04. "Trata-me por papá"

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Encaro a porta de madeira sem desviar os olhos um minuto. Estou sozinha dentro desta sala ampla carregada de energias negativas. Devem estar cerca de trinta graus cá dentro sem correr um pingo de ar. O relógio mostrava-me que já se tinham passado bastantes horas. Os ponteiros batiam perto da meia-noite e eu continuava aqui sem respostas às minhas perguntas, com fome e cada vez com mais medo. Fui abandonada por aquele homem jovem no escritório e continuo aqui.
Não tenho nada para fazer. Ora me levanto, ora me sento. Já tirei os totós horríveis que tinha no cabelo. Por muito que puxe a saia para baixo alguma parte de mim fica sempre destapada. Bato freneticamente com o pé no chão. Levanto-me de novo. Dou a volta à secretária e sento-me na poltrona de couro preto em frente a toda aquela papelada desorganizada do homem loiro de olhos azuis. Em letras garrafais havia um arquivo com o meu nome escrito. "Lola Martinez". Estou no local e tenho a oportunidade ideal. Talvez aqui dentro tenha a resposta a todas as minhas perguntas.
Com as mãos tremulas e receosa não só do que possa encontrar, mas de que me possam encontrar, desfolhei-o o arquivo.
Na primeira página havia anexada a algumas folhas, uma foto minha com já algum tempo. Talvez dois, três anos. Por baixo dela uma ficha com os meus dados pessoais. Nome, idade, morada, escola onde estudo, o nome dos meus pais e o dos meus avós, entre outros. Viro a página, deparando-me com um texto corrido com detalhes sobre mim. Li-o de forma corrida e em "z". Contia informações sobre relações que tivessem existido na minha vida, – que no caso foram 0 – os meus supostos planos para o futuro, os meus maiores desejos e gostos. Isto é estranho demais. Gelo a cada linha, a cada letra.

- O que procuras não está ai. – Corta-me a respiração quando ouço.

O homem loiro de olhos azuis adentra o escritório, mas não pela porta principal. Ele aparece pela porta à direita da mesa onde estou. Com o cabelo húmido, de roupa trocada e uma posse autoritária o homem aproxima-se enquanto fecha os botões dos punhos da camisa de linho branca. Com ele trás também uma brisa de perfume forte de homem. Até que era agradável, porém não deixava de ser desconfortável.

- Chegaste a ler a parte em que te caracterizam como curiosa? – Interroga. – Porque eu li... - Responde à sua própria pergunta sem nem ter ouvido a minha resposta. - ... e por isso mesmo retirei aquilo que te poderia informar demasiado.

Pé ante pé o homem aproximava-se lentamente. Humedecia os lábios rosados com a língua logo após ter trincado levemente o lábio inferior. Os seus olhos tão claros e profundos invadiam os meus. A minha respiração aumentava gradualmente, o meu coração disparava. O que é que ele quer de mim afinal? Sou refém? O senhor coloca-se em frente a mim. O seu corpo estava relaxado. Inclinou a cabeça para a direita enquanto não desviava os seus olhos dos meus, e eu nem tão pouco pensei em oferecer resistência ao impacto que ele me estava a causar. Engulo em seco vezes e vezes seguidas. As suas calças clássicas pretas estavam abertas com o cinto desapertado e a fivela suspensa. O homem toma as minhas mãos nas suas e pousa-mas por cima das minhas coxas nuas. Em seguida afaga o meu rosto, enrola no indicador uma madeixa do meu cabelo e coloca-o por trás da minha orelha, tudo isto enquanto demonstrava ter um pingo de carinho na sua alma. Devagar vai contornado os dedos pela minha boca até que com o polegar ma deixa entreaberta.
Gostava de conseguir descrever esta sensação que me arde no corpo. O meu coração continua a bater tão depressa que parece que a qualquer momento vai parar. Sou envolvida pela ânsia de saber a intenção dele com estes atos, e sou envolvida pelo receio que me magoe, que me bata, que me mate.

- Quanto mais rebelde fores, pior é para ti Lola. – Murmura-me ao ouvido em tom de ameaça. Apanha parte do meu cabelo, entrelaça-o pelos dedos e puxa-mo. Com o impacto recosto-me na cadeira e apoio as mãos na poltrona fazendo força para cima, na tentativa de me levantar. – Eu não te vou fazer mal, eu não te vou tocar. – Continua em baixo tom. – Nem ninguém aqui dentro o vai fazer. Ninguém te vai tocar num fio de cabelo que seja com o sentido de te magoar, Lola. – Diz dando enfase a cada palavra. – Quando te digo que é pior para ti quero-te dizer que vais pagar por cada ato teu, sendo castigada com as coisas que mais gostas.

- Coisas... que... eu... gosto?

O homem esboça um sorriso malicioso ao mesmo tempo que me solta. Bato com as costas na poltrona. Estou ofegante e mal consigo pronunciar as palavras. Ele dá um passo atrás, coloca a camisa por dentro das calças e aperta o cinto. Penteia o cabelo com os dedos e arranja a gola da camisa.

Ao fundo ouvem-se acordes de alguma música. Não a conheço. Tem uma batida forte, facilmente coordenada com o ritmo do meu batimento cardíaco. O som vinha de outro comodo da mansão. Esta que é tão grande e ao mesmo tempo tão pequena para mim, que me vejo confinada a estas quatro paredes.

- Qual é o teu nome? – Trato-o por "tu". Escapa-me por entre os lábios.

- Para ti... - Diz - ... trata-me por "papá".

RENDIDA ● LUKE HEMMINGSOnde histórias criam vida. Descubra agora