Capítulo 3 - A fuga

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O ar quente saia de sua boca ofegante enquanto suas pernas moviam-se velozmente, os cabelos se tornavam apenas vultos entre as arvores daquele bosque escuro. Mesmo no auge daquela manhã fria o céu nublado não permitia que o sol se esgueirasse entre os galhos dos extensos pinheiros, mas Hedonê enxergava claramente ao passo que seus olhos lilases brilhavam nas sombras ao mesmo tempo em que aquela luz sinistra formigava suas mãos.

Ela não sabia mais do que estava fugindo, se daqueles homens ou de si mesma. Seus poderes se manifestavam de forma diferente na terra, como se fosse capaz de destruir uma cidade inteira, o que fizera naquela loja não passaria despercebido pelos humanos.

Subitamente Hedonê é arrancada de suas apreensões quando seu pé esbarra em uma pedra, ela cai com tudo no chão, por sorte, seu corpo aterrissa num emaranhado de folhas e pinhas. Quando olha para suas mãos o brilho se esvaia lentamente até sumir por completo, ela suspira aliviada e vira de barriga pra cima permitindo alguns minutos de descanso.

Desde que chegara ali parecia estar no modo automático, reagindo sob um espirito sobrevivente ao desconhecido, sem ter para onde fugir ou se esconder, seria dessa forma de agora em diante? Sentia-se tão humilhada em ter de tirar vantagem de seres humanos tolos, mas que escolha tinha?

A figura de sua mãe volta a assombrar seus pensamentos, como ela conseguiu entrar em contato daquela forma? Foi ela que acionou aquele ímpeto furioso em Hedonê? Nunca se sentira forte daquela maneira, o que era estranho porque dado o momento estava tão fraca quanto uma criança.

Hedonê olha para as próprias mãos com cenho curioso, se sua mãe é capaz de entrar em contato, pois então deve haver uma maneira de sair. Todo esse tempo pensara que uma vez caída na terra nada poderia fazê-la voltar, era um exilio estar ali, uma sentença, mas qual foi sua acusação afinal? Porque estava ali?

A garota aperta os cabelos fartos com as mãos que quase desaparecem entre os fios cacheados. Para sequer pensar em retornar ao Olimpo precisava sair dali primeiro, ou morreria de frio.

Hedonê se força a levantar do pequeno colchão de folhas e continuar sua caminhada confusa, ela apenas anda sem rumo por um momento até começar a ouvir barulhos estranhos. As árvores se estendem mais a frente onde vultos apressados passam, a menina contraí as sobrancelhas e apesar de seus pés vacilarem e as mãos tremerem, ela continua em frente. Porém, quando menos espera o caminho cessa em um pequeno barranco, logo abaixo grandes estradas se estendem com veículos furiosos arrastando seus pneus sob o asfalto.

A garota se apoia insegura em uma árvore, hipnotizada com o trafego assustador e as grandes construções perdidas onde seu horizonte alcançava, era tudo tão grande... Hedonê se desprende da árvore aos poucos tentando acostumar os olhos com os finos raios de sol que começaram a brilhar no céu. Por poucos segundos sentira paz, apesar dos barulhos incessantes da estrada, uma melodia calma percorre ela, seus olhos lilases mergulham naquela luz calorosa.

Precisava continuar em frente, ao que parece os humanos tem a civilização deles mais ao longe, poderia tentar se misturar e achar um lugar para ficar só essa noite, depois pensaria em algum plano, talvez esperar sua mãe entrar em contato de novo.

Num pulo, Hedonê salta do pequeno barranco e atravessa o cerco de aço que separava a grande serra da estrada, os cerrados se perdem nas proximidades do centro, teria que tomar cuidado quando estivesse por lá, não deve haver bosques para se esconder. Ela segue a grande avenida tomando cuidado com os carros que passavam velozmente ao seu lado, fazendo seus cabelos balançarem no ar. Distraída entre veículos e construções que se erguem até o céu, Hedonê não sente os pés cansados dentro dos tênis pretos, mais prédios estreitam a cidade e várias pessoas circulam pelas calçadas nas quais a garota nem lembrava ter pisado.

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