noite com o malik

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''O fantasma da culpa dos sobreviventes pode ser cruel'' - Catch Fire, 5 Seconds Of Summer

Mais um dia que encaro dentro de casa pensando em milhares de coisas. É dia de Mike ter sua sessão com a psicóloga e o curso de composição, de modo que ele e meu pai passam um bom tempo na rua e me deixam sozinha. Fico sentada no sofá fingindo prestar atenção na tv mas estou longe, tão longe que quando alguém abre a porta eu demoro bons segundos para notar.

- Venha Zayn, entre.

- Não quero incomodar, Sra. Martinez, só vim entregar isso pra Tessalia.

Esse trecho de conversa me faz sentar e observar as duas figuras entrando.

- Ah, ali está ela. Fique à vontade. Vou colocar essas coisas na cozinha.

Minha mãe passa por mim cheia de sacolas nos braços e segue para a cozinha, enquanto Zayn fecha a porta e se aproxima apenas com uma na mão.

- Oi. - sua voz mansa e seus olhos bonitos me encontram. Ele ergue a sacola e a coloca perto dos meus pés - Só passei pra deixar a tinta que prometi, sua mãe insistiu que eu entrasse.

- É, ela tem essa mania de querer obrigar as pessoas a fazerem o que não querem, então suponho que você não queria entrar.

- Não é isso, eu só sabia que se entrasse ia acabar me distraindo com você.

Olho para Zayn, tentando entender que merda isso significa.

- Ok, não vou distrair você das suas várias obrigações.

Ouço o garoto rir brevemente enquanto me inclino para abrir a sacola.

- Azul?

- Rosa.

- Zayn... - resmungo, mas puxo a sacola e vejo que a tinta é azul - Idiota.

Ergo os olhos e vejo um sorrisinho em seus lábios. Os saltos de minha mãe ecoam pela casa e ela aparece na sala.

- Zayn querido, por que não fica pro jantar? Vou fazer frango e batatas.

Zayn desvia os olhos de minha mãe para mim, como se esperasse que eu dissesse algo. Diferentemente da primeira vez eu não o faço, de modo que o moreno balança brevemente a cabeça.

- Obrigada Sra. Martinez, mas tenho algumas coisas que precisam ser resolvidas ainda hoje. O jantar não vai ser importante.

- Certo, mas se mudar de ideia... As portas estão abertas.

Karla volta a sair do cômodo e o moreno logo fica de pé.

- Vou indo nessa.

Assinto e me levanto, levando-o até a porta.

- Obrigada pela tinta.

Parado no batente ele se vira para mim, as mãos enfiadas no bolso.

- Tudo bem, não foi nada. A loja fica no caminho pro meu trabalho.

- Então pintaremos na semana que vem...

- É isso aí, aproveite seu final de semana pois teremos trabalho.

- Estou preparada. - flexiono os braços e mostro os músculos que nem tenho, tirando um risinho contido do Malik.

- Claro que está. Até mais, Tess.

E ele deixa a minha porta, dando a volta na cerca e indo para o seu jardim.

...

Sábado a noite e estou deitada no escuro do meu quarto com o notebook no colo. No reformatório raramente podíamos usar aparelhos eletrônicos, principalmente eu. Sabiam que meu nome e meu rosto estavam estampados em vários e vários sites de notícia e o quanto me faria mal ler ou ver qualquer dessas coisas. Desde que tudo aconteceu, nunca mais entrei em nenhuma de minhas redes sociais. Essa se tornou uma área proibida para mim, pois sei que há ódio e mais ódio sendo derramados sobre meu perfil, e não tenho certeza de que posso lidar com mais desse sentimento sem enlouquecer. Mike me ama, e meus pais parecem me amar também, mas não consigo pensar em mais nenhuma pessoa que possa desejar o meu bem. Se alguém se lembra de mim, certamente é pelo estrago que fiz em sua vida ou na vida de alguém que essa pessoa ama, e consequentemente ela me odeia. Não há outro caminho. Não há como me livrar desse carma. É por isso que Zayn não vai querer nem olhar na minha cara quando descobrir do que fiz parte.

Stained PastOnde histórias criam vida. Descubra agora