Capítulo 12

299 53 113
                                    


Se for preciso, eu pego um barco, eu remo

Por seis meses, como peixe pra te ver

Tão pra inventar um mar grande o bastante

Que me assuste, e que eu desista de você

Se for preciso, eu crio alguma máquina

Mais rápida que a dúvida, mais súbita que a lágrima

Viajo a toda força, e num instante de saudade e dor

Eu chego pra dizer que eu vim te ver

Partilhar - Rubel


Apesar de toda a má vontade de Cristiano, eu continuo indo para a casa dos Batista todas as tardes. Não encontrei nenhum laboratório secreto de experiências duvidosas com insetos. Não fui morto nem torturado pelo Dr. Joaquim em seu porão dos horrores. O que me faz supor que as histórias que ouvi sobre eles não eram verdadeiras. Talvez eles sejam apenas uma família esquisita e antissocial que proíbe a filha mais nova de se socializar com o restante do mundo por algum motivo que não consigo entender.

Cris não muda sua postura fria e fechada comigo, e me faz seguir à risca seu regime militar de estudos. Eu queria me rebelar contra isso mas, para a minha surpresa, minhas notas começam a subir de maneira incontestável, então talvez ele tenha razão em manter seu cronograma xiita. Mas não vou dizer isso a ele. Não quero que fique ainda mais convencido do que já é.

Ainda estou tentando achar uma maneira de fazê-lo se abrir um pouco mais para mim, expor seus gostos e suas fraquezas, o que no momento me parece quase impossível. Nicolas vem me pressionando por algum progresso, mas não consigo nada até o final de abril.

O tempo está começando a esfriar e tenho que levar uma jaqueta para a casa de Cris. Ele parece ter desistido da ideia de estudarmos no escritório do pai e todos os dias subimos direto para o seu quarto. Hoje estamos esparramados com nossas apostilas e cadernos em um tapete felpudo que Joana providenciou para nós após eu o convencer de que seria bom mudar um pouco a postura rígida da escrivaninha.

Por um milagre terminamos mais cedo (nunca paramos até Cris se dar por satisfeito, o que pode se estender por horas, principalmente quando estudamos física e ele insiste em me explicar a matéria até me dar dor de cabeça). Eu me estico preguiçosamente no tapete e me levanto para começar a recolher minhas coisas sem esperar que Cris diga nada. Estou me acostumando com seus longos períodos de silêncio meditativo. Acho que ele os usa para repassar a matéria mentalmente, ou algo do tipo.

Quando puxo minha jaqueta da cadeira na escrivaninha, percebo que um pedaço do tecido ficou preso em uma das gavetas. Eu puxo com mais força e a gaveta se abre, revelando uma estranha coleção de CDs antigos. Imediatamente sinto minhas bochechas corarem. Eu não pretendia invadir um espaço pessoal de Cris, foi um acidente. Então fico com raiva de mim mesmo por me sentir envergonhado. Não é minha culpa que Cris seja obcecado em manter uma aura de mistério inviolável ao seu redor.

— O que está fazendo? — ele soa alarmado, quase caindo ao tropeçar no tapete na pressa em se juntar a mim para fechar a gaveta de seus segredos obscuros.

— Me desculpe, eu... o que são todos esses CDs?

— São meus... — ele começa na defensiva, então endurece o tom. — Olha, você não pode sair por aí abrindo gavetas sem permissão. Isso é particular e nós não somos amigos. Estou apenas te fazendo um favor ao deixá-lo estudar comigo.

Quase Sem QuererOnde histórias criam vida. Descubra agora