Falas de Rosseau e convite cor de laranja

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Entre os vários sentimentos humanos, a tristeza é tão pura e natural em nossas mentes racionais como a alegria, no entanto, se destaca por ser mais notável, sendo indiscutivelmente dolorosa e impactante

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Entre os vários sentimentos humanos, a tristeza é tão pura e natural em nossas mentes racionais como a alegria, no entanto, se destaca por ser mais notável, sendo indiscutivelmente dolorosa e impactante. Como o próprio Rosseau cita,
"A alma resiste muito mais facilmente às mais vivas dores do que à tristeza prolongada".

Uma tristeza prolongada traz dos mais efeitos colaterais, como a destruidora falta de desejo. E se eu pudesse citar a você, leitor, um dos meus maiores problemas nos últimos anos seria essa sensação melancólica de vazio, vazio de desejos, do principal desejo de um ser, o desejo de viver.

Essa sensação vem a mim com mais fequencia que deveria. As vezes a minha vida corrida entre reuniões e contratos, as consultas com terapeuta e cartelas de comprimidos não são suficientes para espantar esse esmorecimento, resultando no que eu denomino de pequenas reclusões e talvez eu me encontre em um esforço mental para fugir de mais uma delas.

Suspirei liberando pelos lábios, um tanto ressecados, a fumaça e segurando a lapiseira e o cigarro em uma mão comtemplei o esboço feito no skecthbook, os traços finos e desornados de meu típico estilo de desenho ilustravam o torço que o gigante espelho em frente a cama me mostrava. Meus cabelos negros tinham menos volume que o normal devido a oleosidade, os olhos rodeados por uma camada generosa de cílios, olheiras profundas, o peito desnudo e o cigarro entre os dedos.

Eu poderia dizer que a minha aparência alí era singularmente bela e soturna.

Mas na verdade essa definição foi dita por uma mulher, da qual o nome não é tão importante, que alegava sobre a existência de um exotico e místico charme no meu ser, onde eu atraía olhares não só pela beleza garantida pela genética, mas também pela aurea de suspense que me cercava, pelos segredos que eu parecia guardar. Como se eu fosse a própria caixa de Pandora, recheada de místerios que fariam alguns se arriscarem por pura curiosidade.

Nunca acreditei seriamente, ou talvez acreditasse, nas minhas camadas mais profundas inundadas de orgulho, mas a questão que reinava nessa falta de fé era o porquê da minha aparência cansada ser um destaque em uma sociedade onde todos estão assim? Mas me analisando por mais tempo, como agora, eu realmente pareço mais cansado que o considerado normal.

Não me importaria caso fosse apenas aparência.

Me joguei de costas, novamente embrenhado ao bolo de edredom e lençois e com aquela pequena toxidade, momentaneamente tranquilizadora, em mãos, olhei para o brilho do sol que invadia o quarto em fleches pequenos de luz entre as cortinas. Decidindo logo depois, juntar a pouca energia restante e levantar, apaguei o cigarro no cinzeiro na mesa de cabeceira e o deixei por lá, caminhando agora para o banheiro da suíte afim de tomar um banho e trazer de volta minha dignidade aparente.

Após o banho, em frente ao gabinete da pia desembaraçei meu cabelo o repartindo lateralmente, fiz a barba, escovei os dentes e perdi algum tempo procurando entre as gavetas um hidratante labial. Não me importei com a presença de Itachi, meu único irmão, sentado na minha cama quando saí do banheiro ainda com uma toalha presa no quadril.

- Tayuya me disse que você não saiu do quarto desde quinta a noite - Ele começou aquela conversa embaraçosa com sua voz grossa e suave.

- Tayuya deveria aproveitar os finais de semana livre dela de maneira mais proveitosa - Não respondi aquele questionamento camuflado, abrindo, enquanto via meu irmão funçar as pequenas bagunças do cômodo, uma gaveta do closet e puxei dela uma cueca box.

- Sabe que ela se preocupa com você, nós nos preocupamos com você - Disse juntando alguns pratos e copos que estavam espalhados voltando a falar apenas um tempo depois, quando eu já havia vestido a calça - Você está piorando, Sasuke, não lembro da última vez que vi você saindo de casa a não ser para o trabalho, essas suas crises estão cada vez mais frequentes e eu... Não sei como te ajudar...

Parei por um tempo processando o tom quebrado em que as palavras haviam sido soltas, aquilo trazia a mim uma péssima sensação de estar contaminando as poucas pessoas ao meu redor com a minha bagunça sentimental.

- Não se preocupe, isso vai passar, eu vou ficar melhor logo - Disse fechando o ultimo botão da camisa social preta e ainda olhando para o seu reflexo ofereci um leve sorriso, sendo retribuido.

Nenhum de nós dois acreditava naquilo, mas um pouco de positividade não custa muito

Aquele pequeno dialogo rodou com um disco ralado pela minha mente o dia inteiro, me fazendo perder o foco em determinados momentos, me esquecer totalmente do almoço e beber um copo de café a cada cinco minutos, em tentativas falhas de tirar o gosto azedo. Porque eu estava a beira de um precipício, a paisagem abaixo do meus pés era dolorazamente tentadora, meus braços estavam abertos para receber o ar do fim, mas meus lábios não sorriam porque ligado a mim havia outras pessoas e conceder a mim aquele desejo era também aceitar a traze-los comigo, como uma ancora afundando na escuridão.

E eu poderia lidar com qualque dor, mas não com uma ultima suposição de trazer tristeza a eles, de trazer isso à ele. Essa opção não estava disponivel.

Eu levei tudo isso a seção no final do dia, deitado no sofá vermelho descarreguei o que pude, não esqueçendo o pequeno adendo de isolamento desse final de semana. Aprendi a gostar disso, de ouvir Karin falar comigo, ela me conhecia melhor que eu mesmo, destrinchando meus relatos, minha alma, me ajudando a desfazer de alguns pessos.

Pouco antes do nosso hórario acabar, ela citou a uma frase, mais uma de Rosseau, "Tome um rumo diferente do de costume, e quase sempre estará certo". O certo é que nunca levamos isso completamente a sério, mas o contexto foi férias, de acordo com a ruiva, eu deveria tirar férias, viajar, descansar, praticar algum dos vários idiomas em que sou fluente sem ser tentando convencer alguém a assinar um contrato.

Férias.

Já tem um bom tempo em que ela bate na tecla de descanso, mas hoje esse conselho veio coincidentemente poucos dias após um envelope laranja chegar no meu correio. E talvez seja a hora de eu me esforçar um pouco mais para descer, da maneira certa, do telhado.

Puxei o celular do bolso digitando uma mensagem e a enviando para alguém que não iria me deixar desistir dessa ideia rápida.

"Você acha que consegue encontrar uma casa para alugar em Konoha?"

Flowers in the paperOnde histórias criam vida. Descubra agora