Amore

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Eu sempre imaginei que estaríamos sob o céu azul intenso, em algum lugar paradisíaco, bem depois de fazermos amor lento, suave, daqueles cujas imagens ficam gravadas na alma e despertam pra sempre cada célula do nosso corpo. Eu sempre imaginei, mas foi milhares de vezes melhor. Talvez, porque tenha finalmente sido.

Meu cérebro repassava esse momento tantas e tantas vezes enquanto eu o ainda estou vivendo. A forma como suas mãos seguravam meu rosto, o jeito doce com que ela me olhava, a sua respiração um pouco ofegante pela intensidade que sempre nos envolvia, a sua voz rouca e sussurrada ainda soando em meus ouvidos.

De um jeito esquisito, mas tão seu, Manu permanecia aqui em meus braços sem nenhuma pressa, sem mais nada dizer, com essa pose impetuosa e ao mesmo tempo frágil, com esse ar de quem sabe o tamanho das reações que me causou com apenas três palavras.

Nós parecíamos congeladas no tempo, mas se tem algo que aprendi com todo esse sentimento avassalador que sinto por ela é que o tempo não espera, não pausa, não cessa. E diante dessas duas bilhas castanhas tão compreensivas, eu entendi a magnitude do que Manu quis me dizer ontem a noite.

-- Sou um sonho pra você?

Manu pegou minha mão e eu não pude evitar de olhar pra elas assim juntinhas e soltar um pequeno sorriso, elas parecem ter sido feitas pra serem tão diferentes e tão boas unidas. É o que eu sempre quis. Esse poderia não ser um sonho pra Manu, mas particularmente sempre sonhei em viver o que estava vivendo bem ali, com ela.

-- Você foi meu sonho, hoje não é mais...

-- Não?! - e fiz biquinho. Onde ela queria chegar me dizendo isso? Eu já estava abrindo a boca pra perguntar quando ela mordeu os lábios e me olhou como se eu fosse o ser mais incrível de todo o mundo.

-- Não...antes eu olhava pra você como um sonho porque só via impossibilidades, mas agora...- ela sorriu e eu sorri junto de tão entregue que estou. Sou completamente apaixonada por ela. Ah, se ela soubesse o tamanho do que sinto. -- Olho dentro desses teus olhos lindos e vejo tudo o que podemos de fato ser...

Aqui, olhando pros seus olhos lindos, em puro silêncio após o seu "eu te amo", também vejo tudo o que podemos de fato ser. Manu foi a última de nós duas a dizer em voz alta, mas certamente entendeu o nosso amor muito antes de mim.

Nunca nos adiantou gritar em alto e bom som nos ouvidos do mundo. Por muito tempo nenhuma de nós conseguiu ouvir. Não estávamos preparadas ainda, nossos corações falavam outro idioma. Agora, não mais. Eu olho pra ela e sei que eu a amei quando o mundo parecia ruir ou quando a vida foi tão boa que chegava a dar medo. Eu não precisava dizer sobre amá-la porque o nosso sentimento sempre esteve tão claro e certo, ainda que nós não.

Nosso amor não é mais um sonho, há tempos ele não está mais naquelas belas e cursivas palavras. Há tempos ele saiu do papel, ganhou vida. Foi o nosso amor que deu forças para que ela se empenhasse no seu tratamento. Foi o nosso amor que tornou quem eu era num imenso vazio ambulante. Foi ele que mudou sua relação com o irmão. Foi o nosso amor que me fez engravidar de Sofia.

Manu já sabia e eu só entendi agora. Nosso amor deixou de estar preso naquelas cartas há anos. As únicas linhas que restam nele são as que certamente iremos ultrapasssar com um jeito doce, e possivelmente atrapalhado, de quem sempre viu o amor como ponto de chegada. E ele é.

Não tem céu azul intenso nem lugar paradisíaco, mas a sensação em mim é que chegamos, cruzamos a linha, temos tudo o que precisamos. É tanto sentir que o mundo parece pouco para nós. O destino final realmente não importa porque de todo jeito nós já temos o pra sempre, nós sempre o tivemos. O nosso amor nunca precisou de uma relação pra estar vivo.

A Receita Perfeita [Ranu]Onde histórias criam vida. Descubra agora