Sonhei que estava sendo demitida.
E o pensamento torturante de não ter um teto agradável nem dinheiro para me manter quase me tirou o resto do sono.
Mas me obriguei a fechar os olhos, colocando na cabeça que amanhã
seria um outro dia, e com isso, me manteria forte e descansada - mesmo essa não sendo nunca a palavra exata para definir minhas emoções -.Quando acordo novamente as seis da manhã, o sol está atrapalhando meu rosto. Faço uma careta, cobrindo meu lençol até a ponta da cabeça, mesmo sabendo que preciso levantar. O leve resquício de calor incomodando.
Levanto o braço para remexer a cortina, até lembrar que ela rasgou alguns dias atrás. Um xingamento baixo ecoa de meus lábios.
Quando entrei na república, Irene já morava aqui. E isso significava que a donzela tinha escolhido o melhor lado da cama.
Suspiro, finalmente jogando os lençóis para o lado. Uma coisa pesada perece estar entre eles, consigo ver uma capa dura e preta. Era um dos livros sobre anjos.
Não lembrava de tê-los lido ontem, apenas de chegar no prédio puta da vida com o cara novo e toda aquela dor pesada torturando as minhas costas.
Também havia implorado mentalmente por uma carona de Yugyeom, o que, nitidamente, não aconteceu.
Pego algumas roupas no guarda roupa, uma pasta de dentes, escovas e minha toalha marrom.
Irene ainda está dormindo e ao contrário de mim, sei que só vai levantará às oito, afinal, é bem mais fácil se arrumar quando seu banheiro está perto.
Não que eu precise de duas horas de banho. Mas odeia a sensação de ser vista pelos estudantes quando passa das sete.
Eles me olham como se eu fosse estranha. Uma garota pobre e sem família caminhando por um campus com uma toalha na mão e shampoo para cabelo, pastas de dente e roupas sujas.
No início, até tentava ignorar.
Por em mente que qualquer palavra idiota ou intimidação que recebesse, da menor que fosse, seria incapaz de me afetar.
Depois de alguns meses, entretanto, eu já estava farta. Sim, eu era capaz de caminhar entre eles se quisesse. Mas estava tão cansada pra isso.
O trabalho, os estudos, as diversas noites mal dormidas por causas de pensamentos injustos e cobrança...
Era mais fácil acordar cedo e ir quando estivessem dormindo. Me poupava sanidade mental e paciência.
Quando entro no banheiro, contudo, um chuveiro já está ligado. Franzo o rosto, estranhando.
Nunca tinha visto outra alma viva além de mim naquele horário do dia.
Dizer "bom dia" seria estranho, por isso, só jogo minhas coisas na cesta preta e entro no outro banheiro livre.
A água está tão gelada quando toca meu cabelo, descendo por meu corpo nu.
Passo a mão no rosto, limpando-o, e me sinto tremer um pouco.
Eu deveria odiar, mas essa sensação de choque que recebo todos os dias me faz ter coragem de continuar.
Como uma válvula de energia. Um botão que diz "ligar a máquina".
E a máquina sou eu, indo atrás dos meus afazeres e obrigações.
Sinto um forte cheiro de shampoo ao meu lado. Algo fresco como menta se espalha no banheiro e encaro meu próprio shampoo. Cheiro de frutas vermelhas quase imperceptível até para mim, três dólares no Walmart, quase pelo final.
Fazia um mês que estava o usando. E poupando tudo até não poder mais.
Uma súbita curiosidade cresce e me pergunto quem é a pessoa tomando banho ao meu lado.
Homem? Mulher? Alguém que eu conheço? Alguém que eu odeio?
O chuveiro desliga e o ferrolho da porta se abre. Escuto passos, algo batendo na pia frente ao espelho, a torneira sendo aberta por alguns minutos e depois fechando, mas nenhuma voz é emitida enquanto isso. Então um suspiro.
Idiota, digo a mim mesma, quando percebo que pareço uma maluca extremamente curiosa. Não é da sua conta.
Tento voltar para mim mesma, porém, meu lado fofoqueira não me permite fingir que está tudo bem quando os passos voltam a escoar, ficando mais distantes, como se estivesse deixando o banheiro.
Outra pessoa, penso o óbvio, como uma idiota. Outra pessoa está usando esse banheiro além de mim.
Eu não deveria sentir felicidade, mas o pensamento de não estás sozinha me abre um sorriso sincero pela primeira vez em tempos. E término meu banho minutos depois, com a sensação de que alguém também me entendia.
Mas quem?
Quem era a pessoa que precisava acordar tão cedo assim? Quem aparentemente parecia estar se escondendo de todos assim?
Era um bom questionamento.
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Ággelos ❄ GOT7
FanfictionAmara nunca acreditou em conto de fadas. Quando criança, perdeu os pais ainda bebê e passou a vida toda em um orfanato. Agora, com vinte anos, ela quer mudar de vida. Estudante de artes plásticas, porém, os dias da garota não são nada fáceis. O bu...