Crônicas De Um Mundo Em Construção

O libertador das chamas - parte final

Mordereg correu até o amigo, ajoelhando-se a seu lado, e direcionando seu rosto para encará-lo. Os olhos de Udelai, levemente entreabertos em profundas e enegrecidas órbitas, não davam sinais de que reconheciam quem estava ali diante de si. Pareciam vazios, como se fitassem um ponto distante, por entre o manto do mago.

- Não perca seu tempo, Mordereg. Assim como os demais, eu não aguentei Udelai repetindo sempre as mesmas baboseiras, e me encarreguei pessoalmente de arrancar sua língua - disse Lezrak, enquanto caminhava em direção à um suporte que sustentava suas armas e escudo.

Ao perceber que não conseguiria despertar o amigo de tantos traumas, naquele momento, os olhos de Mordereg brilharam num azul intenso. A energia mágica explodia em pequenas faíscas no ar a seu redor, e seu orbe descrevia uma órbita em volta de seu corpo.

- Seu monstro! Como pôde fazer isso, justo com ele? Udelai te considerava um amigo, Lezrak!

Após gritar aquelas palavras, Mordereg disparou um feixe de raios, arremessando o tirakan contra a parede.

- Não existe amizade, mago. Apenas interesses. Em comum, ou contrários! - respondeu Lezrak, arremessando sua espada em direção à Mordereg.

O mago concentrou-se na lâmina, fazendo seu trajeto ser interrompido em pleno ar. Mas não percebeu que aquilo era apenas uma distração, pois o tirakan correu velozmente na mesma direção após o arremesso. Com o imenso escudo postado à frente, ele atingiu Mordereg, que caiu alguns degraus abaixo do trono.

Antes que o mesmo tornasse a levantar, Lezrak recuperou sua espada e saltou na direção de seu adversário, num golpe que o teria esmagado, não fosse pela rapidez com que o mago conjurou uma barreira protetora à sua volta. Enquanto o tirakan tentava sem sucesso romper a barreira com uma sequência de golpes, Mordereg conseguiu por-se de pé.

- Desista Lezrak. Você sabe que nunca poderá romper essa barreira com armas comuns - sentenciou Mordereg, enquanto conjurava estacas de rocha do solo para atingir o tirakan, que passou à defensiva, esquivando e destruindo as estacas com seus golpes.

- Eu não preciso velho. Acha que eu não percebi? Você tem usado magia desde que chegou aqui, tentando suportar os efeitos do ambiente. Me pergunto, o quanto você vai aguentar sustentar tantos efeitos mágicos ao mesmo tempo?

Mordereg suspirou. No fundo sabia que estava correndo contra o tempo, e mesmo assim, relutava em atacar o antigo companheiro com todo seu poder. No mesmo instante uma guarnição de tirakans invadiu o salão real, apontando suas lanças na direção do mago. O que estava difícil, parecia agora impossível, e fugir dali seria a melhor opção, calculou Mordereg. Mas não poderia sair sem Udelai, e este seria um alvo fácil se as ameaças não fossem neutralizadas de alguma forma.

- O que pensam que estão fazendo? Todos pra fora, agora! - esbravejou Lezrak com seus soldados. - Que tipo de líder eu seria, se não conseguisse lidar com um simples humano em meu próprio reino?

Os soldados abandonaram o recinto confusos, trancando os portões após saírem. Lezrak caminhou até o mesmo, torcendo uma lança de ferro em volta dos puxadores, para impedir futuras intromissões indesejadas, enquanto conversava com seu adversário:

- Não se preocupe mago. Eu não vou recorrer à covardia típica de sua espécie. Eu disse que isso era um teste pra você. Eu te considero um forte, e ofereço a oportunidade de consertar tudo que há de errado nessas terras, começando daqui. Mas pelo que pude perceber você é igual a ele. Prefere servir a senhores débeis, e às suas vontades guiadas por vícios, preconceitos e injustiças. Então você será meu teste. Independente de qual seja o resultado aqui, eu já provei que estou certo, a força do vencedor é o que determinará os rumos da história.