O Trio das Sombras

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P.O.V TRIZ

Já passou uma semana desde o acidente de Jill. Ela ainda não voltou para as aulas. Disseram-me que o seu caso não era grave, mas que ela ficaria um tempo em observação na enfermaria. Me impediram de vê-la todas as vezes em que tentei visitá-la (o que não foram poucas) e eu não sei o porquê.

Estou sentada ao redor de uma mesa grande na biblioteca com Alex, Caleb, Lua e, por mais estranho que pareça, Clarisse ao meu lado. O mais inquietante silêncio reina sobre o ambiente. É possível até ouvir o silêncio – irônico, eu sei, mas é possível.

Caleb relê pela milésima vez o livro Hogwarts: Uma História, o livro preferido de Jill. Tenho certeza de que se ela estivesse aqui faria alguma referência nada interessante sobre algum trecho do livro, tipo “Vocês sabiam que é proibido aparatar nos terrenos da escola?”.

Nossa. Se eu me lembrei disto, então a coisa se complicou de verdade.

Caleb se levanta e direciona-se a estante de livros mais próxima, guardando o livro que lia e pegando outro igualmente velho e poeirento, com o título grande estampado na capa: Um Guia de Autoproteção de Quintino Trimble.

Um falatório vindo de um grupinho na janela alcança meus ouvidos. De repente, todos os presentes na biblioteca se atropelam até a saída. A bagunça é tanta que Clarisse, que tinha a cabeça apoiada na mesa - provavelmente dormindo e babando - se levantou no susto. Percebo meu irmão na correria e puxo seu braço quando ele passa por mim, perguntando-lhe o que aconteceu.

– Estão duelando no pátio. – responde ele.

– Quem? – Pergunto, mas estou falando com as paredes, pois Jack já zarpou daqui há tempos.

Numa concordância muda, todos levantamo-nos da mesa (exceto Caleb, que já está de pé, folheando o livro de Quintino) e corremos ao pátio.

* * *

– Tecnicamente - explica Caleb. - Duelo é uma forma de combate entre duas pessoas armadas. Ou seja, isso não é exatamente o que podemos chamar de duelo.

Empurrei todos a minha frente para ter uma visão clara do que está acontecendo. Três alunos duelavam - ou de acordo com Caleb, não duelavam - de forma voraz. Pareciam se mover como sombras.

A primeira sombr... aluna é uma garota que tem o símbolo da Grifinória/Amizade brilhando no sobretudo escuro. Cabelo louro e longo, pele clara e olhos verdes visíveis até mesmo do local onde estou. É o tipo de garota que é bonita, sabe que é, e usa isso a seu favor. Ela aponta a varinha para o segundo aluno, o mesmo que ajudou Jill na Torre. Cabelos e olhos castanhos. Parece o mais normal dos três, mas de certa forma, é o que aparenta ser o mais perigoso. O feixe de luz que dispara da varinha da loura o atinge e ele voa pelos ares ao mesmo tempo em que a garota é atacada pela terceira sombra e rola pelo chão, fazendo uma trilha de terra na grama perfeitamente aparada. A primeira e a segunda sombra se levantam rindo. Espera... rindo?

A terceira sombra é uma menina. O símbolo Grifinória/Erudição reluz no sobretudo, a pele quase transparente em contraste com os cabelos pretos azulados e os olhos negros. A terceira sombra... é a Jill.

Ela está completamente diferente: o cabelo, a pele, os olhos, até a altura (impressão minha ou ela parece mais alta?), mas ainda assim, de alguma forma, ela continua sendo igual ao que era antes. Continua sendo a Jill.

O trio fica assim por um tempo: atacam, são atacados, caem, levantam, gargalham e voltam a lutar, até que a Professora Minerva aparece e decide interromper o show, espantando os alunos. Estes fogem como se a McGonagall possuísse algum tipo de doença contagiosa.

Ouço apenas partes do sermão:

– ...mal chegaram aqui e já me arranjaram problemas. Espero que isso não se repita novamente.

Os três lançam seus sorrisos mais doces.

– Sim, Professora McGonagall.

Minerva se afasta deles, seguindo na nossa direção.

– Então é isso? - pergunta Caleb a ela – Sem castigos, detenções ou diminuição dos pontos da Casa?

– Sim, é isso. – Responde a Professora, voltando para o interior do castelo. Curta e grossa.

– Que injustiça - resmunga Caleb.

– Triz - grita Jill correndo até mim e parando a alguns metros de distância. Sem abraços, sem beijos e sem aquele cumprimento esquisito e exagerado de um minuto que é a nossa marca registrada. – Estes são Carolyn e Carl Bennet.

A garota, Carolyn, apoia as mãos na cintura, piscando para Caleb e Alex, ambos sorrindo como dois idiotas.

O modelo estampado na roupa de Carl é Grifinória/Franqueza. Ele parece mais simples que a irmã, mas não menos arrogante. Seus olhos examinam cada um de nós com um ar de superioridade.

Estou chocada demais para falar, então Clarisse faz esse trabalho por mim.

– Finalmente te arranjaram guarda-costas, Jill. - Jill sorri enquanto os outros dois fecham a cara. Deve ser alguma piada interna a qual não estou incluída. – Afinal, o que foi esse show inteiro?

Jill fala rápido até demais, chegando a não respirar entre uma palavra e outra.

– Vocês acreditam que esses dois - Jill aponta para Carolyn e Carl. - queriam pegar de mim a figurinha do Ronald Weasley que eu havia acabado de achar na caixinha dos sapos de chocolate? Foi uma questão de honra.

Silêncio.

– Isso tudo foi por causa de uma figurinha? - pergunta Lua, indignada.

Jill dá de ombros.

– Por acaso esses três foram mergulhados de cabeça no Rio Estige quando nasceram? Nunca vi alguém ser atacado tantas vezes e viver para contar a história. Deveriam ter, no mínimo, quebrado o braço ou a perna. – murmura Caleb para ninguém em especial.

– Ou quebrado o pescoço. – sussurra Alex em resposta.

Carolyn segura Jill pelo braço.

– Vamos, Jill. A aula já vai começar. – Carolyn arrasta Jill para o interior da escola sem nem ao menos se despedir. Jill acena para nós freneticamente até sumir de vista. Carl vai atrás delas, direcionando um aceno de cabeça na nossa direção. Pelo menos ele se despediu.

Clarisse ri.

– Esses dois não mudaram nada. - diz ela, cruzando os braços.

Todas as cabeças voltam-se para Clarisse, os quatro pares de olhos se arregalaram.

– Você conhece eles? – pergunta Alex.

Clarisse para de rir, ergue o braço, puxa a manga do sobretudo e encara o pulso no local onde provavelmente há um relógio de pulso imaginário e diz:

– Opa, olha a hora. A aula vai começar mesmo. – Clarisse sai em disparada para dentro da escola de forma desesperada.

Todos nós nos entreolhamos, novamente concordando de forma muda, e partimos atrás de Clarisse, gritando seu nome.

Desventuras em HogwartsWhere stories live. Discover now