A jovem abriu os olhos com os pensamentos a todo vapor, um plano se formou em sua mente. Tentou se lembrar onde ficava a torre, mas não sabia. Ela se levantou com facilidade, o corpo já havia se recuperado. Sem fazer nenhum barulho, caminhou lentamente até o lago e sentiu a energia emitida.
Ela avistou uma pequena faca prateada na beirada. Tinha o mesmo símbolo de cobra dos homens que a atacaram. Mayd pegou a faca e voltou a se deitar no mesmo lugar escondendo o objeto. Fingiu tossir e chamou a atenção do homem que foi em direção a ela.
— Você está bem? — ele a analisou. — Parece melhor.
— Estou com fome.
O rapaz procurou e retirou um pedaço de pão da sua bolsa e entregou a mulher, que devorou em pouco tempo. Ele a ajudou a se levantar e ela caminhou pelo quarto até a janela, observando os raios cortarem o céu chuvoso.
— O que aconteceu com você? — o homem perguntou.
Mayd não respondeu, apenas o encarou com seus olhos cheios de água.
— O que aconteceu com você? — Kad repetiu
— Me atacaram! — ela respondeu com os dentes cerrados. — Destruiram minha casa! Estragaram o dia mais importante da minha vida!
— Eu sinto muito— ele respondeu. — Atacaram minha aldeia também.
Ela apenas o ignorou e continuou:
— Eu tentei correr, mas não fui rápida o suficiente. Conseguiram me pegar. Eu não consegui me defender. — ela contou, depois se afastou do rapaz — Preciso sair daqui! Eles vão voltar a qualquer momento!
— Posso te ajudar a sair pela janela, mas acho que você está muito fraca para descer pela parede.
— Mesmo que eu estivesse bem, é impossível sair pela janela.
— Como você sabe disso?
— Como? — ela pensou em algo. — Minha mãe sempre me contava de uma torre no meio de uma floresta onde você consegue entrar, mas não consegue sair sem permissão.
— Não é verdade.
— Tente sair daqui. Tente ir embora pela janela. Você não vai conseguir.
Kad não acreditou. Foi até a janela e tentou jogar o corpo para fora, mas não conseguiu sair, tentou várias vezes e fracassou. Tentou até começar a doer o corpo e a mente como se um raio percoresse seu corpo. Por fim, ele caiu no chão em frente a janela.
— Eu avisei — ela debochou e deu um sorriso maléfico.
A jovem começou a pegar as velas acesas do quarto e as organizando em um círculo. Aproveitou que o homem não a observava e usou a faca para fazer um pequeno corte no braço. Usou o sangue que escorria do machucado para traçar símbolos no meio do círculo e esperou.
O homem voltou à lucidez e começou a se levantar. Ele se aproximou da mulher.
— O que foi aquilo? — ele apontou para a janela.
— Isso importa? — ela perguntou com as sobrancelhas arqueadas e ele afirmou com a cabeça.
Mayd se aproximou de seu ouvido e sussurrou:
— Magia. Feitiço. Energia. Como preferir chamar.
Ele arregalou os olhos e se afastou. Ela se aproximou de seu ouvido novamente.
— Não se preocupe! Eu sei como sair daqui — ela debochou e deu uma risada maléfica —, mas acho que você vai odiar.
— Como? — ele perguntou com a voz trêmula de medo.
Mayd sorriu de lado e caminhou até o meio do círculo de velas. Indicou para que o rapaz também se aproximasse, porém ele não foi até lá.
— Venha logo! Não consigo sair sozinha — ela afirmou. — E você também não consegue.
— O que você vai fazer? — ele perguntou e se aproximou um pouco.
— Não temos tempo para isso!
Como se ela tivesse pressentido, Kad ouviu o som de cavalos se aproximando da torre. Olhou pelo canto da janela e viu vários homens se reunindo ao redor da torre. Todos estavam com armas na mão.
Kad foi até o meio do círculo, mantendo distância da jovem.
— Está com medo de mim? — Ela encarou seus olhos atentos. — Isso vai ser mais divertido do que eu imaginava. — Ela abriu um sorriso angelical enquanto ajeitava a pequena adaga em uma de suas mãos. — Você me salvou! Eu não quero te machucar! — Ela tocou o tórax do rapaz com a outra mão. — Mas eu preciso fazer isso!
Antes que Kad conseguisse reagir, Mayd enfiou a adaga em seu abdômen e empurrou seu tórax em direção ao chão.
Kad bateu novamente a cabeça no chão.
Ele colocou os braços na frente do corpo para se proteger, mas Mayd foi mais rápida e esfaqueou sua barriga mais uma vez.
Sangue começou a escorrer no chão.
Kad conseguiu chutar o pé da jovem, fazendo-a perder o equilíbrio e derrubar a faca no chão.
O rapaz esticou o corpo e alcançou a faca. Acertou o braço da jovem com a faca, tentou atacá-la novamente, mas ela conseguiu se afastar e se levantou.
Mayd pegou uma vela acesa e jogou em direção a barriga já machucada do rapaz. A vela caiu ao lado, mas um pouco de cera acertou os olhos de Kad.
Ela aproveitou e chutou a barriga do rapaz, que gritou e soltou a faca.
— Perdão — ela ironizou ao ouvi-lo gemer de dor — Eu precisava da sua ajuda para sair daqui.
Ela pegou a adaga e rasgou o peito do rapaz. Ela empurrou o corpo até o exato meio do círculo. Desenhou alguns inscritos com o sangue do rapaz e retirou seu coração pulsante.
Ergueu os braços e ofereceu o coração aos deuses.
Proferiu algumas palavras que havia decorado há muito tempo.
Um raio atingiu a torre.
Ela soltou os coração e abriu os braços, sentindo a eletricidade percorrer seu corpo. Uma luz azul preencheu a torre, iluminando o céu noturno e assustando os soldados do lado de fora, que pegaram seus cavalos e fugiram bosque adentro.
O círculo de velas emitia um fogo tão alto que queimava o teto da torre. Mayd tocou o fogo e sentiu o calor que não a machucava.
A feiticeira saiu do círculo e tocou a parede da torre, que derreteu como o gelo em contato com fogo. O céu tempestuoso combinava com a jovem. Raios atingiam seu corpo despertando todo seu poder guardado há muito tempo.
Com apenas um gesto, Mayd destruiu a torre por completo, deixando apenas um amontoado de pedras na clareira.
Ela não percebeu, no entanto, que ,apesar de tudo, o corpo do rapaz continuava intacto, e que, mesmo naquele estado, era possível ouvir uma respiração suave que ecoava do peito do rapaz.