Minha amiga, a dona do apartamento, é cantora lírica. A gente sai no sábado e ela me apresenta uma amiga. Uma ruiva, soprano coloratura. 

Eu gosto de ruivas. Quem não?

A gente toma unas copas, acompanhados de um tenor, um cara simpático, gordinho e com cavanhaque. Ele se entusiasma e canta uma aria. Todos do bar aplaudem. 

Eu vou trabalhando na ruiva. Eu tenho um olhar que sempre funciona, ele distrai as mulheres do meu rosto. Na saída, eu acompanho a gata ao metrô. 

Hasta luego.

Uns dias depois, ligo para menina, convido ela para um café. Seria absurdo na minha cidade. Bora tomar um café?  É muito chique. 

Mas nada de café, a gente entra num pub irlandês perto da Plaza Santana. São cinco da tarde, o lugar me parece gigantesco. Você entra e descobre outro andar debaixo de umas escadas. Se quiser, você se apoia nuns corrimões e observa as pessoas no andar inferior. Tudo perfeitamente decorado, com as fotografias e cartazes irlandeses de propaganda.

Eu peço uma pinta de cerveja negra, para me exibir. Pinta é uma medida equivalente a 0,6 litros. Em português se chama pinto. Eu não bebo cerveja, então não consigo engolir mais que uns três goles de um pinto.

Falamos no meu terrível espanhol durante uma hora e meia. Depois que eu dou o primeiro beijo, é festa. Uma hora de amasso, sem parar. Acompanho ela ao metrô. Hasta luego

Aqui é assim, a mulher racha a conta e vai pra casa sozinha.

Tenho sonhos molhados com ela me xingando em espanhol. Uns dias depois, convido de novo.

- Para qué?- ela responde.

O primeiro que penso é que fiz algo errado. Busco na memória, não encontro, não entendo. Fico paralisado e o idioma não ajuda. Gaguejo algo. A ruiva toma as rédeas e me trata com desdém. As ligações seguintes são inúteis.

Eu demoro meses pra descobrir que é um costume daqui. É o jeito das mulheres espanholas te desafiarem. Para qué? Não há garantias... Pra conversar ou Pra te comer podem funcionar, depende do dia e do jeito... É Arte, não Ciência. 

Os espanhóis reclamam muito. Eles dizem preferir as suecas, porque elas dão sem frescura

Palavras deles, não minhas.

MADRID ERA UMA FESTA!Onde histórias criam vida. Descubra agora