A luz encandeia-me a vista, barrando a oportunidade que tenho para associar a voz de quem proferiu a frase anterior a uma cara. As minhas pernas tremem como varas verdes e sinto-me desfalecer aos poucos. Volto a cara para a esquerda e semicerro os olhos. Perfiladas ao meu lado estavam outras raparigas, algumas aparentemente mais novas que eu. Eram cerca de seis. As expressões delas eram de terror, o chorro e os gritos eram constantes. Já eu fiquei completamente bloqueada, congelada. Os meus batimentos cardíacos estavam para lá dos cento e quarenta mas essa não seria a preocupação principal.
Torno a olhar em frente. A silhueta de um homem aparece à minha frente tapando os raios de luz que me feriam os olhos. Ele é enorme. Veste uma t-shirt e umas calças pretas. Os seus cabelos são compridos, tal como a barba, e usa-o apanhado num rabo-de-cavalo. Os seus braços são tatuados sem ter qualquer espaço para vermos o tom de pele. O que é isto? O sujeito cruza os braços e olha-me de cima a baixo com uma expressão de satisfação. Contorci-me com nojo. Ele tem um ar extremamente arrogante que fazia passar aos demais ali presentes que era capaz de fazer mal até ao mais pequeno animal indefeso. Desvio o olhar para ver o que estava atrás dele enquanto entendo que os olhos dele continuam a pousar sobre mim. Ouço-o falar. Profere meia dúzia de palavras numa outra língua. Parece-me russo. É então que entendo que atrás deste matulão está lá outro muito parecido com ele, pelo menos no jeito de vestir e na sua fisionomia corporal. O restante não consigo captar. Este segundo matulão ainda está um pouco longe e os poucos raios de sol que iluminam a rua impossibilitam-me ver-lhe o rosto. O matulão nº2 responde ao matulão nº1 na mesma língua.
"Estas não são as vozes." Penso para mim. Ambas são muito mais carregadas e agressivas que a voz rouca de quem foi identificado como "senhor Hemmings".
O tempo parecia não passar. Parecia que eu estava presa num momento sem fim. Só queria entender, juntar as peças e entender tudo o que se estava a passar ao meu redor.Em segundo plano, bem atrás destes dois armários ambulantes, havia uma mansão enorme de três andares. Branca, no estilo moderno, toda iluminada com luzes amareladas e carregada de janelas que permitiam ver no seu interior um cenários perturbador. Mulher e mais mulheres. Umas altas, outras baixas, umas muito magras e outras mais gordinhas. Algumas nuas, outras apenas em lingerie. Não lhes consigo enxergar a cara, mas pela forma como se movem parecem frustradas. Meu Deus, Meu Deus. Onde é que eu estou? Quero sair deste pesadelo. Quero acordar. Vejo adultos à minha volta mas não vejo noção neles.
O primeiro matulão que outrora me havia olhado com uma expressão que me deixou perturbada, abalroa-me e puxa-me para ele pelo braço. Gesticulo-me a fim de me soltar, mas ele tinha força, muita força. A sua mão era tão grande que ela podia envolver todo o meu braço. Continuo a movimentar-me. Ofereço resistência e isso deixa-o irritado. O sujeito grunhe algumas coisas na sua linguagem estranha que julgo serem palavrões. Pôs-se, então, atrás de mim e levou-me a outra mão até ao meu braço esquerdo. Levantou-me, fazendo com que os meus pés saíssem do chão. Aproveito a oportunidade para o atingir. Abano as pernas vezes e vezes sem fim. Acerto-lhe uma ou outra vez na barriga, mas não há qualquer alteração nem queixas aparentes que mudem a postura dele. Ainda assim continuo a oferecer resistência, e ele continua o caminho em frente.
Sobe os degraus antes da porta principal. Aproximamo-nos mais da entrada até que adentramos a mansão. Logo dou de caras com vários móveis em tons escuros com vários itens estranhos em cima. Ora tinha plumas de diversas cores, ora coisas semelhantes a algemas mas felpudas. Ainda envolvida pelas mãos do homem arrogante de nacionalidade desconhecida, apercebo-me de uns sons que me captam a pouca atenção que tenho. Aturdida vou em busca do mesmo com os olhos. Reparo então que bem à minha direita há uma pequena sala. As janelas estão fechadas e aquilo que a ilumina são uns focos coloridos que vão alternando as cores. No meio da sala está uma mesa feita de algo que me parece ser vidro, e em cima desta está uma mulher adulta, possivelmente entre os seus trinta anos, ruiva e nua. As pernas dela estavam abertas e no meio delas estava um homem de baixo estatura, calvo, gordo e com uma barriga enorme, vestia um fato de linho preto e uma camisa branca. Ele estava a meter-lhe a mão lá. Cerrei os olhos. A minha boca abriu-se involuntariamente. Estou chocada. Quero sair daqui o mais depressa possível.
- Czar! – Um grito invade o corredor por onde o matulão desconhecido me carrega. – Czar! – Volto a ouvir. Paramos. O grandalhão fica imóvel.
Em frente a nós o corredor continuava. Estava escuro e pouco conseguia entender o que havia para além dele. Escuridão, escuridão, escuridão. É tudo o que vejo, é tudo o que sinto. Quando é que este pesadelo vai acabar?
Sob uma luz lilás que clareia todo o espaço comprido aparece um outro ser. Um homem loiro, mais bem-parecido do que os que apareceram até agora, alto, de olhos azuis e jovem, fica parado bem em frente a nós. Mostrou-se chateado, desagradado com alguma coisa perante o grandalhão que me segurava pelos braços. O mesmo pousa-me e cruza os braços num ápice. Já o jovem batia freneticamente com o pé direito no chão.- Há alguma dúvida sobre o que falamos antes, Czar? – Pergunta o homem de olhos azuis. Encolhi-me perante as suas palavras carregadas de raiva.
O matulão não respondeu, pelo menos verbalmente pois não ouvi nada. Apenas virou as costas e saiu do corredor de volta para a porta de entrada. Sigo com os olhos o caminho dele quando me voltei para trás. O grandalhão estúpido posicionou-se na porta, colocou uns óculos de sol escuros na cara, e ficou lá parado de braços cruzados. Nem parecia respirar.
- Lola. – Em baixo tom o meu nome é proferido por aquela que viera a ser, até agora, a voz que ainda não tinha uma cara associada.
Viro-me para este de forma a encará-lo. Com medo e entre palavras proferidas com as cordas vocais tremulas, pergunto: - Onde é que estou?
- No meu mundo. - Disse arrogante, sem me encarar, enquanto eu o fazia a todos os segundos.
A cara dele era simétrica e bonita, até tinha uma expressão arrogante demais para aquilo que deveria ser. A sua expressão não condiz com o resto. Diria que a bota não bate com a perdigota. Usa, no canto inferior esquerdo do lábio, um piercing. Uma pequena argola preta. Este trinca-a enquanto por fim me olha. Vestia umas calças de ganga pretas e uma camisa de cetim vermelho. Algo nada formal. Os seus olhos pousam por cima do meu corpo deixando-me mais nervosa. Não gosto quando me olham assim. Engulo em seco, respiro fundo e tento acalmar-me dentro daquilo que penso ser possível. Tento não mostrar medo perante. Das poucas coisas que aprendi com o meu pai quando ele ainda queria saber de mim é que quanto mais medo mostrarmos quando nos sentimos ameaçados pior é, porque é uma vitória para quem tem a finalidade de amedrontar.
- Eu não quero estar aqui. – Respondo. – Eu não quero estar neste mundo.
As luzes apagam-se. Deixo de o ver, mas sinto a sua respiração na minha testa. Solta um sorriso carregado de malicia que me arrepia a espinha. Sou rodada e logo de seguida puxada para ele, ficando de costas encostada a ele. Sinto-o esticar-se e abrir uma porta qualquer. O rapaz empurra-me para dentro do comodo. Era algo semelhante a um escritório. Havia uma secretária preta enorme de madeira, e atrás desta umas estantes completas de livros. A luz a média intensidade e a temperatura amena. O cómodo é decorado em tons escuros, tal como tudo o que me passou à frente até agora. Entrar naquele local deu-me arrepios novamente. Em cima da sua secretária estava um bastão preto, com uma chapa de couro em forma de rectângulo na ponta. Não sei se devo estar assustada ou rir-me por ver umas cuecas vermelhas em cima de um candeeiro.
- Tu fazes parte deste mundo. – Disse-mo como quem me quer impor uma ideia. – Mesmo que não tenha sido escolha tua.
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RENDIDA ● LUKE HEMMINGS
FanfictionLola Martinez é uma rapariga jovem e inexperiente que nunca soube o que é o amor e as vantagens e desvantagens dele, mas também não estava preocupada com isso. Tudo o que ela ambicionava era concretizar os seus sonhos e melhorar a sua vida que em te...