Capítulo 4: O feitiço

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"O que você tá fazendo?", Fluke perguntou enquanto Ohm movia algumas cobertas e travesseiros para o sofá da sala.

"Vou dormir aqui e você pode ficar com a cama, princesa!", Ohm disse em tom tranquilizador.

"Pois então eu vou pegar um travesseiro e dormir aqui também! Nem precisa olhar desse jeito, gatinho! Não posso imaginar passar uma noite tranquila dormindo sozinho!", Fluke respondeu e já ia entrando no quarto quando Ohm o abraçou por trás.

"Tudo bem, nós podemos dividir a cama. Achei que desse jeito você fosse se sentir mais confortável, foi só isso!", o detetive explicou.

"Não tem nada que vá me fazer sentir conforto até receber a notícia de que aquele bandido foi preso. Mas ter a sua presença do meu lado me faz bem… parece bobagem, não é?", Fluke respondeu enquanto apoiava as mãos nos antebraços musculosos de Ohm.

"Você pode confiar em mim, princesa...", Ohm sussurrou baixinho como se fosse um segredo precioso que ele estava dividindo com a pessoa mais importante do mundo. E, talvez, fosse mesmo.

********

Assim os dias e as noites foram consumidos de uma forma que ninguém parecia sentir. Todos estavam de algum modo anestesiados pela grande pressão que a ansiedade em descobrir a identidade do serial killer provocava.

Porém, no aconchegante apartamento de Ohm, os dois ocupantes haviam estabelecido uma rotina agradável que os permitia por alguns instantes esquecer os grandes problemas do mundo. Quase como um feitiço cobrindo as dores que eles sentiam na pele.

Numa dessas manhãs, em que Ohm se preparava para sair para a Delegacia, Fluke estava na porta observando. O homem mais alto estava diante do espelho do banheiro vestindo apenas uma toalha na altura da cintura e com o resto do torso definido à mostra. 

Fluke se sentia quase que sob efeito de um encantamento ao observar os movimentos precisos com que o detetive manejava o aparelho de barbear. Notando a presença do mais novo, Ohm sorriu para o reflexo no espelho e perguntou:

"Quer me ajudar?"

"Hum?", Fluke sentiu as bochechas queimando como se tivesse sido flagrado, ainda que não estivesse fazendo nada de errado.

"Vem cá!", Ohm ofereceu uma mão, que Fluke aceitou.

Quando o mais novo se aproximou de Ohm, ele o levantou pelas axilas, o fazendo se sentar no tampo da pia, de frente para ele. A proximidade entre os corpos causava uma tensão a que os dois estavam começando a se acostumar devido à convivência diária, mas isso não significava que ela tivesse diminuído. Pelo contrário, talvez fosse possível ver as faíscas entre eles.

"Me ajuda?", Ohm voltou a repetir, agora oferecendo o aparelho de barbear a Fluke.

Da mesma forma que Ohm fez antes, Fluke agora passava com delicadeza o aparelho sobre a pele do homem à sua frente. Os toques de Fluke eram tão suaves que Ohm nem se percebeu fechando os olhos para aproveitar o momento. 

Dentro daquele banheiro naquele instante, Ohm e Fluke se sentiam seguros como num abrigo anti calamidades. Se o mundo fosse atacado por aliens ou se envolvesse em uma grande guerra, pode ser que eles sequer notassem, pois tudo que conseguiam ver e sentir era apenas um ao outro.

"Prontinho!", Fluke disse terminando de passar a toalha sobre o rosto de Ohm.

"Obrigado.", Ohm disse abrindo os olhos e encarando os da pessoa à sua frente.

De alguma forma, o centro de gravidade entre os corpos havia mudado e Ohm se sentia sendo fisicamente atraído na direção de Fluke. A cada milésimo de segundo seus corpos mais próximos até que o seu telefone tocou, acordando ambos do transe em que se encontravam.

A princesa e o detetiveOnde histórias criam vida. Descubra agora