Capítulo 1: Lobo desgarrado

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Ravena olhava para os próprios pés, imersos naquele riacho. Sentia a água gelada e corrente bater nos tornozelos, praticamente chamando-a para dentro. Não atendeu ao chamado, no entanto. Aquele rio, apesar de estreito e relativamente raso, era bastante agitado. Nadar contra a correnteza seria cansativo demais para uma manhã monótona como aquela.

Ou ao menos estava monótona, até aquele momento.

–– Vagando sozinha pela floresta, garotinha? Melhor tomar cuidado pra não se perder. Sabe, tem muito animal perigoso por aqui, pode acabar topando com algum.

Ela nem precisou se virar para reconhecer aquela voz. Aquela voz áspera e cheia de sarcasmo, que mais parecia um latido na maioria das vezes. E apesar disso, Ravena nunca tinha ouvido um rosnado mais amigável.

Ela virou o rosto para encarar o dono daquela voz, as mãos ainda apoiadas na rocha que margeava o riacho, onde estava sentada. Estava lá. O mesmo sorriso debochado de sempre, estampado no rosto dele. A garota voltou a olhar o riacho, fazendo sua melhor imitação daquele sorriso.

–– Oh, verdade? –– disse com uma pitada de cinismo. –– Pelo que eu sei, nenhum deles vêm pra essa parte da floresta. Todas as criaturas que encontrei por aqui são completamente inofensivas.

Aquele elemento selvagem venceu tão rápido a pouca distância entre eles que Ravena mal teve tempo de revidar. Só pôde mirar aqueles olhos cinzentos e indômitos enquanto ele a segurava pelos braços, ameaçando jogar a garota nas águas velozes do riacho de uma vez.

–– Inofensivo, você disse? –– repetiu Castiel, com um sorriso de desafio para a atrevida que sustinha a poucos centímetros da água. Um sorriso que mostrava caninos salientes e bem afiados.

–– Ah, não, me jogar na água não vale –– zombou Ravena, com uma atuação pouco convincente. –– O que uma sereia pode fazer?

O jovem não resistiu à provocação e soltou a amiga na água, rindo enquanto observava seu vulto submerso sendo levado depressa pela correnteza.

Ravena também ria, debaixo daquela água fria que a arrastava para longe. Ela pensou logo num modo de voltar para a margem, estava louca para pagar Castiel com a mesma moeda. O riacho não era muito fundo, mas tinha espaço suficiente para o impulso que ela precisaria para se lançar para a margem. Contou mentalmente até três e jogou o corpo para fora, usando toda a força que tinha na cauda que acabava de conjurar naquele salto.

Ela atingiu a superfície e rapidamente se separou dela, descrevendo um arco no ar durante seu breve voo. Então aterrissou, ou melhor, se estatelou.

Enquanto se recuperava do impacto contra o chão, viu o garoto correndo em sua direção lá de longe, se aproximando mais depressa do que se esperaria. Ele é rápido, mesmo na forma humana, pensou Ravena enquanto apoiava as mãos na terra para se sentar. Torceu o cabelo molhado e ajeitou a saia da roupa sobre a cauda, antes que as pernas longas e torneadas a substituíssem.

–– Rae, aquilo foi incrível! –– Castiel disse com um sorriso admirado para ela. – Por que nunca me contou que era meio golfinho?

–– O que é isso? –– a sereia perguntou, sem entender.

–– É um animal do mar, você não sabia? –– o amigo franziu as sobrancelhas, meio espantado. –– Quer dizer, eu sei que você não sabe muito sobre ele, mas pensei que soubesse disso. Seu pai é pescador, Ravena, ele nunca te disse nada?

–– Eu nunca perguntei –– ela deu de ombros, meio aborrecida. –– E como é que você sabe o que é um... –– ela fez um bico, enrugando a testa ao pensar naquele animal que nem imaginava como era. –– Golfinho?

A Guerra dos Sirenes (Suspensa)Onde histórias criam vida. Descubra agora