O desespero tomava o garoto toda vez em que abria os olhos pela manhã. Às noites, Luke deitava-se em sua cama e rezava a todos os deuses para que tudo tivesse sido apenas um pesadelo. Rezava para acordar na manhã seguinte e ver uma garota de cabelos pretos e olhos azuis como o céu saindo do chalé 1, pronta para tomar café ao seu lado.
Nunca adiantava.
Os raios de sol atravessavam as janelas descascadas do chalé de Hermes, despertando as dezenas de crianças que ressonavam espalhadas pelos beliches e os sacos de dormir. O desejo de Luke era permanecer na cama até que sua angústia passasse.
Desse jeito, ele passaria o resto da vida na cama.
Ele podia lembrar cada detalhe daquela noite, meses atrás. Ainda doía. A imagem de Grover caído no chão, gemendo, ainda era clara em sua cabeça. Annabeth tinha um profundo machucado na perna e estava atirada na grama, a alguns metros dele. Ele pôde ouvir a voz de Thalia ao seu lado. "Leve-os para o acampamento", ela pediu. "Eu vou atrasá-los".
Os monstros avançavam furiosamente em direção a ela. Luke tentou protestar, dizendo que não sairia de seu lado. "Apenas leve os dois para um lugar seguro. Eu vou logo depois."
Luke teria continuado o protesto se Thalia não tivesse segurado sua mão e pedido novamente, com uma voz doce. "Vá, por favor. Eu vou ficar bem."
E ele a havia obedecido, prontamente. Ela tinha aquele poder sobre o garoto. Não havia nada que Thalia o pedisse com aquele tom gentil que ele não fizesse. Luke correu até Annabeth e pegou-a no colo, tomando cuidado com sua perna machucada. Depois, pegou Grover pelas costelas e o levantou, passando um de seus braços por seu próprio ombro. Carregou os dois colina acima com uma força que nem ele acreditava ter. Quando sentiu que estavam em segurança, largou os dois, pedindo que o sátiro levasse Annabeth para uma enfermaria, e voltou correndo para Thalia.
Era tarde demais. Ele pode ver exatamente o momento em que tudo aconteceu. Thalia lutava bravamente com um manticore. Ela exercia certa fascinação lutando daquele jeito tão corajoso. Se aquilo fosse algum tipo de treinamento, ele teria sentado e observado enquanto ela manejava o escudo e a lança com tanta precisão, lançando choques elétricos nos momentos perfeitos. Sua face concentrada e furiosa estava molhada de suor e seus cabelos grudavam no rosto branco. Era apenas absurdo como alguém conseguia ficar tão encantadora naquela situação.
Mas Luke não tinha tempo para admirar a luta. Segurando a espada de bronze, correu colina abaixo para socorrê-la. Ela parecia estar lidando bem com os monstros, ferindo-os e pulverizando-os, um por um.
Então tudo saiu do controle. Enquanto Thalia cravava sua lança no peito de uma dracaena, um vulto negro avançou em sua direção, pulando sobre a garota. Ele atacou, mostrando os dentes afiados prontos para rasgar seu rosto.
Porém, um milésimo de segundo antes de Thalia ser brutalmente assassinada bem em frente aos olhos de Luke, um raio desceu do céu e atingiu o cão infernal. O garoto achou que havia sido obra da filha de Zeus, mas a claridade que se seguiu o fez desacreditar disso.
O cenário escureceu novamente, e tudo se foi. Como se os monstros nunca tivessem estado ali. Como se Thalia nunca os tivesse combatido, para distraí-los. Tudo que restava era uma quantidade enorme de pó amarelo cheirando a enxofre e um enorme pinheiro, maior que todos a sua volta, destacando-se sobre a colina Meio-Sangue.
Luke encarou o pinheiro por alguns segundos, sem reação. Ela se fora. Nem mesmo seu corpo estava mais ali. Apenas aquele enorme pinheiro.
Grover chegou mancando atrás de Luke, pisando devagar, como se sentisse dor ao se apoiar. Olhou em volta. "Onde está a filha de Zeus?", ele perguntou, notando a árvore que recém surgira.
O garoto apenas balançou a cabeça. Um enorme nó se formava em sua garganta.
Ele balançou a cabeça, voltando a sua cama no chalé 11 e afastando os pensamentos. Não era algo que Luke fazia questão de lembrar, considerando que toda vez que o fazia o sentimento de culpa invadia sua mente. Ele não podia evitar pensar o que teria acontecido se tivesse ficado a seu lado. Thalia sabia que os monstros estavam atrás dela, e não dos outros três. Ela também sabia que não conseguiria lutar contra todos sozinha, e do mesmo jeito sacrificou-se para protegê-los.
Ele devia sua vida a Thalia. Agora era sua vez de retribuí-la.
Aquele tinha sido o motivo principal para Luke aceitar colocar-se contra os deuses. Os Olimpianos, seus pais que não puderam mover um dedo para ajudá-los. Que só se manifestaram quando já era tarde demais, quando Thalia já estava morta.
Quando aquela voz horrível em seus sonhos dissera que poderia trazê-la de volta, que eles poderiam ficar lado a lado outra vez, e, desta vez, sem fugir nem se esconder, ele finalmente foi convencido.
Ele disse que faria qualquer coisa para que ficassem juntos. Agora estava cumprindo o que prometeu.
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Família, Luke
Romance"O rosto dele contraiu-se em uma dor tão intensa que até ela pôde sentir. Havia um laço entre eles, um laço criado há seis anos, quando eram crianças correndo pelo país em busca de proteção. Um laço que fazia com que ela sorrisse quando ele gargalha...