Capítulo 2

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Antes

Ela o viu em meios aos outros homens sem camisas e a fumaça de cigarros, dava para imaginar o cheiro etílico no ar, dado a infinidade de copos e garrafas na mesa

Ele se destacava de chinelas brancas nos pés, short e camisa de marca, óculos escuros e cabelos bem aparados, relógio reluzente no pulso, o tipo tradicional de playboys que apareciam no pub beira mar diariamente.
O sol da tarde a fez colocar uma mão acima dos olhos para enxergar direito ao seu redor, procurou uma esteira vazia e se deitou, desligando dos acontecimentos ao redor ao voltar para a leitura de um romance que Adolfo a tinha dado, um prêmio pelas últimas notas das provas do trimestre. Ele era o único que se importava com ela e ficava no pé para não desistir de seus sonhos, Adolfo virou mais pai dela do que o seu próprio pai.
Mas  naquele momento ele se encontrava ocupado, no meio de uma conversa particular com o cara de óculos escuros e mais outros, enquanto algumas mulheres circulavam por ali, vestidas com biquínis, vez ou outra sentando no colo de um ou de outro.
A vida no morro para a maioria era assim, se não tivesse força suficiente na vida para vencer as opções que restavam eram poucas e duvidosas. Por isso que seu irmão foi embora.

Quase todos finais de semanas a laje virava um caos de pessoas seminuas, som alto, churrasco e conversas. A  vezes se tornava um inferno, mas ela permanecia sempre as vistas de Adolfo quando resolvia sair para espiar, a maioria das vezes ficava estudando no quarto ou dormindo quando rendia horas extras no trabalho.
Cecília se concentrou na leitura até captar um movimento pelo canto do olho, o rapaz se levantou e caminhava em sua direção, ela abaixou o livro para fazer contato visual com Adolfo que lhe lançou um olhar preocupado, mas não fez nenhum sinal para se afastar quando o homem sentou na espreguiçadeira ao lado.

— O que está lendo?

Ela virou a capa do livro para que ele pudesse ler o título, o cheiro do perfume dele invadiu suas narinas, ela inspirou disfarçadamente aquele cheiro bom.

— Gosta de ler?— Ela abaixou o livro e o olhou, ele abriu um meio sorriso.

— Nem tanto, geralmente leio muitos processos. Curso direito.

Realmente ele parecia fazer parte da  nobreza da cidade, mas por que estava ali? Ela deu de ombros, não era de sua conta, voltou para o livro e murmurou:

— Só tome cuidado para não perder o relógio, se bestar levam até as roupas...

A boca dele formou uma linha fina.

— Claro, tomarei. — soou convicto— Aliás, qual é o seu nome?

O som ficou mais alto quando um funk com palavras de baixo calão começou a tocar, instantemente várias mulheres começaram a dançar, rebolando e se esfregando em outros homens, o rosto de Cecília esquentou.

— Cecília... —Ergueu a voz para ser ouvida.

— Meu nome é Alex. Quer ir para um lugar mais tranquilo?

Alex retirou os óculos e se levantou estendendo a mão para ela.
Cecília olhou para a mão e foi atingida por um déjà vu, rapidamente o fitou, os olhos de Alex eram verdes e calorosos.

Eles desceram até a rua, longe de todo o barulho. Por um momento ela se preocupou por não estar arrumada, vestia um short simples e uma blusa duas vezes maior que seu tamanho.

— Ainda estuda Cecília?

Alex perguntou assim que se afastaram da casa.

— Ultimo ano do ensino médio.

Por sorte não havia muito movimento nas ruas naquela tarde e, algumas colegas de escola que encontrou simplesmente a ignorou.

— Imagino que ainda seja menor de idade...

Alex enfiou as mãos no bolso e chutou uma pedrinha no caminho que desceu ladeira a baixo.

—Fiz dezoito anos há pouco tempo, nasci bem depois da data base, não estou atrasada. —Ele riu do comentário fazendo um sorriso tímido surgir no rosto de Cecília.

— Sorria Cecília, seu sorriso é lindo.

Alex parou e a olhou, o rosto de Cecília pegou fogo.

—O que pretende fazer depois que terminar os estudos?

Ela pensou um pouco antes de responder, mas não tinha porquê ficar calada.

— Estou estudando para o vestibular, se conseguir boas notas irei tentar para universidades em outras cidades.

— É uma ótima forma de pensar.

Cecilia queria saber mais.

—Como é a faculdade?

—Não é isso tudo que você está pensando...

Antes que pudessem continuar algo apitou no bolso de Alex, era um celular, ele tinha um.

— Sinto muito, mas preciso ir. Te deixo em casa.

A feição dele não era a mesma depois que checou o celular, Cecília percebeu.
Ele a deixou na laje junto com um beijo na bochecha que fez Cecília ferver de vergonha e alegria.
Quando procurou por Adolfo, ele não estava em lugar algum.





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