Capítulo cinco - A queda de Giselle

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Em todos os lugares há vestígios de que estive aqui, meu DNA está espalhado em cada cômodo da casa. Passarei o resto da minha vida atrás das grades.

― Você precisa dormir agora ― ouço Giselle dentro de mim.

Me levanto, vou até o armário de vassouras e procuro todos os produtos de limpeza. Passei oito horas limpando cada resquício de sangue na sala, inclusive o corpo de Derek. Peguei tudo que me pertencia e coloquei em uma grande mala, revisei dezenas de vezes todos os cantos da casa para me certificar de que não havia esquecido nada. Fui ao mercado, comprei querosene, em outro, comprei fósforos, não podia deixar que suspeitassem de nada, planejava queimar todos os meus pertences. De madrugada, tomei um táxi e fui até Brixton, entrei em um beco onde moradores de rua faziam um círculo em volta de um latão em chamas. Ofereci a eles minhas coisas e pedi que queimassem o que não lhes fosse ser útil. Dei cinquenta libras a cada um, para que nunca comentassem que eu estive ali. Tomei outro táxi até o Rio Tâmisa e lá joguei o castiçal.

Voltei para casa, ainda precisava me livrar do corpo de Derek. Fiquei desejando que minha vida fosse um filme e que um simples ácido pudesse sumir com aquele cadáver estirado no chão. Olhei para a mesa e vi a sacola com o querosene e os fósforos. Não, seria impossível. Não podia colocar em risco a vida de todas as pessoas que viviam em volta. Mas, Giselle é impiedosa, tem mais força sobre mim do que eu sobre ela. Fui ao banheiro, me encarei por uns segundos no espelho que havia acima da pia, peguei uma tesoura e cortei todo meu cabelo, depois o peguei e joguei na privada. Sentei em frente ao computador e comprei uma passagem para Portugal, o voo sairia em três horas. As únicas coisas que me haviam restado eram os documentos, meu celular, cartões e cinco mil libras em dinheiro. Celular. Peguei o celular de Derek e o quebrei em dezenas de pedaços, juntei, joguei no vaso sanitário e dei descarga. Tudo que sua família sabia sobre mim era que uma menina brasileira chamada Giselle estava passando um tempo em sua casa. Apaguei todo o histórico do computador e o formatei. Peguei a lata de querosene, andei lentamente pela casa, despejando o líquido inflamável em todos os cantos, principalmente no corpo e no laptop que havia usado. Destranquei a janela lateral, que dava acesso para uma viela deserta e pulei, acendi seis palitos de fósforo de uma vez e os joguei o mais longe que pude. Apagaram. Tentei mais uma vez, apagava. Já estava desesperada, alguém poderia achar suspeito eu estar ali antes de um incêndio acontecer. Entrei na casa de novo, acendi o fósforo e o joguei diretamente sobre Derek. Uma chama subiu e quase acertou meu rosto. Corri para a janela e pulei, dei de cara com um senhor passeando com um cachorro. Ele se assustou, olhou para a janela e viu o clarão das chamas. Fingiu que não tinha visto nada e apressou o passo, puxando a coleira com força.

― Porra ― levei as mãos à cabeça e a joguei para trás ― Que merda!

Precisava sair dali, corri o mais longe que pude, um capuz cobrindo minha cabeça. Acenei para um táxi, quando entrei, ouvi bem distante a sirene do caminhão de bombeiros. Não. Era cedo demais, não deu tempo de queimar tudo. O pânico se espalhava pelo meu corpo, comecei a suar frio e a ter taquicardia.

― Te dou cinco mil libras se me deixar dirigir seu carro ― ofereci ao motorista.

Ele me olhou por uns segundos, desceu do carro e passou para o banco do passageiro. Dei meia volta e acelerei o máximo que pude. Puxei o cinto de segurança e o aconselhei que fizesse o mesmo.

― Abra minha bolsa e pegue todo o dinheiro que tem nela ― disse a ele.

O caminhão de bombeiros vinha em minha direção a toda velocidade, quando chegou perto, girei o volante, fazendo o carro bater contra eles. Fui nocauteada pelo airbag e desmaiei.

― Senhora? ― um bombeiro colocava uma lanterna nos meus olhos.

Olhei para o motorista, estava desacordado, tinha um corte na testa. Desci do carro tonta, quase caí depois de dois passos, o bombeiro me segurou.

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