Nascimento de Vênus - Sandro Botticelli

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Chorava como se nunca tivesse chorado antes, torcendo para a água lavar seus sentimentos como lavava a maquiagem de sua face. Não achava que chegaria a esse ponto, não acreditava que tinha deixado chegar a esse ponto. O que era para ter sido tão leve se tornou mais pesado que as correntes que prendiam Prometeu, o que era para ser dourado ao toque se tornou pedra ao olhar.

Repassava todas as particularidades daquela noite, todas as nuances e possíveis interpretações. E chorava, chorava tanto que perdia o ar. Tinha vontade de gritar, mas não encontrava voz. Tinha vontade de sumir, mas pensar em ficar longe era um dos motivos pelo qual estava assim naquele momento.

Sentia que seus últimos meses tinham sido arrancados de suas mãos, e o azul que a corroía não era mais o dos olhos de Jason, e sim de uma tristeza avassaladora ao se lembrar da ira que consumiam seu olhar, antes tão eletrizante, quando o loiro se retirou do quarto. Cada instante que passava, se sentia mais triste, suas emoções a esgotando.

Não demorou tanto para exaustão a consumir. E naquela noite dormiu tão bem que se sentiu novamente com 6 anos, quando sua mãe vinha deitar em sua cama para acalmá-la de um pesadelo. Quando acordou, realmente achou que estava em um. Porque o braço de Afrodite abraçando-a pela cintura era bom demais para ser verdade. Precisou virar-se para o outro lado para acreditar que não estava mais dormindo.

— Buongiorno, meu amor! — Sussurrou, mantendo a voz baixa como sempre fez ao acordar Piper.

— O que você está fazendo aqui, mamma? — Não que não estivesse contente em vê-la, longe disso. Sempre ficava feliz ao encontrar sua mãe, o que não acontecia frequentemente. Elas até mantinham um contato virtualmente, mas não era a mesma coisa que estar perto da energia amorosa de Afrodite.

— Senti que você estava precisando de um bom abraço e peguei o primeiro voo da manhã

— Que horas são?

— Quase duas da tarde, principessa — Respondeu, sem nem precisar olhar para o relógio.

Tão exausta pelas emoções do dia anterior, seu corpo precisava de uma boa noite de sono para recuperar um pouco da sua vitalidade. Não que Piper se sentisse viva, nem um pouco. Todos os momentos das últimas 24 horas passavam em sua mente como um filme, e ela não tinha ideia de como tudo tinha mudado da água para o vinho.

— Como você sabia?

— Les mères sempre sabem, mon amour. A gente sente aqui — Disse, encostando onde o coração de Piper ficava. E lembrar que tinha um era lembrar que ele tinha sido dilacerado pelos acontecimentos da noite anterior.

Tudo ainda parecia uma ilusão de Hécate, cruel demais para ser real. Ainda bem que sua mãe estava ali, porque tudo que precisava era um abraço bem apertado. Ficaram assim até que Piper se soltou, buscando pela ternura dos olhos de sua mãe antes de confessar:

— Eu não acredito que pude ser tão burra, mama. Como eu pensei que poderia dar certo?

— A gente sempre pensa que vai dar certo, mon amour. — A ternura se misturando com preocupação ao continuar — Você quer me contar o que aconteceu?

E então ela contou. Contou com todos os detalhes tudo que havia vivido desde que conheceu Jason. Contou dos sorrisos, dos beijos, dos medos, dos anseios e até dos equívocos que cometeu. Fez questão de não deixar para trás nenhum detalhe, para que sua mãe tivesse uma maior percepção da situação.

E revivendo todos aqueles momentos, percebeu peças que ela mesma tinha colocado no lugar errado do quebra-cabeça. Antes estava vendo o quadro pela visão do observador: enxerga a imagem e até pensa que a entende. Entretanto, agora conseguia compreender a obra pela visão do pintor: reconhecendo cada pincelada que a levou até ali. As que foram planejadas, as que borraram sem querer e precisaram de reparo, as que nem ao menos tinha percebido quando encostou o pincel na tela. Entendia o que sentir a cada feixe de luz criado pelas tintas, a cada traço que ocupava o painel.

Mas saber o lado do pintor é saber que cada um que observar o quadro o perceberia de maneira diferente. Isso se tornava mais claro a cada comentário de sua mãe, que estava cada segundo mais envolvida na história, ao se comparar com as opiniões de seu pai, que não eram nenhum pouco agradáveis. E Piper não conseguia parar de se perguntar qual seria a visão que Jason tinha daquela pintura que tinham feito juntos.

Heartbreak Hotel - A Jasiper FanfictionOnde histórias criam vida. Descubra agora