SERENDIPIDADE

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Oito anos se passaram, em um piscar de olhos o príncipe estava comemorando seu décimo quarto aniversário. O Palácio estava sendo decorado exageradamente e não havia um único servo que não estivesse correndo com os braços cheios por todos os lados. No jardim, onde a celebração ocorreria, lanternas vermelhas eram penduradas nos galhos das enormes cerejeiras, como frutos sagrados de vitalidade que brilhariam por toda a noite. 

No lago, sempre havia flores abertas, até mesmo no inverno elas floresciam lindamente. Um pequeno barco estava boiando por ali pacificamente, mas, ainda com toda a animação que se estendia até às ruas da cidade, aquele que completaria mais um ano se encontrava imensamente apático sobre a ocasião. Sentado sobre o telhado reto do palácio menor, Hua Cheng podia ver o jardim e a cidade além dos muros, onde pequenas bandeiras vermelhas como sangue se estendiam até a muralha mais alta. 

"Por que comemoram tanto se nunca nem mesmo viram meu rosto?" 

Seu pensamento recorrente se repetia mais a cada novo ano. Ainda que vivesse bem, com mais privilégios do que muitos, não dizer que estava feliz seria mentira. A ignorância em sua infância havia sido uma dádiva, ele não pensava muito sobre tudo e na posição que estava, mas conforme adquiria idade e compreendia o que era esperado de si, não podia mais sorrir com tanta facilidade. 

Se sentando corretamente e apoiando um dos braços em seu joelho, ele tirou o pergaminho preso em seu cinto e o abriu. A pintura que havia feito anos atrás ainda era bonita e vívida, mesmo à vendo tantas vezes durante todos esses anos, tamanha beleza o atingia como se fosse a primeira vez novamente.

– Sob o sol parece ainda mais bonito. – Murmurou, deslizando o dedo pela imagem como de costume – Sob luar também é belo, quanto mais poderia olhar? 

Ele suspirou, sentindo seu coração aquecer de uma forma estranha. À distância, o grande sino tocou indicando que metade da tarde já havia passado e logo pessoas importantes chegariam. Guardando a pintura cuidadosamente, se levantou e deslizou pelos tijolos até que chegasse em uma grande árvore atrás da torre.  

Dali ele poderia ir sorrateiramente para seu quarto e se trancar lá por pelo menos mais uma hora, antes de ir para o salão para cumprimentar algumas pessoas e fingir um mal estar para que pudesse fugir novamente. Um bom plano de execução simples. 

No entanto, seu esquema caiu por terra quando seu colarinho foi puxado por mãos pesadas enquanto se esgueirava pelos pilares. 

– Hua Cheng – a voz grave de seu pai o atingiu como uma onda carregada de decepção. Ali, seus planos foram enterrados instantaneamente – Posso saber onde estava? 

– Olá, pai – sorriu inocente. – Este filho estava estudando, agora mesmo vou para meu quarto me arrumar, deseja algo? 

– Não tente me enganar! – vociferou, dando um tapa leve em sua nuca e prendendo sua orelha, nunca usando tanta força – Quantas vezes já disse para não subir naquele maldito telhado, vou ter que colocar correntes em você? 

Ele foi puxado enquanto seu pai o repreendia, cruzando as portas e entrando no pátio central, havia mesas baixas com frutos nas duas laterais, o corredor reto levava à duas grandes cadeiras semelhantes ao trono, onde os dois se sentaram. 

– Basta de brincadeiras. Até mesmo faltou ao treino hoje! Como vai se tornar um guerreiro se não age da forma correta? 

– Me desculpe. – murmurou, revirando os olhos discretamente. 

– Sente-se, vou apresentá-lo a algumas pessoas. 

Dito isso, após bater as mãos duas vezes um sorriso surgiu no rosto do maior como se não estivesse gorjeando minutos antes. Vindas do corredor à direita, uma longa fila de moças caminhavam graciosamente, todas vestiam longos vestidos em tons de azul e exibiam penteados muito belos, diferenciando-se entre elas apenas pelos modelos. 

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