CH04

22 6 106
                                    

- 4 -


Quando acordei no mesmo banco, assustei. Não acreditava que havia adormecido ali. Estava gelado e nada confortável. Me impulsionei a ficar de pé, sentindo os estalos de minhas costas e o forte torcicolo no pescoço.

Olhei acima, o céu, ainda estava de noite. Não sabia dizer se ainda era o mesmo dia, ou se havia desmaiado por quase um dia inteiro. Peguei meu celular no impulso, o destravei e disquei o número de Kat, aguardando.

"- Alô, é a Kat! Pode falar. - Ela atende, mas quando abro a boca para falar, fui surpreendida com a verdade. - Te peguei! Deixe um recado que ligo de volta."

- Oi Kat, estou na estação de trem. - Falei, observando as horas pela tela do celular: quase duas da manhã. - Ia pedir uma carona, vem logo. Em dois minutos me liga! Dá para ir caminhando, mas está muito frio!

Assim que desliguei, senti calafrios por todo meu corpo, era quase a mesma sensação de antes, com o rapaz da estação. Senti na pele, literalmente, o arrependimento de não ter pego ao menos um casaco, pois estava prestes a congelar naquele vestido de tecido frágil.

Pensei em ligar novamente para Kat, foi quando percebi que meu celular iria descarregar. Bufei, impaciente e desacreditada.

Decidida, virei-me para a cabine da estação e fui averiguar se havia alguém. Ao menos tivessem um telefone.

De qualquer forma iria esperar Kat, quando dois homens mal-encarados apareceram atrás de mim. Um moreno de rastafári que usava uma jaqueta de alguma banda de hard rock, e o outro, um asiático de cabelo engraçado, segurando uma garrafa de bebida. Os dois conversavam em cochichos, e cada palavra alta como "gostosa" vinha acompanhada de risadas pervertidas e suspiros imitando - de forma tosca - o orgasmo feminino.

Desisti de esperar por Kat naquele momento. Prendi o cabelo em um rabo-de-cavalo e, sem olhar para trás, contornei a estação de volta para casa. No entanto, antes que desse o primeiro passo resolvi esperar. Algum lado investigador falou mais alto e quis ir até o bilheteiro, ao menos tentar descobrir, pela compra da passagem, o nome do rapaz que havia chegado em Hallstatt.

Outra vez olhei as horas, não havia mudado muita coisa. Levantei-me para ir ao bilheteiro e um senhor rabugento, de face zangada e cansada, me atendeu. Os olhos fundos me analisavam, enquanto sua mão magra me entregava o bilhete, após receber toda minha quantia em dinheiro que restava, claro! Ele fedia a bebidas baratas, e não foi um palpite, ao lado da bilheteria muitas garrafas de vodca estavam jogadas no chão. Levantei minhas sobrancelhas como se me despedisse do idoso, e então ele saiu por uma pequena porta, retornando para dentro da pequena lanchonete atrás da estação.

- Lust Mansom. - Li, era o nome do rapaz. Rapidamente me lembrei das iniciais L. M. no cartão que viera com o presente, era ele.


Retornei ao banco, e me sentei. Peguei meu telefone, indo direto às chamadas, mas ninguém havia me ligado. Selecionei, após encontrar, uma playlist e a deixei tocar. Pude ouvir ao menos vinte segundos de Billie Eilish, antes do celular descarregar completamente.

Vi, bem longe, a luz do trem que vinha descendo a montanha, que logo desapareceu na queda daquele mundo de árvores altas. Levantei-me preparada, e observei atenta quando o poste de luz ameaçou falhar. A luz piscava e o trem demorava a chegar.

Uma estranha sensação de estar sendo vigiada veio em minha mente. Guardei o meu celular e caminhei devagar até os trilhos, ficando atenta. Olhei para o fim da linha, e não havia nenhum sinal do trem, então retornei para o banco.


No escuro, algo chamou a minha atenção. Forcei minhas vistas e o escuro obteve forma, braços e pernas, mãos e pés, e, por fim, um rosto sorridente escondido por um manto roxo. Tive certeza de que era alguém quando, seja-lá-quem-for, se infiltrou nas sombras, desaparecendo.

- Hei, você! - gritei e, no impulso, corri atrás.

Me joguei nas sombras, seguindo o barulho que os arbustos faziam. De longe via o corpo magro e esguio continuar correndo, realmente era alguém. Permaneci em linha reta, enquanto o fugitivo corria em ziguezague, querendo me despistar. Parei no mesmo instante que a pessoa havia parado do outro lado.

Ávido AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora