Capítulo 2

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Sr Henrique se arrependeu de ter feito tal comentário, pois ele foi o suficiente para calar Anahi o resto da viagem. Havia bastante tempo que não ouvia mais a filha cantar, nem que seja no chuveiro, nada nada. Afinal ela se sentia no dever de abrir mão dos seus desejos desde quando sua irmã mais velha, Ana, morrera a 2 anos atrás. O sonho de ser uma advogada era de Ana. Desde quando era criança já sabia o que queria e isso era o principal motivo da felicidade dos seus pais. Não que eles não eram orgulhosos de Anahi e sua linda voz para música, claro que isso também os faziam felizes. Mas quando a queda do avião, em uma viagem ao exterior, onde Ana estava, provocou sua morte, Anahi mudou muito para manter viva a ideia de seu pai de ter uma advogada na família.

Aquele simples comentário “é a primeira vez que te ouço cantar depois de tudo que aconteceu filha” foi o bastante para seu coração doer, como se tivesse voltado naquele dia em que estava no seu quarto, escrevendo mais uma de suas letras e de olho em P.S. Eu te amo, que estava passando na tv, quando de repente o plantão noticiário interrompe o filme para uma notícia urgente.

“Paramos nossa programação para informar uma tragédia ocorrida nessa tarde. Um avião de passageiros caiu na cidade de Kazan, no oeste da Rússia, matando todas as 50 pessoas a bordo, segundo informações das autoridades russas. A aeronave, um Boeing 737, partiu do aeroporto de Domodedovo, em Moscou, com destino a Kazan, capital da república de Tataristão. Após duas tentativas de pouso, o avião acabou explodindo ao se chocar contra o solo, por volta das 16h25. As razões do acidente não foram esclarecidas. Já já voltamos com mais informações.”

Como em filmes onde a imagem fica em câmera lenta, tudo começa rodar ao seu redor. Essa foi a sensação de Anahi. Desde quando consegue se lembrar, Ana estava ao seu lado. Em pequenos flashs de memória, Anahi lembra de estar de mãos dadas com Ana aprendendo andar, das vezes que Ana tanto pedia permissão a Marichelo para leva-la a sua escola, onde desfilava a apresentando a todos seus amigos, o primeiro dente que caiu e Ana a fez acreditar na fada do dente e emprestou uma moeda para colocar embaixo do seu travesseiro. A primeira desilusão amorosa, era a sua irã que estava lá recolhendo os cacos do seu coração e colando no lugar, o aniversário de 15 anos. Enfim, em todos momentos na vida vida que Anahi consegue se lembrar, Ana estava presente e agora ela se fora, partiu pra um lugar sem volta. Mais uma vez seu coração estava em pedaços e não havia ninguém para concerta-lo dessa vez.

Não demorou muito para Annie ouvir o grito de sua mãe que vinha do andar de baixo e logo saiu correndo, descendo as escadas. Se deparou com seu pai terminando uma ligação e fazendo um gesto positivo com a cabeça e direção a sua mãe, indo ao encontro dela a abraçando enquanto choravam.

Annie nunca imaginou que poderia existir um dor daquela proporção. Algo que a invadia dentro do peito, sufocando, apertando seu coração. Não podia ser verdade. Ana estava naquele avião, Ana sua heroína, sua melhor amiga, seu conforto, seu alicerce. E agora o que seria de sua vida?

A partir daquele momento tudo foi angustiante. Se já é difícil perder um ente querido, imagina pra quem perde e não pode nem se despedi do corpo. A explosão havia destruído tudo e centenas de famílias choravam seus mortos sem poder ter uma despedida digna que cada vida que foi tirada daquela maneira trágica. Um funeral simbólico foi feito para Ana. Marichelo e Henrique estavam destruídos desde a hora que receberam a notícia e a cada segundo que passava, ficavam piores. Para Anahi não era menos pior, pode-se dizer que a dor que ela sentia era ainda mais intensa. Era notável que algo morreu junto com Ana naquela explosão.

No início o tempo com a música se deu pelo respeito a perda de Ana. Dias, semanas, meses se foram e nada mudou. Seus pais tentavam aceitar a ausência, tocar a vida normalmente, se é que isso seja possível depois de perder uma filha, mas Anahi continuava calada, sempre trancada no seu quarto, depois de tanta recusa para se alimentar, começou comer bem pouco, o que já era um progresso. Sua mãe começou ficar realmente preocupada e recorreu a ajuda psicológica. O que resultou a visita uma vez por semana no consultório da Dra. Angélica.

Dois anos se passaram e a dor não foi embora, o vazio estava sempre ali, a ferida não cicatrizou, tudo apenas adormecia, mas num sono leve que bastava que alguém tocasse no assunto, direta ou indiretamente para a dor acordar e a deixar sufocada novamente.

A Música Une CoraçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora