Um mês se passou desde o dia que Kalel voltou para casa. Um mês em que nada mudou, pois o pesadelo que ele viveu na guerra o atormentava dia e noite assim como a constante voz em sua cabeça dizendo que se ele estivesse percebido a tempo Noah ainda estaria vivo.
Kalel respirou fundo passando as mãos nos cabelos e fechou os olhos sentindo as lágrimas que escorreram pelo seu rosto.
A culpa é sua, Kalel!
Você deveria ter percebido que o alvo era você e não o seu irmão.
Aos dezesseis anos ele perdeu duas das pessoas mais importantes de sua vida o pai e a mãe e quando pensou que não sentiria essa dor novamente atualmente com trinta e dois anos perdeu o irmão mais velho aquele pelo qual foi como um segundo pai não só para ele, mas também para a irmã caçula.
Ele sentiu uma mão sobre o seu ombro dele e rapidamente as memórias veio como flashes em sua mente o fazendo recordar do pesadelo que viveu na guerra.
Ele segurou fortemente o pulso da pessoa e virou de frente para ela.
- Kalel? - sussurrou a esposa com a voz assustada.
Ele abriu os olhos e soltou o braço dela. Em seguida encarou o pulso dela com os olhos arregalados quando percebeu que ficou um pouco avermelhado.
- Está tudo bem, Kal - ela puxou a manga da jaqueta para esconder o machucado. - A culpa foi minha. Eu que o assustei.
- Me desculpa, love. Eu preciso ficar sozinho - ele deu as costas e antes de sair do quarto a esposa segurou o braço dele.
- Por favor, não vá. Está tudo bem - disse ela com a voz embargada. - Sei que não foi a sua intenção.
- Não, love. Nada está bem e eu preciso de um tempo a sós comigo mesmo - ele segurou o rosto dela com ambas as mãos.
- Kal, eu estou bem - o olhou nos olhos.
- Eu machuquei você, love. E se fosse a nossa filha em seu lugar? Não posso correr esse risco - ele depositou um beijo demorado em sua testa, em seguida desceu as escadas em passos apressados e quando chegou na sala ele pegou as chaves do carro.
- Papai, eu posso ir com o senhor? - perguntou a filha de forma animada ao se levantar do sofá.
- Não, lindinha.
Hope o olhou com os olhos brilhando e fez biquinho.
- Por favor.
- Na próxima vez eu prometo que a levo, mas não hoje - ele se agachou em sua frente. - Cuida da sua mãe por mim, está bem?
A filha assentiu com um balançar de cabeça, ele segurou o rostinho dela com ambas as mãos e depositou um beijo em sua testa.
- Eu te amo muito, papai.
- Eu também te amo muito, lindinha - ele levantou-se.
Kalel se aproximou da maçaneta e antes de girá-la para abrir a porta deu uma última olhada na filha.
- Fica com Deus, filha.
🍁
Kalel andou de um lado para o outro e quando enfim parou fixou os olhos no céu nublado.
Ele olhou para o relógio em seu pulso.
- Nem percebi o tempo passar - resmungou ele passando as mãos pelo rosto, em seguida as colocou dentro dos bolsos de seu sobretudo.
- Kalel? - ouviu a voz da irmã caçula, atrás de si.
- Oi, Cait - disse ele, mas não virou em sua direção.
Caitlin aproximou-se e ficou ao seu lado com os olhos fixos na lápide do irmão.
Ele observou a irmã com mais atenção e acabou percebendo a barriga dela um pouco maior do que o normal.
Meu Deus, que tipo de irmão eu sou?
Estou tão concentrado na minha dor que esqueci de observar as pessoas ao meu redor.
- Está tudo bem com você? - questionou preocupada.
- Vocês já escolheram o nome? - ele mudou de assunto ao fixar os olhos na barriga da irmã que aparentava ter uns cinco meses.
Caitlin o encarou de forma confusa, mas logo percebeu o olhar em sua barriga e um sorriso emocionado se formou em seus lábios.
- Sim, o nome dele será Noah - ela segurou a barriga com ambas as mãos e os seus olhos ficaram marejados.
- É uma bela homenagem ao nosso irmão.
Kalel abriu os braços e ficou de frente para ela a envolvendo em um abraço apertado, mas com cuidado para não apertar a barriga dela.
- O que aconteceu, Kalel? - questionou quando ele se afastou.
- Como assim? - ele franziu a testa com o olhar confuso.
- Eloise me ligou e está muito preocupada com você. Ela está certa não foi intencional.
- Mas mesmo assim inconscientemente eu a machuquei.
- Vai ficar tudo bem, pois não importa o quanto quebrado estejas Deus tem o poder de consertá-lo - ela colocou a mão sobre o ombro dele.
- Eu sei, Cait. Mas é que a dor que carrego no peito não quer me deixar em paz.
- Pelo seu olhar cansado dá para perceber o quanto a guerra te machucou, mas eu entendo uma parte da sua dor também sinto falta do nosso irmão e quando recebi a notícia meu mundo desabou, mas Deus tem sido o meu consolo - uma lágrima escorreu de seus olhos e várias outras depois. - Embora mamãe, papai ou Noah não estejam presentes em nossas vidas eles sempre estarão bem vivos em nossos corações.
- Sei disso e eu queria ser forte, queria aprender a lidar com a dor... mas não consigo.
- A questão é que a dor é assim mesmo, Kalel. Ela precisa ser sentida - a voz dela ficou embargada por conta do choro. - Mas não se prenda a ela.
Kalel assentiu puxando ela para outro abraço e depositou um beijo demorado no topo de sua cabeça.
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Porto Seguro | R O M A N C E C R I S T Ã O |
EspiritualLIVRO ÚNICO Quando Deus é o nosso porto seguro não há dor que sufoque nossa fé. Depois de ter passado cinco anos na guerra Kalel retorna para casa com feridas interiores e cicatrizes que o atormentam. ©2021