Capítulo 4: O início de uma longa viagem

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— Segurem ele.

Aparentemente, o segundo paladino no comando daquela emboscada, cujo único objetivo devia ser interceptar qualquer fugitivo do império (e por fugitivo, Tristan compreendia claramente os sirenes ainda vivos, fugindo desesperadamente da perseguição por sua sobrevivência), estava mais do que disposto a não somente cumprir a função do primeiro, já liquidado pela adaga do prisioneiro, mas também vingá-lo. A ele e a todos os demais homens que perderam.

Surrou o forasteiro contido por dois outros sobreviventes daquela luta, bem capazes de usar a força, apesar de feridos pelos dentes afiados do lobisomem que escapara. Sangue jorrou da boca de Tristan quando o soco do paladino atingiu em cheio seu maxilar.

— Os outros já estão a caminho, sua amiguinha não ficará livre por muito tempo — sentenciou o homem, preparando-se então para um novo golpe e socando o olho esquerdo do rapaz. — Vamos cuidar daquele monstro também, ah, sim... terá o mesmo fim que você.

O soldado decidiu chutá-lo no estômago dessa vez, seu olhar escarnecedor, não mais oculto pelo elmo que todos os oficiais usavam, estava fixo em Tristan como quem se deleita ao decidir o destino de alguém, empoderando-se de sua autoridade sobre aquela alma, certamente condenada e, dali a segundos, destruída.

Tristan já havia assistido, com o coração apertado, um grupo de quatro dos paladinos remanescentes saírem a cavalo atrás de Ravena, surgindo detrás das árvores na orla da floresta que reverenciava o planalto imponente, partido em dois por aquela enorme fenda por qual vira sua irmã fugir, com a montaria daquela divisão, incumbida de guardar a passagem rochosa.

No fim das contas, Castiel seria mais rápido que um cavalo. Mas será que isso ainda era válido para um lobo ferido? E os paladinos não lhes deram tanto tempo de vantagem...

O soldado tomou a lança que um quarto paladino estava segurando, o último dos sobreviventes que ficaram para resolver o que fariam com o inimigo derrotado.

E o consenso era óbvio, ao passo em que o paladino sem elmo erguia sua lança contra Tristan.

Mas antes que completasse sua execução, algo naquele transgressor lhe chamou a atenção. Levou a ponta da lança suavemente até a aba da casaca, afastando-a das vestes que estavam por baixo, vendo ali cores conhecidas, e empurrou a vestimenta para fora do corpo, chegando a rasgá-la, antes que caísse no chão. Estava exposto o uniforme militar urgandiano de Tristan.

— Um soldado de Urgand, huh? — encarou o outro bem nos olhos, o esquerdo arroxeado e inchado em consequência de seu próprio soco. — Traiu suas autoridades, e afrontou a autoridade maior, quando confrontou o Império Paladino.

O homem transbordava superioridade ao terminar seu discurso pomposo, mas ao contrário do que Tristan pensou, não fez o que pretendia até então.

— Quando os demais retornarem, deixem que levem-no de volta para Urgand.

— Asphoter? — Questionou outro paladino, o que antes segurava a lança que estava na mão do outro. Tristan presumiu que fosse aquele o nome do homem que quase o matou. — Não é melhor acabarmos com isso aqui? Agora mesmo?

— Nós temos o controle das terras urgandianas graças ao ministro agora, Illukar. Não queremos criar tensões desnecessárias executando um traidor da coroa sem nem mesmo permitir que enfrente seu julgamento — apontou racionalmente o outro, voltando-se outra vez para Tristan. — E acredite, não serão complacentes com ele.

[...]

— Nós temos que voltar.

Ravena só murmurava langorosa, debruçada sobre o lombo peludo e negro do amigo, enquanto ele continuava trotando, já diminuindo a marcha depois de horas correndo o mais que podia. Cansados, famintos e ainda um pouco distantes de seu destino, as cabeças de ambos pendiam com a fadiga.

A Guerra dos Sirenes (Suspensa)Onde histórias criam vida. Descubra agora