volte a ser como era antes. O meu início na vida não é algo que eu goste de relembrar, a minha vinda ao mundo é tão irrelevante quanto todas as datas comemorativas. Eu vivo no automático como um rato usado para pesquisas científicas.

- Esqueceu que tem aula hoje?- Meu pai entrou, sem bater na porta, perguntando. Apenas me retiro da sacada e me direciono ao banheiro para escovar meus dentes.

- Você não vai falar nada?
- Até quando vai agir assim, Laryssa?- Ele me questiona, ríspido.

- Eu já entendi!
- Vou me arrumar, e daqui a pouco eu desço - ele concorda com a cabeça e sai, fechando a porta.

Depois de escovar meus dentes, fui ao meu closet. Ele tem cores de um tom cinza e branco, e sua iluminação é sutil, não muito reluzente. Gosto de ambientes frios e escuros. Eu peguei meu uniforme, joguei-o sobre a cama e fui tomar um banho.
D

epois do banho tomado, visto o uniforme, penteio meu cabelo, passo um perfume e desço.

-Bom dia! - Falo para todos que estão na sala tomando café da manhã.

- Bom dia! - Todos dizem, menos a minha mãe. Já estou acostumada com esse jeito dela. Me dirijo a fruteira e pego uma maçã aparentemente bonita.

- Não vai tomar café?- Minha irmã pergunta enquanto eu saía da cozinha, passando pela mesa de café.

- Tô sem fome, fora que estou atrasada. -

- Nunca foi pontual. - meu pai dizia.

- Pai, é primeiro dia... - Não olho para ele, apenas sigo meu caminho.

- Tchau, Lary. - Gritava meu irmão Nikolas da sala. Apenas digo tchau em bom tom, para que, da sala de estar, ele me escutasse.


A minha mãe, Juliana Cardoso, trabalha com coisas de moda, nunca me interessei nos assuntos dela. Além de ser uma mulher rude, vive constantemente explosiva, e não temos nenhum vínculo afetivo, não me recordo da última vez que nos sentamos para conversar civilizadamente como mãe e filha.

-Bom dia, Théo! - Théo, além de ser um bom motorista, é o meu único amigo em quem posso confiar.

- Bom dia, senhora Laryssa!- Eu reviro meus olhos imediatamente, pois não vejo necessidade alguma para ele me chamar de senhora. O Théo costuma me tirar do sério.

No meio do caminho, coloquei meus fones e encostei minha cabeça na janela do carro. Fiquei olhando os carros passarem, as pessoas andando com pressa para os seus compromissos e alunos atrasados para pegar o ônibus. Como será a vida dessas pessoas? Como é não ter tudo ao seus pés?

- Não precisa vir me buscar, eu voltarei a pé - Espiro fundo e me retiro do carro. Como sempre, nervosa. Eu sei o quanto eu sou estranha socialmente, isso causa olhares e comentários desagradáveis. Não sou uma pessoa interessante.

- Ah... Oi!
- Estou um pouco perdida, você poderia me ajudar encontrar minha sala? - uma garota loira, dos sorrisos largos e dentes bonitos dirige a palavra a mim.

- Eh... Tá bom.
- Por aqui! - digo, caminhando pelo estacionamento até a entrada do colégio.

- Qual é a sala? - eu pergunto.

- Eh... Sala 3° ano B - Tentando acompanhar meus passos, ela me responde, atrapalhada. Coincidentemente, a sala dela fica ao lado da minha. -Obrigadaaa! - Ela agradece, sorrindo. P

- Abraços... Não é algo que eu goste. - Falo me afastando dela rapidamente à procura da minha sala.

- Minhas desculpas
- Como se chama? - De costas para ela, a garota dos cabelos loiros, questiona-me.

- LARYSSA - grito para que ela possa me escutar.

- Bom dia, pessoal!
- A sala está cheia, que maravilha. - Sorridente, o professor Maurício adentra na sala - Pessoal, a maioria de vcs já me conhecem, mas vou me apresentar para os que não me conhecem.

- Me chamo Maurício, sou professor de geografia, espero nos darmos bem esse ano, prometo pegar leve - Dizia Maurício.

- Ô professor!
- Pra começarmos a aula leve, libera a gente, então, sô - Diz uma garota chamada Maryana, encontrava-se na frente da fileira onde eu estou sentada. Eu estudo com a Maryana desde o 1° ano, não somos próximas e jamais seremos. Ela é uma pessoa muito, digamos que, extrovertida e agitada, não curto pessoas hiperativas. São desgastantes.

- Só podia ser você, não é, Maryana?
- Deixa pra próxima, podem me cobrar. - Ele dizia, mexendo em seu estojo de pilotos.

Acordo com o sinal tocando para a 3° aula. Olho para frente, há um grupo de meninas conversando e alguns garotos estavam em pé na porta. Ao meu lado, há uma garota mexendo no celular, ela tem cabelos ondulados, acima dos ombros, seus cabelos são morenos e sua pele é branca. Nunca a tinha visto aqui. Foi uma questão de segundos para que ela direcionasse seus olhares para mim, ela esbanja um sorriso sutil após me avistar. Eu a encaro, seriamente, tentando lembrar de algum lugar que eu já tenha visto, mas nada vinha em mente. Ela tinha um semblante triste e vazio. Voltando a realidade, pego meus fones e me retiro da sala.

Eu tinha dito ao Théo que não precisaria vir me buscar, pois eu iria voltar caminhando. Foi o que fiz, fui andando para a saída principal. Em uma esquina, perto do colégio, há uma lanchonete na qual costumo lanchar. Só havia comido aquela maçã no café da manhã, e eu estava com muita fome. Eu comi um sanduíche e um bom copo de suco de laranja, paguei e saí em direção a minha casa, que, por sinal, é um pouco longe. Mas andar me faz transparecer, e estou acostumada com o trajeto, visto que, sempre faço corrida por aqui. Repentinamente, grandes nuvens escuras se formaram no céu, concluindo que estava vindo uma boa tempestade. Eu não acredito que vai chover justo agora.

Havia passado por uma avenida que levava em direção ao viaduto, adiantei meus passos juntamente com outras pessoas, todos estavam tentando fugir da chuva. Os chuviscos vinham aumentando e a ventania também.
Atravessando o viaduto, completamente encharcado e usando o capuz do meu casaco, meu cabelo não se livrou, está molhado por completo. Após avistar uma moça sentada na borda do viaduto, completamente molhada e cabisbaixa, eu diminuo meus passos. Curiosamente, estava vestida com o uniforme do colégio, e isso me chamou atenção. Ademais, achei estranho, pois estava chovendo, além de ser um lugar perigoso para se sentar.

Jogando meus pensamentos de lado, volto os meus olhares para frente e sigo meu caminho. Passando pelo seu lado, tentei identificá-la, mas não obtive sucesso, me restou apenas olhar para frente e seguir andando normalmente. Era nítido que aquela garota não estava bem, afinal, não estaria ali. Todos passaram, mas não deram a mínima, pois fugir da chuva era mais importante.




O Preço Do Desejo // GilaryOnde histórias criam vida. Descubra agora