— Você está com sorte hoje.
A jovem enfermeira tirou a bandeja do café da manhã e me deixou enrolada no meu cobertor branco, como um passageiro pegando ar no convés de um navio.
— Sorte por quê?
— Bom, não sei se já podia te contar, mas hoje você vai se mudar para o Belzise. — Ela me olhava com ar ansioso.
— O Belsize? — eu disse. — Não posso ir pra lá.
— Por que não?
— Não estou pronta. Não estou bem o bastante.
— Claro que você está. Não se preocupe, eles não estariam te transferindo se você não estivesse bem o bastante.
Depois que a enfermeira saiu, fiquei tentando decifrar a nova artimanha da dra. Nolan. O que ela estava tentando provar? Eu não tinha mudado. Nada tinha mudado. E o Belsize era o melhor alojamento de todos. Depois do Belsize as pessoas voltavam para seus trabalhos, escolas e casas.
Joan estaria lá, com seus livros de física, seus tacos de golfe, suas raquetes de badminton e sua voz sussurrante. Joan, marcando a fronteira entre mim e os quase-curados. Eu vinha acompanhando seu progresso desde que ela deixara o Caplan, graças aos boatos que corriam pelo hospital.
Joan podia passear, fazer compras, ir à cidade. Juntei todas as notícias de Joan em uma pequena pilha de amargura, embora as tivesse recebido com aparente satisfação. Joan era o duplo sorridente da melhor versão do meu antigo eu, especialmente criada para me perseguir e atormentar.
Talvez Joan já tivesse ido embora quando eu chegasse ao Belsize.
Pelo menos no Belsize eu poderia esquecer os tratamentos de choque. Várias mulheres no Caplan haviam levado choques. Eu sabia quem elas eram, porque não recebiam as bandejas de café na mesma hora que as outras. Elas faziam o tratamento de choque enquanto tomávamos café da manhã em nossos quartos, e então apareciam no saguão, quietas e distantes, levadas como crianças pelas enfermeiras, e tomavam seu café da manhã por ali.
Toda manhã, quando eu ouvia a enfermeira bater na porta com a minha bandeja, um imenso alívio me invadia, porque eu sabia que estava fora de perigo naquele dia. Eu não entendia como a dra. Nolan podia dizer que as pessoas dormiam durante o tratamento de choque, se ela nunca havia passado por um. Como ela podia saber se o paciente não parecia estar dormindo, enquanto lá dentro sentia as cintilações azuladas e o barulho?
*
Um piano soava no fim do corredor.
Fiquei calada durante o jantar, ouvindo a conversa das mulheres do Belsize. Elas vestiam roupas da moda e estavam cuidadosamente maquiadas, e várias eram casadas. Algumas tinham feito compras na cidade, outras tinham visitado amigas. Passaram o jantar inteiro trocando piadas internas umas com as outras.
— Até ligaria pro Jack — disse uma mulher chamada DeeDee —, só que acho que ele não vai estar em casa. Sei exatamente onde ele se enfiou...
A mulher sentada à minha mesa, uma baixinha agitada, deu uma risada. — Hoje eu quase consegui o que queria do doutor Loring. — Ela esbugalhou os olhos azuis como uma pequena boneca. — Eu trocaria fácil o velho Percy por um modelo mais recente.
Do outro lado da sala, Joan devorava seu presunto e tomate cozido com grande apetite. Ela parecia perfeitamente à vontade entre aquelas mulheres e me tratava friamente, com ligeiro sarcasmo, como se eu não passasse de uma conhecida tola e inferior.
Eu havia ido para a cama logo depois do jantar, mas aí ouvi o piano e imaginei Joan, DeeDee e Loubelle, a loira, junto com todas as outras, rindo e falando de mim pelas costas na sala de estar. Deviam estar comentando como era horrível ter pessoas como eu no Belsize, e como eu devia estar no Wymark e não lá.