Outro momento

1- um novo começo

𝐽𝐴𝐾𝐸
Outubro.

Não aguento mais ouvir uma sequer palavra que o professor fala e agradeço aos deuses por ele ter nos dispensado mais cedo hoje por conta da chuva fudida que tá tendo.

Liam não veio hoje pra faculdade e o odeio por isso, não queria ter que ir a pé pra casa nessa chuva, e muito menos de ônibus, que daria pau assim que começasse a andar.

"Quer carona cara? Não tem como você ir a pé pra casa."- Andre, um colega de sala me oferece e eu aceito, realmente seria suicídio a ideia de andar nessa chuva.

Quando entro em casa Liam está espatifado no sofá,com o cabelo bagunçado e com a televisão passando jogo de hockey.

"Eai."- o cumprimento e não obtenho resposta.

Sei por que está assim todo depressivo, America foi pra faculdade em Londres e pediu um tempo na relação com Liam pra se adaptar a vida nova.

Para o meu primo, isso foi uma sentença de morte.

Mas eu não posso opinar muito, por que aliás, estou em uma situação ainda pior.

Porra,sinto falta dela, pra caralho.

"Tá com fome? Reza pra ter alguma coisa nessa cozinha, o mundo tá acabando lá fora, não tem nem como ir no mercado agora."- o digo.

Liam se levanta e se espreguiça ao meu lado.

"Tem um pacote de macarrão aí."- ele pega o pacote e coloca na minha mão.

"Ei ei ei! Eu que vou ter que cozinhar?!"-digo, em forma de protesto lembrando-o meu não talento na cozinha.

"Se a casa pegar fogo, pelo menos a chuva apaga o incêndio."- Liam anda rindo até o final do corredor e entra no banheiro.

Os canos rangem tão alto quando Liam começa a tomar banho que o barulho chega na cozinha.

Faço o macarrão pensando no sorriso que vi no rosto dela quando jogou os capelos para o alto e nossa, nunca fiquei tão orgulhoso na minha vida.

E agora ela está do outro lado do país.

"Tá vendo? Você não queimou a casa, não vou mais ficar cozinhando pra você como se fosse um empregado, você não tem mais desculpa."- Liam reaparece e se apoia na bancada que divide os espaços entre cozinha e sala.

"Não caiu um braço seu?! Caralho, isso sim é uma vitória."- ele debocha do meu ato de não cozinhar e se serve.

"Vai se foder. Agora vê se enche o bucho."- o digo rindo e meu primo levanta os braços como um inocente.

𝑆𝐸𝐿𝐼𝑁𝐴

Faz uma semana que o ano letivo começou, já estamos na primeira semana de outubro e me assusto com o quanto o tempo passa rápido.

America fez questão de esperar essa semana pra enfim mostrarmos nossos alojamentos, pra arrumar a decoração do jeito que ela queria, então esperei e fiz o mesmo com o meu lado do quarto.

Minha colega de quarto é bem legal, é caloura como eu. Ester saltou nos meus braços quando me viu a esperando no quarto, ela trazia uma mala gigante e um sorriso enorme no rosto.

Ela estuda artes cênicas e a sua decoração de quarto se baseia em claquetes falsas e posters de seus filmes e atores favoritos. De uma semana que já estamos aqui ela parece ser a pessoa mais alegre, divertida e espontânea que conheço.

Meu celular treme na minha mão e os grandes olhos de Mare me esperam do outro lado da tela.

"Oi!!"- ela diz e sua voz familiar me conforta.

Jogamos papo fora por uns trinta minutos.

"Acho que foi o certo, me chame de imatura mas por enquanto não sei lidar com uma relação a distância. Mas ei! Quero ver seu quarto!"- ela me lembra sobre o por que da ligação.

"Ah sim, deixa eu te mostrar."- levanto da cama e mostro cada detalhe do quarto pequeno mas confortável.

A roupa de cama e os objetos branco e verde água são uma graça. Adorei quando minha mãe chegou com eles e disse "acredito que essa seja a sua cor." E é. Só de olhar já me traz alegria.

"Eu adorei muito, que lindo amiga! Tá, agora deixa eu mostrar o meu!"- ela da um gritinho e rio de como animada America pode ser.

Seu quarto, bem maior que o meu, com uma janela que da tela do celular da pra ver uma visão incrível de Londres, tem decorações amarelas e seu quarto parece um por do sol com a cama decorada com roxo e rosa. O quarto de Mare está incrível e perfeito, já o meu...

"Voce realmente se surpreendeu com essa decoração! Está tudo lindo Mare!"- a digo.

"Parece um por do sol? Por que quero que tenha essa vibe, mesmo com o frio ridiculamente congelante de Londres."-respondo afirmando-a e conversamos mais um pouco.

Contamos sobre nossas colegas de quarto e Mare diz que sua colega de quarto é uma trans, que é muito inteligente e extremamente engraçada. Fico feliz que Mare esteja com uma colega de quarto tão legal quanto a minha.

"Juro, ela me conta umas histórias tão engraçadas, ela é uma pessoa ótima, e talentosíssima, você tinha que ver os croquis dela!"

Conversamos por tanto tempo que perdemos a noção do tempo. Nos despedimos e Ester entra no quarto no minuto seguinte.

"Oie, estava pensando, que tal darmos uma volta pela cidade?"- ela propõe e aceito, acredito que realmente preciso conhecer o território.

"Sabe, estou tão feliz que estamos aqui, acredito que ambas lutamos muito pra isso."- Ester me fala e isso só comprova minhas teorias, ela é um amor de pessoa.

"Eu estudei muito enquanto meus colegas de escola iam em festas... mas agora vejo que valeu a pena."- digo, orgulhosa de mim mesma.

Não consigo acreditar que estou realizando meu sonho de estudar aqui. Claro que minha incógnita sobre qual curso fazer sempre me atrapalhou mas Nova York é e sempre foi minha única certeza na vida.

As ruas da cidade são tão barulhentas e movimentadas que entendo as pessoas que vivem de fone de ouvido enquanto andam. Na rua a maioria do movimento é formado por turistas adoidados com câmeras nas mãos.

Conforme andamos pelas ruas movimentadas, passamos em frente de lojas de grife, me sinto em um episódio de Gossip Girl, assistimos o sol descendo entre os prédios e só sinto vontade de abrir os braços e cantar "Empire State of Mind" da Alicia Keys e Jay-Z.

"É incrível! Tudo aqui é incrível!"- os cabelos caramelos de Ester contornam seu rosto pequeno e delicado, mesmo ela sendo incrivelmente alta.

"Ei! Vamos tirar uma foto!"- e agora é a nossa vez de botarmos nossas câmeras pra fora.