Suturas, capítulo 5;

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Obrigada, Flavinha, por betar e sempre me apoiar <3

Sim, senhor.

Jeongguk demorou para se acalmar. Passava frio e, dessa vez, usando o dinheiro que tinha tirado da carteira de Ryu, ele estava lá, dentro de um quarto de hotel, de maneira quase honesta, sem invasões ou qualquer característica similar. Era bom se sentir como gente, como parte da sociedade, podendo pagar pelo que usava e consumia. As pessoas até o trataram diferente, como se finalmente notassem que existia um ser humano sob cicatrizes e roupas molhadas de chuva. Todavia, assim que se propunha a fechar os olhos, todos os flashbacks turbulentos atormentavam-lhe a mente, aparecendo feito projetores contra as pálpebras de seus olhos.

Jeongguk se lembrou do primeiro dia na cadeia. Lembrou-se do gosto amargo do almoço e da surra ardida que levou por olhar sem querer para um detento perigoso. Se lembrou, igualmente, de Taehyung, articulando cenários grotescos do que poderia ter acontecido com seu irmão mais novo. Essa era a pior parte. Jeongguk sabia que era. E, claro, naturalmente se lembrou de Ryu. Pensou se seu corpo ainda repousava naquela cama, apodrecendo em cima dos lençóis limpos, ou se o tinham enterrado. Dentro do segundo caso, imaginou se sua futura noiva teria chorado em seu caixão. Ao menos Ryu, ainda que morto daquela maneira impolida, teria alguém para lamentar por sua ida. Jeongguk, em contrapartida, severamente não podia contar com mais ninguém. Talvez até ficassem alegres com a notícia. O único incômodo que sobraria seria sua autópsia e o que poderiam encontrar na prescrição do legista, e somente a sugestão já foi capaz de lhe dar calafrios.

Algumas gotas gordas de água caíam para fora da banheira — especialmente quando o corpo de Jeongguk, não podendo se conter ao se refrear, movia-se pela superfície turva de sabão, espuma diluída e um pouco de sangue. O chão de porcelanato, por outro lado, tentava ser amistoso; brilhava branco demais para qualquer mente sã e, molhado do jeito que estava, servia como uma espécie de poço, onde o reflexo do rosto pálido de Jeongguk se encontrava nítido, utilizando-se de emoções fortes para sorrir sozinho, lotado de dor e de muita agonia.

O banheiro acolheu-o bem, sendo o primeiro lugar para onde decidiu se arrastar. O corpo inteiro de Jeongguk pesava feito concreto e absolutamente tudo começou a doer, cada mísera parte, começando por um puxão mudo nos olhos, contornando a retina em brasa, depois alcançando as extremidades, comendo-o de fora para dentro. Por fim, o nome Park Jimin pulsava em seu coração. A cada batida, Jeongguk voltava para aquela ruela, para o sangue carmesim escorrendo para o chão, porque nem mesmo a obscuridade da noite fora capaz de camuflar o buraco da bala em seu estômago delicado.

Um arrepio percorreu a banheira, pegando rigidez ao se misturar com a água gelada — escolhida por Jeongguk como uma tentativa de se colocar novamente dentro do próprio corpo —, e chegou intrépido à sombra de sua pele, penetrando o tecido e eletrizando os músculos. Jeongguk tensionou e sentiu que precisava gritar; contudo, escolheu o silêncio e a sugestão masoquista de segurar a explosão na barriga. Ele não sabia se estava dando certo, mas um lado seu, não muito comumente nítido, sendo o mais otimista possível considerando os seus traumas acumulados, tinha expectativas de que a tentativa de choque pudesse fazê-lo entrar em ordem mais uma vez.

Abrindo o registro azul, algumas boas horas atrás, Jeongguk havia forçado o polegar contra a ponta de vidro da saboneteira que circulava, em forma de v, a parte superior da banheira. A dor aguda, porém minúscula, foi o prelúdio do sangue que gotejou em direção à água, pintando delicadamente a cena.

Jeongguk tirou a roupa, evitando se encarar no espelho majestoso pendurado na parede, provavelmente com mais de três metros de largura e que, principalmente para alguém cheio de inseguranças, era aterrorizante. No geral, olhar para si mesmo não passava de um temor para Jeongguk. Ele não tinha o costume de analisar suas cicatrizes ou qualquer outra parte significativa. Em particular, odiava o próprio rosto e, enquanto pudesse não ter consciência de sua aparência, Jeongguk estaria feliz. Ou seja, se precisasse se arrumar, ou simplesmente fazer um check-up, ele o faria depressa, focando num ponto exato, fugindo o mais rápido que conseguisse.

Carnificina | jikook.Onde histórias criam vida. Descubra agora