Capítulo 6

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A síndrome do sonho interminável é um constante estado de imaginação que, geralmente, rompe a barreira entre a realidade e o lúdico, mantendo as pessoas que são portadoras da doença num looping de autossatisfação e autodestruição simultânea.

               — Surge na infância. – Falou a doutora Davies. Samanta deslizava a caneta sob uma folha, construindo garranchos inteligíveis e apressados, sublinhando os termos mais importantes. "Infância"; "lúdico e realidade" ...

                 Os portadores da síndrome possuem um caracter específico. Foram negligenciados durante a infância; já sofreram abusos psicológicos ou sexuais ou então são filhos de pais diagnosticados como narcisistas patológicos. As causas podem ser muitas, mas as sequelas podem ser apenas três:

               — Na primeira situação, o portador vive mais tempo no universo fictício dentro da sua cabeça, entretanto, reconhece que aquilo não passa de uma ilusão. – Explicou a doutora pondo-se a deambular pelo palco. — Na segunda situação, já não conseguem distinguir acontecimentos que de fato aconteceram, sofrem de perda de memória pontual e tendem a esquecer momentos traumáticos, sendo todos preenchidos por vivências imaginárias.

               Houve um silêncio.

               Todos desviaram os olhares de cadernos e notebooks para fixarem-se na doutora, que fazia suspense e os alunos esperavam como crianças que ouvem um conto de fadas.

               — O terceiro, é claro, o pior estágio. – Disse por fim. – Os indivíduos usam o mundo imaginário ao seu favor, seus atos têm sempre justificativa e também...

               Uma batida na porta da sala interrompeu-a. O reitor Meine adentrou o cômodo pedindo desculpas pela interrupção, apareceu escoltado por dois policiais e um murmúrio cresceu entre os alunos.

               Samanta sentava-se perto da porta, lugar privilegiado para ouvir o que o reitor e doutora conversavam, mesmo que tentassem falar o mais baixo possível, ela ainda conseguia ouvir fragmentos da discussão. A doutora assentiu com a cabeça, havia uma estranha expressão de confusão no seu rosto, ela virou-se para Samanta e aproximou-se da sua mesa.

               — Senhorita Lewis. – Falou ela. — Poderia acompanhar os dois oficiais? – A doutora esforçava-se para falar o mais baixo possível, mas já era tarde demais, toda a atenção já estava recaída sob as suas costas. Samanta sentiu-se tremer, o peso dos olhares curiosos e fofoqueiros era como uma faca pontiaguda para qualquer introvertido. Samanta ficou sem reação, sem compreender o que se passava ali.

               O reitor aproximou-se, pousando uma mão delicada sob a sua carteira.

               — Senhorita Lewis, nos acompanhe por favor, em breve tudo estará resolvido.

               Ela tentou falar, tentou perguntar-lhes o que se passava, mas da sua boca só saiu murmúrios e gaguejos de uma pergunta que ficaria presa na sua garganta para toda eternidade.

               Samanta guardou o caderno dentro da bolsa e colocou-se de pé. Atrás de si, ouviu-se risadas baixinhas e um cochicho atormentador, a garota nem hesitou em olhar para trás. Os dois oficiais afastaram-se para que ela passasse e assim que o fez, a porta da sala de aula fechou-se. Os dois oficiais marcharam à alguns metros atrás dela, o reitor alcançou-a, indicando o caminho o qual deveria tomar.

               — Eu fiz alguma coisa? – Indagou ela. Sua voz saiu mais baixa do que queria.

               O reitor suspirou.

Alter Ego (Em Hiato até Agosto de 2024)Onde histórias criam vida. Descubra agora