Capítulo 1

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Enfim Anahi estava fechando o zíper da última mala. Dali a uns 20 minutos já estaria dentro do carro a caminho da faculdade onde cursaria direito. Desde quando foi aceita, seu pai não falava em outra coisa, o orgulho que ela o proporcionara não tinha tamanho. Annie deu uma última olhada no seu quarto. Ele estava recém reformado, algumas mudanças foram feitas por Dona Marichelo, para que as lembranças, de um passado não tão distante, se tornassem mais fracas, amenizando a dor da saudade. E outras mudanças foram feitas pela própria Anahi, afinal algumas paixões antigas deveriam ser enterradas dano espaço para algo novo. O papel de parede que antes tinha umas estampas de notas musicais, deu lugar a um bege liso sem detalhes, em 2 prateleiras de parede que ela guardava cds  e livros com histórias de romance, ainda permaneciam com livros, mas de outros gêneros, agora eram de direitos e leis. O guarda-roupa que vivia com recortes de corações e fotos coladas na parte do espelho, agora era vazio, assim como o mural que antes servia de cronograma de lugares pelo mundo que ela queria viajar. O clima de um quarto alegre se fora, algo tinha morrido ali desde a tragédia e tornara tudo sem vida. Num estalo lembrou de algo. Foi até sua cama, levantou o colchão e pegou umas folhas de caderno rabiscadas e falou consigo mesma:

Anahi: Não posso deixá-las para trás, afinal são as únicas que me conhece e me ajuda desabafar.

Assim guardou suas letras de músicas dentro de uma das malas, embaixo das roupas para não correr o risco de outra pessoa achar. Música era o que Anahi sabia fazer de melhor, mas a algum tempo achou melhor levar isso como esquecido, se ela não tocasse mais nesse assunto as pessoas também não tocariam e uma hora ninguém mais se lembraria do que ela foi um dia.

Dona Marichelo também estava orgulhosa, mas ao mesmo tempo triste em ver sua filha saindo de casa. Pra uma mãe nunca é fácil ver seu filho andando com as próprias pernas porque para elas, sempre serão crianças indefesas que precisam da mãe por perto para protegê-los e defendê-los.  

Na última semana, Anahi a via tentando disfarçar ao secar algumas lágrimas teimosas. Nos últimos dois dias olhando as suas fotos de quando era bebê, assistindo vídeos caseiros, fazendo suas comidas preferidas e quase sempre suspirando fundo. Se já é difícil pra qualquer mãe passar por isso, imagina para Dona Marichelo que conhecia aquela dor.

 Enfim começou descer suas malas até a porta da sala onde seu pai, Sr Henrique já esperava, levando-as até o carro. Assim que desceu a última mala, entregou a seu pai que foi em direção ao carro, olhou para sua mãe que já não tentava conter as lágrimas. Então o choro contido durante dias veio a tona. Tanto Anahi quando dona Marichelo chorava abraçadas uma a outra.

Enfim uma delas falou:

Anahi: Não precisa ficar assim mãe, estarei sempre ligando e passarei as férias aqui.

Dona Marichelo olhou sem nada dizer.

Anahi: Não precisa falar nada também. Eu te amo mais que tudo mãe e sentirei muito sua falta.

Se fosse questão de escolha, Anahi não sairia daquele abraço nunca, ficaria ali para sempre. Sua mãe era um exemplo de heroína de guerreira, por continuar de pé mesmo depois de tudo. Mas ela tinha um caminho a seguir, fez essa escolha e não voltaria atrás, precisava cursar direito e dar o orgulho que o pai tanto sonhou. Em nenhum momento ele a obrigou a fazer isso, foi escolha própria. Anahi colocaria seus pais acima de qualquer sonho ou vontade.

Dentro do carro a caminho do aeroporto, Anahi tentava disfarçar os olhos inchados depois de tantas lágrimas, com maquiagem. Sr Henrique apenas dirigia em silêncio. Ele se tornara um homem calado depois do que tinha acontecido a sua família. Para quebrar o gelo ele ligou o rádio do carro sintonizando numa estação onde tocava a música 'Por besarte' voltando a atenção a estrada. Aquela era uma das músicas preferidas da Annie e involuntariamente começou cantarolar bem baixinho, quase imperceptível. Já estava olhando a paisagem pela janela do carro e viajou por um momento.

Sem perceber já estava acompanhando a música num volume de voz não muito alto, mas que bastou para seu pai ouvir e comentar:

- É a primeira vez que te ouço cantar depois de tudo que aconteceu filha.

No mesmo instante, sem tirar seus olhos da paisagem, seu coração gelou e se calou.

A Música Une CoraçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora