Capítulo XXII: O limite da perfeição.

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Cansaço.

Eu sei que essa palavra te remeteu algo, algum momento. Você sentiu de novo tudo aquilo, aquele peso, a pressão, as pernas trêmulas. Eu sei que sentiu. Eu também senti. E isso dói, sei que sim. Eu entendo, e Luke, mais do que ninguém, também entende.

Exaustão.

Agora as sensações se intensificaram. Tudo ficou mais sufocante e você mal aguenta seu próprio peso. Levantar é um esforço imenso que leva longos minutos, até respirar é cansativo.

Luke não dormia. Luke não comia. Para se bem sincera, ele não vivia.

Era tudo no automático, mas não uma rotina entediante, se tornou doentio e perigoso, uma perseguição. Luke se abandonou tentando recuperar a confiança que tinham nele, o preço da perfeição é caro.

Desafiar Deus não foi sua melhor decisão.

Não, anjo, você não está errado em questionar, você foi ensinado assim. Não foi errado desafiar. Só que mesmo não estando errado, nenhum superior suporta a possibilidade de ser desafiado, contrariado ou superado por um simples subordinado.

Afinal, ele é Deus! Não seria tolo em entregar a ciência de seu poder em uma bandeja de ouro puro em suas mãos, Luke. Ele não suporta o fato de você ser irredutível, mesmo sem saber de fato quem é. Mesmo achando que a única coisa especial em você é a ligação direta com ele.

Isso é manipulação Luke.

É óbvio que nunca seria o suficiente para ele, mesmo que fosse a cópia fiel. Você ainda seria manipulável. Ainda seria uma falha.

Ele sequer suporta os próprios atos.

E agora olhe para você Luke. Olhe onde tu foste capaz de chegar para atingir as expectativas de um ser que, até a olho nu, não tem amor próprio, e que infligiu a você o peso da perfeição que, em tese, deveria ser dele.

Afinal, ele não é Deus?

Ele falhou em uma missão que foi imposta a ele por ele mesmo. Não cabe a você encobrir o fracasso e frustração dele.

E lá estava Luke, chegando ao colégio com a força que restava a ele. Fraco, esquelético, exausto. Ainda sim, a criatura mais linda e forte presente nesse planeta.

Ao olhos mundanos, saudável e extremamente feliz como sempre foi. Estranhamente estava assim para Michael também.

Alguém que deveria vê-lo, estava somente o enxergando, como qualquer outro. Obra de Lúcifer, pensou. Duas partes suas o negligenciando, o ignorando.

Será mesmo que ninguém se importa com o anjo?

— Muito bem queridos, vamos a uma pauta importante da nossa aula... Apocalipse! Há várias visões dele. Científica, bíblica, espiritual... Mas nosso ponto é o Bíblico.  Vamos lá, antes de falarmos dele, qual a visão de vocês sobre isso?

— O dia em que o diabo andou sobre a terra e os anjos perderam a guerra.

— Talvez a própria arrogância tenha os feito perder. Afinal, sempre foram amados. O ego deveria ser enorme.

Oh oh! Nem os mundanos miseráveis, que tanto dizem cultuar o celestial, se importam com ele. O mundo é mesmo cruel.

— Não acredito que seja os anjos que tenham perdido a batalha. – Michael se pronunciou – Numa visão contemporânea, eu mandaria todos para uma terapia intensiva. O apocalipse não aconteceria, digo, não vai acontecer, se todos olhassem para as próprias falhas. Sabe, o orgulho de cada um destrói a si mesmo, somos mesquinhos demais para admitir fraquezas. Nós mesmos nos destruímos e sequer percebemos. Do que adianta se arrepender depois do fim? De qualquer modo vamos jogar a culpa em outro alguém ou algo. – Olhou de relance para o anjo – Somos humanos, isso nos afasta infinitamente da santidade. Fomos escravizados por algo a buscar a perfeição para alcançar o paraíso. É isso que faz o apocalipse. O preço da perfeição.

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⏰ Última atualização: Nov 29, 2021 ⏰

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Entre Anjos e Demônios • MukeOnde histórias criam vida. Descubra agora