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As quartas-feiras sempre me aborreceram de uma forma extremamente irritante. Não era o começo da semana, nos quais eu geralmente me levantava com mais empolgação, nem o fim da semana, onde eu ficava nas alturas com a cabeça no fim de semana. Mas as quartas... o meio, o desespero, o clímax que nunca acontece.
Odeio quartas-feiras.
Não imagino o motivo de tanta felicidade. Na empresa, todos pareciam estranhamente alegres. As eleições estão chegando, junto com a copa do mundo. Eu geralmente me animo com essas coisas, mas como é quarta-feira, a apatia me dominou e fiquei resmungando internamente, ruminando sons inaudíveis e trabalhando de maneira desinteressada.
Me sinto como alguém de noventa anos que já viveu tudo o que tinha para viver. Mas eu também sinto que não vivi nada. É como se... os dias estivessem passando cada vez mais rápido. Minhas memórias falham, não consigo nem me lembrar o que eu fiz ontem. Isso me aflige de uma forma tão enjoativa que tenho até vontade de vomitar.
— Ei, você vai almoçar agora? Pode trazer um café para mim? — Diana, minha colega de trabalho, pede e sai sem esperar minha resposta.
Eu apenas concordo e me levanto, indo em direção ao restaurante da esquina. É um bom lugar para pensar às vezes e tem um cheiro bom de comida de vó mineira. Eu gosto muito desse restaurante, me faz pensar melhor na vida.
Mas não tenho certeza se é realmente disso que eu preciso agora...
Coloquei meu almoço, pesei na balança, pedi uma Coca-Cola e me sentei em um canto isolado do restaurante. Por um momento, vi o vislumbre de uma silhueta entrar no recinto, seu semblante brilhando como se tivesse ganhado na mega-sena. É uma mulher, carrega uma criança no colo e seu marido vem atrás, carregando uma mochila da Peppa Pig nas costas. Desde que me entendo por gente, sempre gostei de criar histórias para desconhecidos na minha cabeça, mas esta mulher... ela não é uma desconhecida.
Ela me é estranhamente familiar. De repente, estudamos na mesma escola, na mesma sala (?). É, ela era minha colega de escola. Seu nome... seu nome... Camila. É Camila? Por que tenho tantas dúvidas? Mal consigo me lembrar do colégio, mas essa mulher é muito familiar. Camila era bem popular na época da escola, tinha um cabelo enorme que batia na bunda, diferente de agora, que é curto até na nuca. Ela ri com o marido e brinca com o filho enquanto eles comem. Parecem uma família feliz...
Me pergunto quando vai chegar o clímax da minha vida, como o dessa família, que parecem viver o auge de sua alegria.
Eu costumava ler muitos livros policias na minha adolescência. Essa memória é bem nítida na minha cabeça. Eu engolia os livros. Foi o que me ajudou quando meu pai morreu. E eu quedava pensando, me perguntando quando minha vida iria finalmente começar. Eu saí da escola, fiz faculdade, namorei algumas poucas e monótonas vezes, tive meu coração brevemente destroçado, tenho um emprego estável... mas por que esse vazio ainda me consome? O que eu preciso fazer para finalmente sentir que, de alguma forma, ainda não morri? Que eu sequer existo?
Quando termino de comer, pago o almoço e vou até Camila. Cutuco o ombro dela, coloco o sorriso menos forçado que tenho e respiro fundo.
— Camila? Oi, quanto tempo! Lembra de mim?
Lembra de mim? Sério? Eu deveria ter apenas voltado para a empresa com o café de Diana.
A Camila se vira, olha pra mim por excruciantes segundos e, depois de me encarar, buscando quem sou eu em sua memória, ela abre um sorriso e se levanta, me dando um abraço longo e caloroso.
— Claro que eu lembro! Nossa, quanto tempo... como tá a sua mãe?
Ela pergunta com um carisma inquestionável. Estranhamente não me apresenta para seu marido nem filho, mas continua focada em manter uma conversa.
— Ela tá... tá bem. E a sua família? Sua irmã se formou?
Lembro só agora que ela tinha uma irmã que estava fazendo medicina quando nos conhecíamos.
— Sim, finalmente. Tá trabalhando até. — ela continua sorrindo. — Esse é meu filhote, Manuel. — finalmente nos apresenta. Eu sorrio para o garoto e ele sorri pra mim, de maneira educada. — Tem filhos?
— Não, ainda não. — Eu sorrio mais uma vez. Que constrangedor, eu deveria ter ido embora... — Eu preciso ir, preciso voltar pro trabalho. Mas foi bom te rever.
Nos despedimos sucintamente. Enquanto volto ao caixa para pegar o café de Diana que havia me esquecido, consigo estranhamente ouvir o marido dela falando:
— Quem é?
— Sei lá, deve ter estudado comigo.
E eles riem baixinho, como se soubessem que eu estava ouvindo.
Pego o café e saio. Isso me trouxe um sentimento ruim, mas muito familiar. Será que sofri bulliyng na escola?
Por que isso é uma dúvida? Eu deveria saber.
Acho que não, sempre fui uma criança boa.
Será?
Não.
Mas talvez sim...
Por que não consigo me lembrar?
Chego ao trabalho, entrego o café para Diana e volto a trabalhar. Começo a ter a sensação de que tem alguém me observando, o tempo todo, desde o restaurante. Talvez desde sempre. Isso me deixa com medo. Na volta para casa, depois que estaciono meu carro no estacionamento do prédio, apresso o passo de maneira assustada.
Odeio quartas-feiras.
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O Que Me Resta É Acabar
Cerita PendekE se toda a sua vida fosse uma mentira? E se tudo o que você já conheceu fosse apenas uma criação arbitrária? E se a única pessoa que fosse real estivesse há páginas de distância? Sempre tão perto, mas sempre impossível. Afinal, o que faz um persona...