Eu não acho que enxergo. Tudo é escuro, e a única luz que eu enxergo é a luz que os botões no meu painel de controle exalam.
- Alô? - eu tento novamente. Ninguém me responde.
Perdi a conta de quantas vezes chamei e ninguém respondeu. Então, digo a mim mesmo que essa é a última vez que insisto.
Começo a aceitar que estou sozinho no espaço, à deriva, vulnerável para qualquer coisa que tente me atingir. Não posso ver a Terra. A Lua está em algum lugar ao longe, mas também não consigo vê-la. Tenho medo de nunca mais vê-la novamente.
Já apertei todos os botões, mas nenhum deles surte efeito nessa nave. Minha tela de controle pisca em diversas cores, mostrando que não há nenhum sinal de vida há milhares de quilômetros. As estrelas piscam quase em sincronia com meus botões, que piscam coloridos com as batidas do meu coração. As batidas parecem ecoar no vazio do espaço, retumbando como um grande tambor tocando em algum lugar do vácuo.
Me sinto mais vulnerável do que nunca estive, mas também me sinto estranhamente seguro. Sinto que por mais que eu esteja vulnerável, nada pode me machucar aqui. Sou inatingível neste espaço, nesse vácuo infinito, mas que nesse momento está resumido apenas a mim. Eu e minha minúscula mente.
Tento flutuar para longe, mas me sinto preso. Não consigo me mexer. Para qualquer lado que olho, está escuro. Os botões piscam freneticamente.
- Alô? - eu chamo novamente, indo contra minha própria promessa. - Tem alguém aí? Por favor, se alguém estiver escutando me responda. Você é a minha última esperança. Eu não sei mais por quanto tempo eu aguento.
Me jogo na cadeira de comando. O rádio solta um chiado horrível para os meus ouvidos, porque faz tempo que não ouço nada. Esse chiado, por mais que seja péssimo, me faz lembrar de que eu estou vivo. Eu estou aqui. Meu coração bate. Meus pulmões se enchem com o pouco ar que me resta. Eu ainda sinto: sinto a minha cabeça latejar por forçar a visão, sinto o traje pesar no meu corpo, e o suor frio escorrer na minha testa.
Tento encontrar algo que me situe no vácuo, mas ainda não vejo nada além de pontos brilhantes e deslizantes que eu já chamei de estrelas. Agora eu as considero pragas. Estou condenado a passar o resto da eternidade encarando estes pontos brilhantes, e eles já me parecem entediantes.
Então algo apita no meu painel de controle, e quase me deixo levar por uma onda de esperança; mas então me viro e percebo que meu painel me alerta que meu oxigênio vai acabar em dez segundos.
- Adeus, pessoa que não me ouviu.
Sete. Seis. Cinco. Quatro. Três. Dois. Um.
Me sento de supetão. Minha nave desaparece. Percebo, então, que não estou sentado. Estou deitado em minha cama. Meu fôlego volta de repente. Mas o espaço não vai embora. Todo o vazio ao redor na nave reside dentro do meu coração acelerado: chuvas de sentimentos semelhantes a meteoros, buracos negros que sugam tudo o que há ao meu redor, transformando tudo em rancor ou tristeza.
Encaro o teto do meu quarto. O quão miserável eu sou para me imaginar como um astronauta? Que nada. Sou só um ser humano inútil, que nem sequer sabe como é o mundo lá fora.
Sou apenas um ser humano inútil, com 15 anos de idade, que amanhã de manhã vai pedir para a mãe tirar essas estrelas fluorescentes estúpidas do teto do meu quarto.
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Imagine a Song
DiversosImagines inspirados em músicas, porque a vida não é nada sem música. Apenas one shots. Pedidos abertos.